Guerreira das Cabalas
Em outras Eras – Mulheres guerreavam amores, prostravam diante de homens como serpentes venosas. Li sobre uma, argilosa política e ao mesmo tempo dama impiedosa, culta de artes e artimanhas. Conquistava impérios além de continentes dentro do peito de um homem. Suntuosa, ávida de inteligência, valente (adjetivo atribuído a homens) mas peculiar em seus atrevimentos, enfim, quisera eu ser como Cleópatra...
Sinto falta de referências e por isso, fui buscar em séculos antes de cristo, reconciliação com a minha auto afirmação de mulher guerreira. Longe de mim, o título faraônico de rainha, mas antes de ser tudo isso ela tinha como eu, seus momentos de fraqueza, necessidades, reconhecimento (nisso ela era ambiciosa) e vou ignorar os delírios de ser mãe não sei quantas vezes, para perpetuar no trono... A verdade é que hoje em dia, mudaram os amores, as sanções de convivência, muita coisa realmente, enfim, se antes uma mulher lutava pelo amor ao poder, pela justiça dos homens para ser notada como igualitária e merecedora de títulos e riquezas, agora a luta é quase despretensiosa...
Será que é ridículo dizer que hoje, lutamos por amor incondicional de um homem? Ou pelo amor a profissão, ao trabalho que não dá riqueza em espécie mas em contento moral... Sei que o conceito de felicidade em tempos muda de acordo com regência de vida, mas quê ser humano sente isso tão diferente? Duvido que a felicidade de Cleópatra ao ser desenrolada do tapete em apresentação a Julio Ceasar como plano mirabolante em prol da política (seu verdadeiro amor) foi mais importante individualmente para ela do que pra mim, quando fui devidamente cortejada como rainha em um quarto de hotel por 24 horas! – Para a história nem quero divagar argumentos, estou aqui, tomando partido da mulher Cleópatra e não da farani de feitos soberanos e mitos dignos de deusa. Falo exclusivamente do ato que gerou amor...
Deixa eu largar a infantaria de loucuras e desabafar logo meu discurso feminista e individualista. Eu precisei angariar inspiração para fortalecer meus brios, corpo e alma, neste exemplo obsoleto de mulher que é insana por reconhecimento. Não quero saber se ela casou com o irmão por nome a dinastia, se mandou matar irmãs e irmãos, se seu relacionamento com Ceasar foi puramente união política, se Marco Antônio foi seduzido pela beleza ou perspicácia naquele banquete de honrarias... Enfim, diante de tanta grandiosidade, descomunais responsabilidades, perante um tempo em que o menor dos fracassos era perder uma guerra de fato, me pergunto, por que o triunfo impera sobre uma palavra, um gesto de aceitação alheia? Porque para se amar hoje em dia, requer tantas condições?
Naquela época, este tipo de amor que faço parte hoje, era um negócio a parte da vida comum. Obviamente existia paixões, sentimentos atrozes de amor e tal, mas não era o essencial para uma mulher de personalidade alucinante, prever fidelidade de um homem, de ter como posse o homem. Eram sim, dependentes de suas posições, até mesmo Cleópatra foi... Então, li e vi, bustos de sua imagem e palavras dizendo que ela não era bonita, digna de lapidar seu busto em ouro no templo em que Ceasar cultuava Vênus (alguém acredita que Vênus era avó de Julio Ceasar?) pois bem, ela mereceu por outros motivos, e são estes que almejo superioridade. Astúcia, crença inabalada na própria capacidade, postura culta e sedutora pela presença de espírito e não somente arquétipo... Coragem de enfrentar o mundo com estratégias e não planos sem pano de fundo como vejo a maioria das mulheres ostentar suas necessidades.
Invejo Cleópatra por um detalhe (entre tantos), falava sete línguas, escrevera livros sobre pesos e medidas, magia, flagrâncias – coisas que dominava talvez? Queria eu dominar algo tão veementemente e defender com a própria alma minhas certezas. Mas não foi honrosa a sua morte. Diria que ela foi covarde mas de bom gosto e sutil esperteza, deixar uma cobra lhe picar, envenenar suas entranhas, para não ser tripudiada pelo povo e a hierarquia do poder... Cleópatra morreu só, como todos morrem na verdade, mas é interessante ainda ver que mesmo com uma morte dessas, a sua estória prevalece notória.
É assim que escrevo a minha estória... de fatos que não possam ser apagados pelos erros. Que faça prevalecer em tempos a minha postura com a verdade, para isso, a cada dia tomo exemplos (como Cleópatra) e faço a minha parte entre meus devaneios e acertos...
Quando tento visualizar Cleópatra, imagino como súdito homem, o que pensaria dela... E desboquei estes versos para compartilhar do mito de mulher dominadora:
“Esfinge voluptuosa de traços bélicos
Inanimada amada, sois teu servo
Rogo misericórdia em prantos servis
Não faça escória destes lábios gentis...”