Neblina e a Ninja, capítulo 1 Morte em Nova Brasília
CAPÍTULO 1
MORTE EM NOVA BRASÍLIA
(Nota: o prefácio e a introdução saíram em 26 de junho)
Quando o Inspetor Madeira chegou ao local, já havia sido montado um cordão de isolamento que mantinha os curiosos à distância. Sob o olhar sombrio dos policiais e do médico legista que já se achavam no local contemplou, com as mãos nos bolsos, o corpo estendido de bruços. Não era uma visão agradável, principalmente se pesadas as implicações daquela morte. Pessoas importantes, assim pensava Madeira, jamais deveriam morrer
assassinadas, pois tais crimes trazem grande perturbação à sociedade, à opinião pública.
— Causa-mortis?
— Concussão cerebral. Bateram violentamente com sua cabeça na parede.
O tom de voz do legista era frio e profissional. Madeira sentiu frio e, colocando as mãos nos bolsos, olhou em volta. Por enquanto ninguém da embaixada viera, mas isto não iria demorar. Madeira, sentindo-se estranhamente inquieto, percebeu vagamente uma movimentação das pessoas, a uns quinze metros, mas não ligou, embora lhe parecesse que abriam caminho para alguém.
Tornou a olhar o corpo e, lamentando a encrenca que tinha nas mãos, abaixou-se para examiná-lo.
O corpo era de um homem de 50 anos, volumoso, bem vestido, com tecidos estrangeiros. Parecia aos policiais que não se tratava de latrocínio. Essa impressão se confirmou quando as suas mãos experientes trouxeram de um dos bolsos uma carteira cheia de dinheiro.
Alguém parou sutilmente por trás do ombro esquerdo de Madeira.
— Inspetor, na algibeira interna parece que há um envelope. É melhor olhar o que é.
— Hein?
Madeira voltou-se e ergueu-se. Diante dele, uma aparição insólita: uma garota magra, de estatura média, mascarada e vestida de preto. Estava de calças compridas, blusa de manga comprida, sapatos elásticos, tudo preto: até luvas pretas. A máscara negra deixava ver olhos azuis impressionantes, sob grossas sobrancelhas. Quase todo o rosto, inclusive parte do nariz, permanecia oculto sob a máscara, que era presa à blusa; contudo cachos de cabelo negro, lindos, eram visíveis. Num primeiro momento o inspetor não percebeu os detalhes da capa, já que a posição da moça a ocultava. A capa majestosa era de azul turquesa, iridescente, repleta de motivos astronômicos: Lua, Sol, estrelas e galáxias, cometas, Saturno, Marte, Vênus, Júpiter, quasares e abismos negros. Com exceção desses últimos, todas as figuras eram feitas de um bordado que parecia de prata, verdadeiras lantejoulas astronômicas.
— Quem é você? Quem a deixou passar?
— Eu sou Neblina e tenho um passe do Ministério da Justiça. Sei que o senhor é o Inspetor Madeira.
O tira fitou com raiva a figurinha que o desafiava. O passe estava em sua mão direita e acendia uma luz azul piscante, sinal da correta identidade da portadora pela pressão do dedo polegar. Ele já sabia quem era Neblina. Era uma beneficiária do Estatuto dos Superdotados e protegida por um figurão do Ministério da Justiça. Já havia colaborado com a polícia em vários pontos do Brasil.
— O que você quer aqui?
— Inspetor, eu soube desse homicídio e vim colaborar nas investigações.
— Desculpe, eu agradeço mas a polícia não tem necessidade da sua ajuda. Nós não costumamos aceitar que leigos tomem parte nas investigações.
— Mas eu tenho uma autorização expressa do Ministério da Justiça.
— O que?
A mascarada passou-lhe o termo plastificado e autenticado, assinado pelo Ministro da Justiça. O inspetor sentiu uma profunda amargura, um sufocante despeito.
— Como você arranjou isso? — indagou, sem esconder a aspereza da voz.
Neblina já havia cruzado os braços, com cuidada paciência.
— Existe um Estatuto...
— Sim, eu sei. Inferno! Porque o Ministério da Justiça tem que interferir com a ação da polícia?
Neblina sorriu.
— Inspetor, e o envelope? Vamos ver esse envelope?
Vários colegas de Madeira estavam já à sua volta, perplexos. Talvez esperassem uma ordem para expulsar a garota, mas Madeira estava impossibilitado de dá-la.
— Mostre a eles sua autorização, enquanto eu olho o envelope – disse secamente.
Neblina, porém, não pretendia perder o exame do envelope e entregou o pergaminho a Lustosa.
— Podem olhar à vontade, e depois me devolvam.
Sem ligar para os murmúrios de reprovação, Neblina encostou-se a Madeira, que abria o envelope (que não se encontrava lacrado).
O documento entregue a Lustosa dizia:
“Por meio desta AUTORIZAÇÃO ESPECIAL, a cidadã registrada com o nº109 do Estatuto dos Superdotados, Seção do Brasil, cuja identidade está protegida pela Lei 24010, artigos 4 e 5, de 20 de julho de 2453, está apta a prestar serviços à polícia de Nova Brasília, usando o nome de NEBLINA e uniforme com capa e máscara, em qualquer caso de homicídio, latrocínio e ameaça às Torres Energéticas, e em especial está autorizada a participar de qualquer investigação referente à ação dos “Bandidos Negros”, se tal grupo penetrar na cidade. Devem as autoridades policiais colaborar com a Senhora Neblina, abrindo-lhe facilidades e evitando qualquer estorvo ao seu trabalho.”
Seguia-se a data daquele dia e a assinatura do Ministro da Justiça.
— Quem são esses Bandidos Negros? – indagou Lustosa, pouco disposto sequer a crer em sua existência.
Neblina não respondeu. Estava ocupada em acompanhar o que dizia a carta, digitada por um micro muito antigo:
“À POLÍCIA DE NOVA BRASÍLIA:
O porco que vocês estão examinando é Tadeu Popescu, cônsul da Romênia. Nós o eliminamos para vingar a nossa expulsão daquele país. Oportunamente completaremos a nossa vingança.
Esclareço que este é o início da nossa campanha de terror em Nova Brasília. Esta cidade será nossa, e se as autoridades constituídas tentarem nos impedir, serão destruídas sem contemplação. Não aceitaremos qualquer tipo de oposição. Sobretudo, queremos a posse das torres de energia. Quem se opuser a nós, morrerá.
As. SYBILLA, a Ninja
Líder dos Bandidos Negros.”
Após ler a mensagem com o pensamento, Madeira leu-a em voz alta para os presentes.
— Isso responde à sua pergunta — dirigiu-se Neblina a Lustosa, que observou-a com desprezo no olhar.
Madeira também estava irritado com a presença da garota:
— Afinal o que você sabe sobre isso?
— O que “Z” me revelou, inspetor. Apenas isso.
Madeira sabia da existência do misterioso personagem do Ministério da Justiça, conhecido como “Z”. Não era alguém que se pudesse desafiar à toa.