Somos todos necessariamente teólogos,e a nossa noção de Deus é tão incontornável quanto o desejo de compreender a realidade na qual nos encontramos inseridos.O conceito de Deus é necessário até para quem pretende reputá-lo por fantasioso ou inexistente,por considerá-lo ultrapassado ou primitivo.Herdamos de nosso mais longínquo ancestral a necessidade de atribuir sentido ao universo do qual fazemos parte,e à compreensão de nossa própria natureza humana,por vezes tão contraditória.As religiões,enquanto crenças institucionalizadas,propõem respostas nesse sentido com seus ritos de conteúdo simbólico,sua antropomorfização e seus sacerdotes,mas a idéia de Deus a antecede,remonta ao primeiro questionamento existencial a que se atreveu o primeiro homem nesse planeta.
Nada é mais humano que esse vazio à espera de Deus impresso em cada consciência.
Uma vez que a busca por Deus originariamente decorre da necessidade de um melhor entendimento da realidade e,por conseguinte,do próprio homem,não é exagero afirmar que a negação sistemática ao que se acredita ser Deus caracteriza uma curiosa condição na qual a realidade,extinto o Deus que a faria coerir,cumpre um fim em si mesma ao sabor da causalidade impessoal,operando cegamente processos naturais ao acaso.O homem,nessa concepção,é ator/autor de seu próprio destino,com toda a miséria de suas escolhas notoriamente infelizes a coroar suas façanhas eivadas de orgulho desmedido pela história.
O teor dessa percepção deicida costuma ser menos razoável do que normalmente se alardeia,com satisfação.De fato,é em nome da lógica e de uma mente racional que se reputa por superstição e crendice tudo quanto não se sustente por evidência empírica,prova científica e comprovação por avaliadores ‘imparciais’.O problema é que não há muita lógica nem razão em superestimar a dúvida (pelo cacoete de duvidar) em detrimento a crença,qualquer que seja.Tampouco é razoável atribuir à ciência o status de sabedoria suprema sobre absolutamente tudo,inclusive o que foge ao escopo da ciência.A tentativa de abolir Deus do universo fracassa exatamente por não dar conta do que costuma ser atribuído a Deus,a criação de todas as coisas,inclusive o homem:não pode,por mais que tente,apagar ‘as coordenadas de Deus’ gravadas em seu espírito,de modo que quando expulsa o Eterno,algo necessariamente ocupará o Seu lugar,será seu novo deus.
De modo que,pouco importa o motivo pelo qual se chega à visão de mundo ateísta,decepção com a religião,decepção com os pais,carência emocional,desconforto com as implicações morais da existência de Deus,não importa,em última análise tudo aponta para um ato da vontade,em grande parte carregado de componentes emocionais e/ou plano de fundo psicológico em desordem.