Destino Incerto
O meu nome foi perdido
no decorrer dessa vida,
não sei quantas léguas andei
nem por onde o deixei,
nessa minha história
sofrida.
Sei que pertenço a esse chão
como é o solo e a semente,
feito trigo e o pão
a criança e o ventre.
Coloquei meus pés nessa terra
nessa areia tão esquecida,
desde que saltei pra vida
vivo numa vida empobrecida.
O que se vê por aqui
é pouca sombra, muita poeira e pó.
A seca que arrasa
mata tudo por onde passa,
chega da dó.
Cresci em meio as pedras
me arranhando nos espinhos,
a seca levou meus irmãos
hoje sou filho sozinho.
A morte por aqui
vem de toda maneira,
vem da fome e da doença,
na tocaia uma bala certeira.
Meu pai encontrou a morte
de uma forma inesperada,
veio de forma traiçoeira
por uma bala certeira
a sua morte foi matada.
A sombra da morte vagueia
e não tem piedade,
mata velho, criança e
jovem na mocidade.
Costumeiro são os cortejos
guiado por rezadeiras,
velórios durante o dia
com choro a noite inteira.
E hoje outra alma se vai
é o fim de mais uma vida,
foi a peste que levou
a minha mãe querida.
Levarei seu corpo a terra dos mortos
em vida ela não me pertence mais, sua alma está no céu,
e se juntará a meus irmãos
e ao meu pai.
Minhas raízes se foi
naquela última pá de terra,
não irei ficar por aqui
sairei dessa serra.
Passarei em casa para
pegar o que me resta,
não dá pra levar quase nada
pois quase tudo já não presta.
Fecharei aquela porta
para trancar lá dentro a lembrança,
dos poucos momentos bons que vivi
com eles quando criança.
Darei as costas pois
não quero chorar mais,
levarei no peito a saudade,
pra essa terra não voltarei
jamais.
Vou caminhando
sem ter direção,
vou cruzando essas terras
desse esquecido sertão.
No trajeto vou encontrado
vidas também sem destino,
cada um com sua história
cada um com seu desatino.
Em cada rosto uma expressão
na pele as marcas das feridas,
em cada olhar o cansaço
de uma vida dura e sofrida.
Casinhas como a minha
também foram deixas para trás,
sonhos foram enterrados
hoje vivem seputados,
já não são mais reais.
Depois de léguas caminhando
precioso meu corpo repousar,
debaixo de um umbuzeiro
Essa noite vou descansar.
Fico olhando as estrelas
e lembrando da minha gente,
uma lágrima desce em meu rosto
como agora no céu,
fez uma estrela cadente.
Antes do sol nascer
ponho o pé na estrada,
ainda não sei meu rumo
estou entrega ao futuro,
não sei ao certo
onde será minha chegada.
Entrava em terras amigas
ia falar com os conhecidos,
a parada era breve
era só um olá, como vai amigo?
As respostas pareciam
ser as mesmas,
até parecia ser combinado,
nada ali era certo
e no tribunal dessa vida,
éramos condenados.
Se eu disser que nesse tempo
foram só sofrimento,
estarei inventando.
Muita coisa aconteceu,
meu coração não esqueceu,
dentro dele estou levando.
Depois de anos por aí andando
as vezes morando de favor,
em troca de serviço
cumprindo os compromissos,
mas fazia por amor.
Em algums lugares
ficava por mais tempo,
o trabalho era bom,
tinha que manter o meu sustento.
Juntando uns trocados
para qualquer precisão,
quando dava fome,
parava em uma venda
e comprava pão.
Lembro com felicidade
de um caso que me aconteceu,
minhas pernas ficaram mole
meu corpo estremeceu.
Foi a visão mais bonita
que eu vi naquele sertão,
quando entrei em uma venda,
e vi uma linda moça
por trás do balcão.
Sai de lá meio desorientado
não queria ir embora,
tinha que conseguir
um emprego já pra agora .
Depois de umas tentativas
algo me apareceu,
iria trabalhar por um bom tempo,
nas terras do amigo,
de um primo meu.
Diariamente ia na venda
pra comprar alimentos,
e toda vida saia mais forte
o meu sentimento.
Era moça solteira me confessou
em nossas conversas,
ela me perguntava as coisas
e eu respondendo tudo
sem ter pressa.
Suas perguntas eram:
De onde vem, pra onde vai?
és homem sozinho,
ou mora ainda com os pais?
Contava tudo que me pedia
não guardava segredo,
falei das minhas percas
e também dos meus medos.
Falei da minha família
que hoje está seputada,
das estradas sem rumo,
das minhas mãos calejadas.
Sentado no banquinho
do lado de cá do balcão,
eu de cabeça baixa
ela veio e segurou minha mão.
Levantei a cabeça e uma
lágrima em seu rosto descia,
disse sentir tristeza
da história que eu vivia.
