Corte vertical
Um olhar despretensioso, inquieto que não visa sequer o caminho a ser trilhado se depara com uma singular árvore murcha que se projeta no meio da calçada de concreto duma praça simplória.
O choque imediato traz uma inesperada tranqüilidade! E os olhos fixos nos galhos retorcidos pela angústia úmida insaciada, enchem-se de lágrimas e de regozijo.
Observar aquele objeto estático, inanimado, sem graça é um alívio incomum aos energúmenos desprovidos de intencionalidade fugidia; é na verdade uma evasão do ciclo temporal descontínuo no processo já desequilibrado que ocorre na mente lunática.
O prazer sentido contrasta com a circunstância deplorável observada por um terceiro.
Todavia a fruição é uma dádiva súbita manifesta em diversos graus; nem mesmo um sonho plácido, bucólico é equivalente à saída de si mesmo ocasionada pela contemplação irracional da natureza em geral.
Não existe diferenciação individual do sentir, o que há é a própria condição pura da intuição propiciada por qualquer objeto sujeito à observação estética.
O senso da própria existência é suprimido e degredado para longe de si; sobra a sensação que transcende as vis funcionalidades orgânicas e psíquicas. No final desse inebriante estado quietivo, os olhos voltam-se sobre si mesmos reconhecendo a minúscula condição humana no meio desse mundo onipotente e imprevisível.
Porém, ao retornar à consciência, ao meio social e às coisas mundanas há um perseverar da Ilusão (que é o mundo dos conceitos) criada com o intuito de apaziguar o senil enigma temeroso acerca do pós-morte, que é o simples retorno àquilo que éramos antes de nascermos.
Os mesmos olhos, acompanhando os passos hesitantes, viram-se sobre os ombros curvados pela escoliose e não conseguem mais ser cativados por nenhum ponto de fixação e o peso de tentar perpetuar os momentos efêmeros da rotina, sem prestar atenção nas coisas simples que nos rodeiam, lança por terra o autêntico espírito – puro sujeito do conhecimento – que ignora seu destino e a si próprio.