Contos Cruzados (I)
I – Carol
A aula já havia acabado quando a garota de cabelos castanhos cacheados levantou-se da carteira. A professora Rita recolhia seu material e enquanto a garota entregava sua redação, a professora lhe disse:
- Espero que não esteja igual à outra. Por mim, você reprovava de ano e pode ter certeza que não será apenas uma redação que vai salvar suas notas.
Carol azedou e respondeu:
- Mano, se você tiver algum problema, pode conversar com a minha mãe!
- Primeiro: eu não sou “mano”, sou professora. Segundo, eu já conversei com a sua mãe e já a deixei avisada que, por mim, você já está reprovada desde o primeiro bimestre. Não é porque sua mãe é a diretora da escola que te tratarei com privilégios. Estou te dando uma chance. Aproveite. – ela pegou o material e saiu da sala.
Carol bufou e voltou para a mesa. Uma garota que mais parecia sua irmã gêmea de costas, guardava o material de sua amiga. Usava o mesmo estilo de roupas que Carol, portava-se da mesma maneira, até a cor e o penteado do cabelo era igual, de uma maneira bizarra. Bety, como se chamava a garota, recolhia o material de sua amiga.
- Guarda essa porcaria no meu armário. – disse Carol, entregando a chave do armário para Bety. Carol sentou-se sobre a mesa, enquanto olhava Bety sair da sala. Bety tinha os cabelos como os de Carol. Castanhos, um pouco mais escuros cacheados e com o mesmo corte da amiga. Seus olhos eram castanhos e seu nariz, avantajado. Apesar de terem o mesmo estilo, Bety era um pouco desengonçada.
Carol olhou para o lado e avistou Lucas terminando de guardar seu material.
- Oi gatinho! – disse ela, apoiando-se na mesa, deixando seus seios salientes próximos aos olhos de Lucas. Ela usava a camiseta do uniforme da escola, tão branca que transparecia seu sutiã de rendas por baixo, e uma calça preta apertada, realçando suas curvas.
Lucas olhou para cima e após dois segundos de distração, respondeu:
- Ah, oi Carol!
Ela lhe deu um selinho, animada e disse:
- Vamos?
- Aonde? – ele parecia confuso.
- Para o shopping – respondeu ela, impaciente.
- Ah, fazer o que lá?
- Como fazer o que? – bufou ela. – Você disse que me ajudaria a comprar umas roupas novas, lembra? Além do mais, as minhas já estão velhas...
Lucas olhou para a calça e para a jaqueta de Carol. Ambas as peças eram novas e ela havia comprado na semana passada, em uma loja de marca.
- Tem certeza de que você precisa de roupas novas? – perguntou ele, erguendo uma das sobrancelhas, ainda olhando para a jaqueta da garota.
-É claro que tenho! Vamos!
Ela puxou o garoto pela mão, enquanto ele não saia do lugar.
- O que foi? – perguntou ela impaciente, ao perceber que ele não se movia.
- Combinei de jogar futebol com os meninos.
- Hoje? – perguntou ela, insatisfeita.
- Agora. Me desculpe, linda – disse ele, ao ver a cara de decepção dela – Te prometo que amanhã nós vamos! – Ele se levantou e a abraçou pela cintura. Ela olhou para baixo, triste e zangada e balbuciou:
- Amanhã não dá. Preciso disso hoje.
Ele tirou a mão da cintura da garota e respondeu, zangado:
- Suas roupas não podem esperar um dia? Por acaso a loja vai sair andando amanhã?
- Você sabe que quando eu quero uma coisa, eu quero na hora! Não vou esperar! Vou pedir à Bety para ir comigo.
- Isso, ela entende de roupa melhor do que eu.
- Eu entendo de roupa. Ela está aprendendo comigo. E vê se arruma mais tempo pra mim, antes que eu apareça com outro que me dê mais atenção...
Ele a beijou e disse:
- Amanhã a gente sai. Agora – ele colocou a mochila nas costas – eu preciso ir. Te vejo mais tarde.
Lucas saiu da sala enquanto Bety entrava.
- Por que demorou tanto? - perguntou Carol.
- O corredor tava cheio. Eu...
-Tanto faz, anda logo.
