Cidadezinha qualquer

Morar em cidade pequena não “é vida besta, meu Deus” como diz o poeta de Itabira. Pelo menos não na cidadezinha em que moro. Os abalos e babados são uma constância.

No campo social sempre há os buxixos da fulana que traiu sicrano; do beltrano que deixou sicrana; do vizinho que matou o cachorro do outro; do carro roubado; da moça que bateu na mãe; do rapaz de família que roubou um celular; do filho daquele homem que agora é gay; do marido da fulana que também é gay e por aí vai.

Politicamente há os boatos pesados do fulano que traiu o partido; do ex-candidato revoltado porque não foi eleito; do vereador que era e não se elegeu; do que se elegeu e não foi eleito; do prefeito que parou as obras; do deputado que não ajudou; do futuro secretário que vai limpar a educação, a saúde, o mercado municipal e a prefeitura.

Há assuntos demais que falam, falam e nada decidem. Isso porque aqui é uma cidadezinha do interior em que as pessoas se preocupam muito ainda com a vida alheia. Não há muito o que se fazer; uma vez que não há, na humanidade, lazer melhor do que falar da vida dos outros. Somos coletivamente cientes de que esse não é o caminho para a harmonia planetária, mas ainda somos tão primitivos que achamos natural não seguir as regras que nós mesmos nos impusemos nessa vida não tão besta.