Tarde
Todos as tardes saio para uma volta.
Coisa de dez minutos, em torno do quarteirão.
Uma espécie de passeio, de fuga do cárcere da tela e dos numeros.
Saio tranquilamente do prédio à espera de um milagre.
Olhos as ruas cheias e as cores do dia.
Nestes minutos acredito que algo mágico vai acontecer. Um evento, uma cena inusitada, não importa.
Caminho sem pressa olhando as vitrines, imaginando que ao virar a esquina, encontrarei alguém com balões coloridos ou uma ideia espetacular.
Hoje vi um catador de papel com o carrinho todo enfeitado para o natal.
Instantaneamente me lembrei do quanto gosto do final do ano. As cores, o cheiro, o clima, o encantamento. Uma delícia.
Metros depois vi uma loja de decoração. Almofadas, cortinas, patchwork, tecidos que lembram casas do campo confortáveis e aconchegantes. Linda de morrer a tal loja.
Não pude evitar a lembrança das minhas aulas de corte e costura. Do tipo clássico. Isso mesmo. Eu escolhi. Régua de madeira e giz em uma época que ninguém mais sequer imaginava que isto existia. Ri no meio da rua.
Na esquina achei uma chave no chão. A chave eu já tinha, faltava o cofre.
Depois veio a loja de fotografia. Pensei nos céus que vejo por aí, nas paisagens que já fotografei e nos morangos que ainda não aprendi a cultivar mas que já registrei na minha câmera imaginária.
Esta é minha viagem, uma fantasia no meio da tarde, uma busca de magia em meio à rotina diária.
Talvez porque quero acreditar que o mundo tem a cara que eu quiser enxergar.
Talvez porque vi um programa que dizia que pessoas com pouco tempo de vida, vivem intensamente os últimos dias... No presente, jamais no futuro, muito menos no passado.
Talvez porque começo a compreender que estado de espírito é só uma questão de opção.
Sei lá. Só sei que amanhã saio novamente. Alguma coisa boa me aguarda nas esquinas da vida.
Disso, jamais duvidei.