As duas saíram pelo corredor, quando Carol deparou-se com Lucas, guardando os livros de outra garota no armário, enquanto a mesma olhava agradecida, de muletas e perna engessada para ele. Ele entregou a chave do armário para a garota morena, de cabelos ondulados e expressão simpática. Beijou-a no rosto e saiu andando enquanto Carol aproximava-se da garota com dificuldade, devido ao corredor lotado.
- Ta difícil pra guardar os livros aí, Beatriz? – perguntou Carol, ironicamente. Sua amiga Bety estava ao seu lado, apenas observando calada.
- Um pouco – respondeu a garota, tentando guardar com dificuldade a chave na mochila, quase perdendo o equilíbrio na muleta.
- Tanta gente no corredor, mas pelo jeito o Lucas é o único que tem mãos aqui e que pode te ajudar com isso, né?
- Olha Carolina, foi ele quem me ofereceu ajuda e eu não estou bem em um momento da minha vida onde posso recusar, né?
Uma garota de cabelos lisos e platinados, um pouco mais alta que todas ali, chegou por trás de Beatriz, já encarando as duas meninas que conversavam com a mesma:
- Problemas, Bia?
- Não – respondeu a mesma, sem tirar os olhos de Carol – É que a Carolina não se sente confortável quando o namorado dela me oferece ajuda para guardar os livros. O que é interessante, já que ela mesma não se preocupa em me oferecer ajuda.
- Namorado? – Riu Alice – Que namorado? Todo mundo sabe que o Lucas ta enrolando ela desde o ano passado e que nunca pediu ela em namoro. Até o Bruno fala isso.
- Pelo jeito as coisas não vão bem, né Carolina? – perguntou uma de cabelos castanhos claro, cacheados, até metade das costas. – Abre o olho, não assumiu até agora, não assume mais...
- Pra sua informação, Sônia – Carol respondeu à menina que acabara de chegar – nós estamos sim, namorado. Eu não quis aceitar no começo pra não atrapalhar meus estudos e porque não queria que a minha mãe soubesse, pois como vocês sabem, ela é a diretora daqui. Mas já conversei com ela e ela adorou a idéia, e agora estamos juntos e muito felizes.
- É? Então cadê a porra da aliança?
- Vai chegar daqui alguns dias. Ele mandou fazer em um lugar não muito confiável, então gravaram nossos nomes errados. Por isso, eu mesma mandei pra um lugar de confiança, onde fizeram as alianças dos meus pais. E é linda, de prata. Logo vocês vão ver!
- Interessantíssimo, mesmo! – disse Bia, ironicamente – Mas agora preciso ir, não dá pra ficar muito tempo em pé com esse gesso. Tchau!
- Espero que agora você se toque – disse Carol, entrando na frente de Bia – Não quero você perto do meu namorado.
- Então diga isso pra ele – respondeu Bia, tranquilamente – Não sou eu quem peço ajuda à ele. É ele quem me oferece. E agora, sério, da licença, eu preciso mesmo ir. Você está bloqueando a minha passagem!
Carol saiu da frente, ainda fuzilando a garota com o olhar. Alice e Sônia seguiram a amiga.
- Não liga pra isso! – disse Bety – O que importa é que você e o Lucas estão namorando!
- Não estamos. – respondeu Carol, seca. As duas andavam pelo corredor.
- Não? – exclamou Bety! – Eu achei que estavam!
- Mas não estamos, você é surda por acaso? –Gritou Carol.
- Calma, eu só fiquei confusa! Não precisa gritar! – Bety disse, magoada.
- Me desculpe, ok? É que eu fiquei nervosa e você não parava de falar... Vamos esquecer isso, ta?
Bety não respondeu nada, apenas concordou com a cabeça. Ao passarem pelo pátio da escola, avistaram três garotos conversando. Eram 1 ano mais velhos, estavam no terceiro ano. Um deles observou-as caminhando até a saída e assoviou:
- Ô, Carol! Finge que não conhece mais?
Ela acenou brevemente e continuou andando. Ele saiu correndo atrás dela.
- Vi você cantando no evento da escola. Tava uma delícia, hein? – Ele riu.
- Eu sei. – ela disse, sorrindo, sem olhar para ele e caminhando rapidamente.
Ele continuava andando rapidamente ao lado dela e de Bety, ignorando totalmente a presença da última ali.
- Espera, Carol, eu tava pensando aqui...
