A megera que você ama
Chega um momento em que a beleza deixa de impressionar.
Perde espaço para o mal humor e para as reclamações.
Padece diante do tédio e ganha espaço no azedume do dia a dia.
A beleza, aquela antes tida como riqueza e raridade, passa a ser então um incômodo, uma discrepância entre o corpo que a carrega e os valores que já não estão nele.
Este é o momento da tristeza.
O rosto, ainda impressiona, mas já não convence com suas caras, bocas e olhares de amargura e rancor.
A beleza, antes exaltada pela elegância, a candura, a gentileza e a educação, passa a ser um espectro na ausência destes outros valores.
Uma criatura moribunda a frequentar espelhos e vitrines em busca da perdida aprovação.
Não há máscara que já convença, nem maquiagem psicológica que resista.
Uma vez desvelada pela sua própria arrogância, deixa-se ser vista como realmente é e já não convence o mais miserável dos mortais.
E mesmo que assim não fosse.
Mesmo que quem a possui, entrasse pelos anos em dias de uma vida serena, ainda sim, a beleza acabaria.
Só que neste caso, deixaria um rastro de sorrisos iluminados e atos bons de coração.
Portanto, trágica é a existência daquele que se apega unicamente a esta amante tão volúvel.
Ela o trairá, acredite.
E quando isto acontecer, ainda caçoará de você nas noites escuras.
E um dia, para satisfazer a vaidade que anda de braços dados com esta megera, você tentará absolutamente tudo para se convencer que ainda é atraente.
E nos delírios mais profundos acreditará que ainda pode impressionar não importa quem ou como.
O que importa é saber que seus olhos ainda arrancam suspiros e outros olhares mesmo que eles sejam tão caquéticos ou piores que os seus.
Vaidade, eis uma das mortalhas mais terríveis daqueles que querem ser gente.