Muitas foram as conversas
me contou também de sua vida,
que foi criada pela avó,
pois a mãe no parto perdeu a vida.
Seu pai se mudou pra o mundo
e nunca mais mandou recado,
não se sabe se tá vivo
ou se já foi seputado.
Trabalhava ali por ser
do seu padrinho,
não pegava no pesado.
Ele por ela,
tem muito carinho.
Mas a dois anos
sua avó teria falecido,
morava ainda no mesmo canto,
que por ela em vida,
teria cedido.
Sonhava sair dali
pra uma terra distante,
conhecer novas terras
quem sabe ir pra cidade grande.
Disse a ela que nossos
sonhos eram parecidos,
e vontades a serem realizadas,
perguntei se nossas vidas
não poderiam ser juntadas?
Ela me respondeu que sim
segurando minha mão,
nesse dia não comprei nada,
e ainda ganhei de graça
seu coração.
Ao seu padrinho fui apresentado
um senhor generoso,
não era desses grosso,
por sinal muito educado.
Nosso casório foi simples
porém muito organizado,
nunca fui do luxo
já estava realizado.
Ela estava linda
em um vestido de seda,
combinava com sua pele,
perfeição da natureza.
Seu rosto lindo
me deixou apaixonado,
e sua bondade me fez sentir
queseria pra sempre,
o seu amado.
Decidimos ficar naquelas terras
pra nos organizar,
construir nossa vidinha,
ajeitar nossa casinha
não iríamos se mudar.
O tempo foi passando
e as coisas dando certo,
houve ate chuvas por aqui
pra molhar esse chão deserto.
Nossa plantaçãozinha
ajudava no sustento,
a água para a cisterna
ia buscar num jumento.
Era pra minha vida
o momento mais feliz,
diferente do sofrimento
passado
onde fui muito infeliz.
Ao lado da minha amada
era só alegria,
entre nós era só paz,
sorrisos todo o dia.
Um dia vinha chegando do roçado
carregando uma enxada,
entrei pela porta dos fundos
o meu amor estava na calçada.
Quando me viu sorriu
e logo um beijo me deu,
me fez tocar em sua barriga,
e disse esperar um filho meu.
Lágrimas descia em
meu rosto por tamanha emoção,
abraçando minha amada
agora não eram dois,
e sim três "coração".
Anciosos estávamos pelo
grande momento,
os dias voavam
e já podíamos sentir
ele mexendo.
Seu quartinho estava belo e
bem organizado,
pronto pra receber
o nosso abençoado filho amado.
Certo dia quando me acordava,
percebi que ao meu lado
ela não estava.
Chamei pelo nome
mas resposta ela não dava.
Deitada no chão a encontrei
corri em sua direção,
ela não falava nada
mas bem forte segurava minha mão.
Levei para cama
ela estava muito soada,
quando a deitei
percebi que sangrava.
Disse-me que não ia resistir
pediu pra o nosso filho eu cuidar,
falei que segurasse um pouco,
pois a parteira iria chamar.
Peguei meu cavalo
e saí em disparada,
a parteira morava
a uma légua da nossa casa.
Rápido voltamos
e a parteira começou a agir,
só lembro quando ela me pediu
pra eu sair dalí.
Nervoso estava por
não ter resposta,
não sabia o que acontecia
atrás daquela porta.
Amigos iam chegando
depois da correria,
as mulheres rezaram
orações com ave Maria.
A porta se abriu
era a parteira me chamando
entrei como um louco
não estava mais aguentando.
Assim que vejo minha esposa
percebo algo ao seu lado,
era nosso filho sem vida
em um lençol enrolado.
Me ajoelhei ao pé da cama
olhando sem acreditar,
estávamos tão bem,
me pus a chorar.
Com uma voz mansa e macia,
ela me chamou e me dizia:
-Ele lutou muito pela vida,
mas infelizmente não deu,
nosso querido filho, morreu!
Levantei e fui abraça-la,
senti seu corpo frio e fraco,
e em instantes o meu amor
padecia em meus braços.
Dizia que estaria por perto,
mas que sua mãe iria conhecer,
e ainda mostrar a ela, o neto.
Meu mundo desabou,
não sabia o que fazer,
minha esposa e meu filho,
naquele dia veio a falecer.
Abraçava os dois
não querendo acreditar,
meu filho era lindo como a mãe,
eu não podia criar.
Meu amor, linda como a flor.
minha paz que me guiava,
na terra era minha alegria,
mas hoje no céu fará morada.
Os levei para a morada dos mortos,
lugar onde ficará só os corpos.
Suas almas estará com Deus,
se juntará também aos meus.
No meu peito a dor da saudade,
minha vida não sei como vai ficar,
fecharei também aquela porta,
voltarei a viajar.