- Pensando? – Bety riu – Não sabia que isso era possível...
Ele olhou-a de cima abaixo e ignorou a garota totalmente. Continuou seu discurso:
- Quando é que vamos sair de novo?
Rafael era alto, musculoso. Muito atraente, cabelos castanhos arrepiados. A camiseta do uniforme colava em seu corpo malhado e destacava seus músculos e peitorais. Olhos castanhos e queixo quadrado, exalando perfume masculino.
Carol parou assustada e fitou-o nos olhos. Olhou para os lados, puxou o garoto pelo braço e afastou-se com ele, deixando Bety esperando-a de canto.
- Não fale alto! Sabe que minha mãe pode escutar! – Ela parecia aflita.
- Desculpa! – ele riu – Mas é sério, quando vamos sair?
- Nunca mais! – ela respondeu ríspida – Eu to ficando com o Lucas, pra tua informação!
- Lucas? Ah Carol, me poupe... – disse ele, impaciente – Todo mundo sabe que o Lucas é um idiota que dá em cima da escola inteira por trás de você. Ele só te enrola...
- Cala a boca, não fala assim dele!
- Eu jogo futebol com ele. Daqui a pouco vamos jogar. É sério, ele fica mexendo com as meninas que vão ao parque assistir. É ridículo!
- Eu não acredito em você!
- Mas é verdade. Posso te mostrar se você quiser! Olha, eu cancelo o futebol com eles, vamos sair hoje... Eu e você, ir pra um lugar mais reservado...
- Não, pára com isso! E alem do mais, hoje eu já tenho compromisso, vou comprar umas roupas...
- Roupas pra que? – ele falou admirando o corpo dela – Você fica bem melhor sem elas. E eu acho que você também ta com saudades, não ta? – ele colocou a mão entre as pernas dela – Eu sinto que ta... Vai, vamos sair... Eu aposto que você não vai mais querer saber do Lucas a partir de hoje...
O pátio já estava praticamente vazio. Somente Bety observava os dois enquanto esperava a amiga. Ele enfiou a língua no ouvido dela enquanto ela suspirava de prazer.
- Não Rafael, eu já disse que não...
Ele colocou a mão por dentro da calça dela e começou a tocá-la ali no meio do pátio. Ela estava molhada e gemendo no ouvido dele.
- Tem certeza? – ele continuava tocando-a – Se você disser que não, eu juro que paro agora e nunca mais vou atrás de você.
- Rafael, eu não sei...
Ele tirou a mão dele de dentro da calça dela e se afastou.
- Certo. – ele disse, pegando a mochila no chão e colocando nas costas – Boa sorte com o Lucas.
Ele já ia se afastando quando ela gritou:
- Espera! – ele parou ainda de costas e ela perguntou – Onde e que horas?
Ele virou-se para ela novamente e sorriu.
- No parque. Às duas...
- Ficou maluco? – disse ela – O Lucas vai estar lá! Não posso aparecer no parque com você!
- Relaxa linda, fica tranqüila. O parque é grande, não tem só o campo de futebol. A gente vai pra outro lugar, conheço um que é perfeito...
- Já disse que não! – ela retrucou estresada – É muito arriscado, ele pode ver a gente.
- Eu to falando pra você que é seguro, não confia em mim? Ou será que você ta arrumando desculpa porque não quer mais ficar comigo? Porque se for por isso relaxa, eu já to indo embora... – ele virou-se e ia caminhando até a saída da escola, quando ela correu atrás dele.
- Espera! Espera, caralho! Ta bom, vamos... Mas eu juro que se alguém avistar a gente eu mato você!
- Pode ficar tranqüila – ele sorriu e piscou – Ninguém vai encontrar a gente. Aonde te encontro?
- Metrô Tatuapé, às duas.
- Te vejo lá. – Ele a puxou e a beijou. Ela rapidamente afastou-se e olhou para o lado. Apenas Bety observava a cena.
- Caralho, não faz isso aqui! Ta todo mundo olhando! – Ela olhava preocupada para os lados. Enquanto virou-se, sentiu que ele apertava uma de suas nádegas. Continuou andando sem olhar para trás, ao encontro de sua amiga.
- Não sabia que você tava ficando com ele de novo... – disse Bety, com olhar de reprovação.
- Cala a boca, minha mãe ta no carro!