VIDAS E VARAIS
Órfão, desde nova, trabalhara toda uma vida como doméstica em uma única residência. Jamais casara; namorados, uns poucos, dentre aqueles que prestavam serviços temporários naquela casa; não era de sair. Filhos, nenhum.
Quando da morte do patriarca do lar, já viúvo, o testamento nada lhe deixara. Os dois filhos herdeiros, já adultos, cada qual pensando os seus próprios vôos, lhe comunicaram que teriam que vender a casa, mas que lhe dariam uma boa quantia para que ela sobrevivesse até obter novo emprego (apesar da idade).
- Não carece, não, meus fí, quero só saber de quanto custa essa casa, quem sabe a poupancinha que essa véia fez dê pra comprar. Essa véia quer morrer aqui.
Era analfabeta e sem noção de valor, e eles sabiam; e, tocados pela emoção, decidiram que ela continuaria na casa e
ainda lhes daria uma ajuda de custo.
- Pois, tá bem, meus fí. Quando tiver umas roupinha pra lavar, tragam, que essa véia faz com gosto.