LOUCURA DE AGOSTO
Naquele bairro, o fim de julho era marcado pela loucura de Alfredo Bini, que entrava em seu carro imaginário e seguia em disparada pelas ruas apertando uma buzina presa ao cinto. As corridas noturnas aconteciam apenas em agosto. Nos outros meses, Bini era um funcionário exemplar. Trabalhava no boteco do Juca, levando uma vida simples e pacata, sem a menor lembrança dos tais passeios com o carro que nunca existira.
A fama de Bini ultrapassou as fronteiras da vizinhança. A cada ano, curiosos de todos os lugares apareciam para vê-lo pilotar seu veículo inventado. O movimento na região aumentara tanto que a lojinha do Said passou a vender um boneco dentro de um carrinho de plástico transparente. No bar do Juca o primeiro chope era de graça. E um fotógrafo lambe-lambe tirava retratos das pessoas que andavam de carona no automóvel fantasioso.
As temporadas da loucura de Bini engordaram diversos bolsos até que, numa noite, três sujeitos esquisitos apareceram por lá, enquanto ele conversava com alguns visitantes na calçada. Os homens estranhos começaram a gritar e correr, fingindo que haviam roubado o carro invisível.
Desesperado, Bini tentou perseguir os arruaceiros, mas eles eram muito mais ágeis. Sem fôlego, parou no meio da rua. E ficou ali, imóvel, debaixo da chuva fina que começara a cair. Um grito ecoou pelo bairro: Bini acabara de perder sua alegria de agosto.
Naquele exato instante, o filho do Juca virou a esquina, vestindo pijama de flanela e uma capa preta. Ele correu em direção ao amigo tentando acalmá-lo:
— Bini... Bini... Eu bati neles com meu caminhão.
(*) IMAGEM: Google
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