HOMOSSEXUALIDADE X DOENÇA

Infelizmente, ainda hoje, ano de 2019, as famílias ainda perpetuam um temor e certo asco por esse nome: homossexual. Hoje, por exemplo, em uma conversa descontraída, ouvi de uma pessoa que viu seu filho com alguns trejeitos muito femininos e que na mesma hora reprendeu em nome de Jesus essa prática, pois queria seu filho livre “dessas coisas”. Meu coração quebrou naquele momento.

Não a culpo, todavia, fiquei entristecido por saber que muita gente tenha ainda esse pensamento de relacionar a um desejo sexual tão normal em nossa sociedade em algo pecaminoso ou que possivelmente possa ser considerado fora de uma moral de uma sociedade. Sei que esse receio venha de certo medo de ataques homofóbicos na rua, certamente certo risco que corremos quando somos assumidamente homossexuais. Outro termo que não gosto muito, pois não vejo heterossexuais se assumindo como tais, por que os homossexuais teriam que assumir? Isso é assunto para outro texto.

Esse tipo de visão é estrutural, que a duras penas foi instalado em todas as instâncias sociais, sejam elas na igreja, Estado, escola e família, em nome da manutenção da “moral e dos bons costumes”, lema esse inventado pela burguesia do século XVI e que persiste até hoje em tom cada vez mais moralista e fundamentalista possível. Sabe-se que desde 1500, tentou-se silenciar as práticas homossexuais, seja por meio da Santa Inquisição que queimou milhares na fogueira, seja por meio da legislação criminal que encarcerava os “invertidos” sexualmente. Porém a burguesia da época (e até hoje), como descreve João Silvério Trevisan, em sua obra Devassos no Paraíso (2018), praticavam a torto e a direito ato libidinosos e atentatórios a moral, como eles mesmos descreviam com os homossexuais, onde documentos datados do século XVII descreviam as prisões de pessoas do mais alto escalão da corte sendo presos sob o crime de sodomia.

O termo homossexualidade é atual, vem do século XX, mais a prática sexual de pessoas do mesmo sexo é antiga. Os gregos antigos já praticavam até mesmo baseados em sua legislação, onde os mais velhos tinham que iniciar sexualmente de forma obrigatória os mais jovens, conhecidos assim como pederastas. Essa prática perdurou até a Roma onde a partir da junção entre igreja e Estado acabou punindo os que assim praticassem sexo com um parceiro do mesmo sexo. A visão pecaminosa sobre a homossexualidade surgiu no ocidente, com o grande crescimento da igreja católica.

Houve um grande esforço da igreja e de grupos moralistas da burguesia a todo custo na tentativa de invisibilizar a prática homossexual ou de punir aqueles a que praticavam. No Brasil, a história da homossexualidade é cheia de curiosidades, e convido a você a se permitir conhecer essa história de muita luta e silenciamento. Mesmo com o “aval” da ciência em pleno século XX, confirmando a fluidez da sexualidade humana, quebrando a visão binária do sexo, os moralistas continuavam a perseguição contra os homossexuais. Ainda hoje, por causa dessa visão binária de mundo, onde tudo ou é isso ou aquilo, e o que passar disso é anormal, que muitos foram perseguidos e que discriminações atentatórias sobre a liberdade do outro foram praticadas a luz de uma naturalidade.

É preciso que cada um tenha consciência que essas atitudes são discriminatórias, que o corpo do outro é do outro, não é o seu. Que o desejo sentido é dele, não é o seu. Que liberdades devem ser respeitadas. Os corpos foram estereotipados de tal forma, que eles foram submetidos a uma dominação do outro, que hoje “trejeitos femininos” só podem ser praticados por mulheres, onde quem não o é, corre grande risco de ser corrigida da prática em nome de uma virilidade e normalidade do sexo.

Todavia, não basta apenas essa consciência, como afirma Pierre Bourdieu em sua obra A dominação Masculina (2012), é necessário uma luta mais forte contra a estrutura, pois esse tipo de discriminação está estruturalmente ligada a outras instâncias, que não só a consciência, pois elas estão na igreja, na escola, na família, no Estado. É preciso uma transformação radical, que movimentos sejam cada vez mais incisivos nas conquistas de direitos das minorias. Tem que se fazer barulho. Nunca se calar. Pois o que não é doença, não pode se curar! Quem precisa de cura e de libertação é quem se incomoda com a forma como o outro deseja ou deixa de desejar um outro corpo. O corpo é livre e essa liberdade deve ser vivida plenamente!

Meu objetivo não foi discutir profundamente todas as nuances desse assunto que não deixa de ser delicado e necessário, pois existem outras obras teóricas que fazem isso muito bem. Aqui apenas se tentou semear o interesse pelo tema.

Lume Santos
Enviado por Lume Santos em 08/04/2019
Reeditado em 12/04/2019
Código do texto: T6618505
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