A gente tem pressa

A gente vive correndo.

A gente vive correndo porque tem pressa.

A gente tem pressa porque quer viver a vida.

A gente tem pressa de ver o mundo.

A gente tem pressa de amar.

Mas também tem pressa de ganhar dinheiro.

Muito dinheiro.

Pra viver a vida. Ou achar que vai.

E pra ganhar dinheiro a gente vive correndo.

E correndo, a gente não vive a vida, mas só a vê passar.

E a vê passar correndo, sem entender o mundo.

E sem deixar que o mundo nos entenda também.

A gente vive correndo.

A gente vive correndo pra encontrar uma solução,

sem perceber que o problema, quase sempre, vem de viver a vida com pressa.

E pra encontrar a solução, a gente se apressa ainda mais.

Num ciclo da tristeza sem fim.

A gente vive correndo.

Como se fosse um doido.

Como se fosse um capitalista.

Como se fosse máquina.

A gente vive correndo contra o tempo.

E não é capaz de perceber que o tempo, por si, sempre corre só pra frente.

A gente corre, então, na contramão.

A gente corre pra descer as escadas rolantes que descem.

A gente corre pra subir as escadas rolantes que sobem.

A gente tem hora de almoço.

A gente corre na hora do almoço.

E almoça um sanduíche por não ter tempo de almoçar.

Isto tudo, na bendita hora do almoço.

É que a gente tem conta pra pagar.

E é na hora do almoço que se vai às filas em que se pagam as contas que se deve.

E lá, se paga com o tempo.

E lá, se paga com a vida.

Mas a gente não vê o tempo passar.

E a gente não vê que o tempo é vida.

E a gente não vê a vida passar.

A gente engole, goela a baixo, a ideia de que um dia, a gente vai viver, sem perceber que todo santo dia se deixa de viver um pouco mais.

Porque a gente tem pressa de viver,

mas vive se matando cada dia mais.

um poeta da noite
Enviado por um poeta da noite em 17/02/2022
Reeditado em 23/09/2024
Código do texto: T7454738
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