O SERTÃO

Eu era muito pobre, morava no sertão brabo, minha casa era de taipa e não tinha um móvel si quer, só um fogão à lenha, um paneleiro feito de madeira amarado nos caibros de marmeleiros, armadores de jucá, e um buraco la no fim do quintal, cercado de palhas de carnaúbas. Aos onze anos já trabalhava na roça, só pra chegar la andávamos ( eu e meu pai ) duas léguas, eram duas horas de caminhada, dizia sempre meu pai, saiamos 3 horas da manhã e começávamos a trabalhar às cinco, geralmente era na maioria das vezes colhendo algodão, levávamos uma enxada (cada um), uma foice, uma cabaça com água, um surrão pra trazer e catar o algodão e um bornal com feijão, rapadura, sal e óleo, além da socadeira e da baladeira, pra matar a mistura. Não tinha noticia de nada no mundo, para ser sincero não sabia nem o que era mundo, só conhecia fazenda e bicho, a unica novidade era quando alguém morria, ou um bicho era picado por cobra. Meu pai mal falava comigo, só mandava e dizia Deus te abençoe, dinheiro era coisa complicada, e eu só juntava uns trocados pra comprar roupas do galego, vendendo couro de tiú pra ciganada. Eu sonhava em ir embora dali todos os dias da minha vida, e o nome Fortaleza suava como musica, Fortaleza, Fortaleza. Quando completei 18 anos, minha mãe falou pra mim que soubera que la em Mombaça estavam tirando documentos do pessoal do campo, pedi ao meu pai pra ir lá, peguei minhas troças e meus apurados dos ciganos, - bença pai, bença mãe, e fui embora. Depois de tirar meus documentos, carteira de identidade e trabalho, resolvi não voltar mais pra roça, mandei recado pra mãe e pai que ia embora pra Fortaleza. Peguei um ônibus e gastei tudo que tinha ganho com os tiús, a viagem demorou o dia todo, o ônibus deu prego, e à noite cheguei na rodoviária de Fortaleza, era linda, fiquei a noite toda acordado só observando o povo pra lá e pra cá.

Fred Coelho
Enviado por Fred Coelho em 17/10/2019
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