A Lei por Trás da Lei: Critica À Lei nº 12.990/2014
Conceder cotas para negros no Serviço Público Executivo Federal é alimentar a ideia básica de que necessitamos ter a mesma oportunidade, do ponto de vista jurídico. Essa premissa não me causa espanto, de modo que não reluto a aceitá-la. Porém, ter as mesmas oportunidades a partir de uma intervenção estatal, baseada numa Lei, me parece uma ideia, de plano, desigual, pois as oportunidades de ingresso no Serviço Público são garantidas na Constituição Federal, artigo 37, desde 1988. Segundo a "Lex Suprema", todos podem ter acesso aos cargos públicos, desde que aprovados em concurso público de provas ou de provas e títulos.
Logo, se há uma garantia formal desde de 1988, por que haveria a necessidade de agora, em 2014, o Estado Nacional intervir criando uma Lei que garanta 20% das vagas aos candidatos cuja cor da pele é negra?
Será a cor da pele motivo de exclusão desses candidatos, mesmo estando garantido na Constituição Federal ingresso a qualquer candidato que alcance aprovação no devido certame de contratação? É óbvio que não.
O Governo Brasileiro, ao legislar nesse particular, parte de uma leitura histórica e social que existe há séculos. Entende o Governo que os negros, pelo processo de escravidão, foram prejudicados gravemente em sua dignidade e sociabilidade, também no que se refere a oportunidades iguais, e por isso, agora, séculos depois, necessita adotar medidas legais no sentido de corrigir tal barbárie.
Ora, como é rasa a interpretação acima. Rasa porque a escravidão, quando estudada a fio, é ( digo é porque ainda existe escravidão em vários sentidos) um instituto antiquíssimo. Praticamente todas as civilizações escravizavam: gregos, romanos, babilônicos, egípcios, etc. e a origem da escravidão pouco (pra não dizer nada) tinha a ver com a cor da pele: não era a cor da pele que determinava quem seria escravo ou livre, mas a força de um povo. Nas guerras, o povo derrotado era morto ou torna-se escravo do povo vencedor, a História registra isso!
Todas as civilizações escravizavam os povos que contra elas pejavam e perdiam a peleja, não importando se eram mulheres, crianças, homens ou anciões. Inclusive, muitos eram mortos por serem considerados imprestáveis para o fim servil.
A cor da pele como determinante da escravidão é um argumento que não era critério fundamental para o sistema milenar de dominação e usufruto da força alheia. Além do que, houve escravidão de índios, de brancos, de mulheres, de velhos, de praticamente todos os arquétipos sociais, faixa etária e classe. Se a proporção foi maior entre os negros, isso se deve ao fato de o Continente Africano ter sido invadido por mercadores desse tipo de comércio, mas é bem diferente de entender que só houve escravidão de negros.
Mas se o Poder Público entende que é necessário haver cotas para negros, por terem sido vítimas de escravidão, então deveriam haver cotas para brancos, para índios e para todas as classes que foram escravizadas, afinal, essa maldição chamada escravidão não atormentou apenas a raça negra.
Ainda sobre a escravidão, esta se deu em nosso solo sob o domínio do Estado Português, ou seja, o Brasil mesmo, do ponto de vista jurídico, passa a existir após o período escravista com a Proclamação da República, via Marechal Deodoro, em 1889. Antes éramos Colônia portuguesa, afinal, mesmo após a Independência, continuamos sob dominação portuguesa, ou não era o português Dom Pedro II quem dirigia a Nação? A Escravidão se deu dentro de um período em que os portugueses nos tinham como putas: nos usavam como bem entendiam. Hoje, somos Brasil, um País que construiu sua própria história, se boa ou má, não há consenso, mas pelos menos construímos com nossas próprias mãos, sob alguma espécie de Liberdade. Logo, estamos punindo este Brasil de hoje em nome de uma barbárie cometida no passado por outro Estado Nacional que nos comia no café da manhã. Não parece haver sentido algum nisso.
A situação fica pior quando se vai discutir a escravidão baseada na cor da pele, pelo viés da Biologia, pois, pela ótica da genética, determinar se uma pessoa é negra ou não é uma tarefa difícil: pode haver alguém de pele branca que seja considerada negra, ou vice-e-versa. Nesse sentido, há uma confusão instalada, pois se eu for considerado negro geneticamente, tenho o mesmo direito as cotas reconhecidas no Poder Executivo Federal? Ora, algum magistrado, se analisar um processo que tenha a pretensão de requerer os mesmo direitos da Lei de Cotas, poderá dizer que esta pessoa que pleiteia o direito não é de fato negra nos termos legais, pois não tem sua pele escura, e é nesse sentido que a legislação garante este direito, logo, não haveria, na visão provável do magistrado, direito algum a conceder. Mas se a pessoa é geneticamente negra, e o conceito de beneficiar os negros atuais com base numa leitura histórica de que estes negros descendem dos primeiros negros que habitaram nosso país, como determinar se este de cor branca, mas negro por reconhecimento dos padrões genéticos, também não descende daqueles mesmos que foram açoitados pela escravidão? Ou o contrário: como afirmar que o negro na pele, sendo negro pelo viés genético ou não, é descendente daquela massa de negros que foram atormentados pelo sistema escravista? Sim, isso é importante. Mas não é importante porque estou afirmando que é, mas porque esta é a leitura que o Poder Público utilizou para sancionar esta Lei de Cotas: devemos reparar aos negros todo o mal que estes sofreram através dos séculos em solo brasileiro. Como é gigantesca a estapafúrdia cometida pelo Legislador quando propôs esta Lei sem a menor reflexão.
Além do que, esta Lei desfoca da verdadeira origem do problema de termos menos negros no Serviço Público do que brancos ( em se tratando de cor de pele): o problema é social e não histórico. Se esta disfunção social é histórica, ou seja, vem de tempos atrás, isso só corrobora o fato de que as medidas públicas sociais no sentido de solucionar estas mazelas foram insuficientes. O Poder Público, ao invés de resolver o problema social da educação pública, o que daria condições iguais a quem quer que seja para ingressar no Serviço Público, pois haveria condições equiparadas para a concorrência, procura desfocar do real problema lançando na cor da pele a responsabilidade. Seremos iguais quando nos derem oportunidades iguais por meio da educação, e não quando criarem leis circenses como essa. A solução deveria ser social, e não jurídica, através dessa imbecilidade proposta e aprovada nos termos da Lei.
Mas é cômodo para o Poder Público essa Legislação, afinal, ele ameniza as pressões sociais pelas respostas necessárias e ainda não investe o mínimo que seja para solucionar o problema. É realmente mais fácil passar a responsabilidade do que assumi-la.
As cotas para negros no Serviço Público Federal partem de premissas errôneas e zombam da nossa capacidade de reflexão e análise. Essa Lei é uma estupidez sem tamanho, pois as questões sociais como essa não são resolvidas com mais leis, mas com mais investimento em educação, no controle efetivo da qualidade de ensino, em pedagogias públicas que surtam realmente o efeito desejado pela sociedade. Essa lei não pretende solucionar o real problema a ser combatido, mas apenas montar mais uma lona sobre nossa cabeça: eis mais um circo! e acredite, como nos demais casos, neste Circo, nós somos palhaços.