Ela estava bem acomodada na rede e lia, talvez pela terceira ou quarta vez, Crime e Castigo. A sua manta preferida, colorida em vários tons pastéis de diferentes cores e entremeada por rendas, cobria suas pernas vestidas por uma bermuda de linho.
Um automóvel para na estrada estreita, ladeada de pequenos botões lilazes e capim, brincadeira para o vento, que teimava em sacudi-los. Ele desce do carro devagar; olha de forma comovente aquele mar verde que balança como ondas ao sabor do vento , subindo e descendo... distraidamente, solta os braços e deixa que seus dedos toquem com a mesma suavidade do balanço do capim, aquelas ondas.
Acorda daquela satisfação e dá mais alguns passos; abre o baixo portão de madeira, passando por cima o braço e puxando o ferrolho. Atravessa o espaço gramado e com grandes pedras arredondadas , amareladas como sua roupa bege claro, leve, solta, de tecido propositadamente enrugado, fazendo um passeio até a varanda.
Aproxima-se cautelosamente e, com voz trêmula, diz:
- Interrompo?
- Quem é você? pergunta Clara, fechando o livro.
- Não lembra? Sou “o homem dos peixes”
- Ah! Lembro sim... e o que faz aqui?
- Vim apenas para saber de ti algo que me rouba a paz e a tranqüilidade: ainda me amas?
Ela segura suas mãos finas de quem nunca pescou e, pausadamente, responde:
- água e azeite não se misturam; nem mesmo quando a profundidade do oceano termina e só há a quietude dos seres que repousam nas locas, a areia dormindo e o silêncio nunca escutado.”
Fragmento do livro Diálogos (em meu pensamento)
Imagem: Google - autoria de Barbara Jaskiewicz