Momentos

Eventualmente sobre um papel embolorado qualquer

Despejam-se ávidas palavras incontidas

Feito gotículas de essência borrifadas

Levam-se, entremeiam-se

Uma sobre a outra

N'inocente cadeia de eloquências ocasionais, ciganas

Adornos moribundos da prosa acidental, crias da prosopopeia

A transmitir pelo papel essência humana, falha e miserável

A conceder sentimentalismo a uma torrente de estrofes amontoadas

E tecer por sobre o nada dissonâncias e consonâncias impensadas,

Numa canção improvisada que toma forma e nasce.

Imprudentemente despejada.

Espontaneamente entregue.

São tão fugazes estes nossos momentos de insensatez

A sempre se deixarem desvanecer como vieram, despreocupadamente

E no pós-morte embalsamarem-se em cada poro, cada veia, cada fio

Que assim decididos a serem perenes em sua finitude, deixam-se morrer

E a canção que traga o silêncio é então por ele tragada

Mas permanece lá.

Sua melodiosa essência eviterna ocupa todas as salas silenciosas.

E ainda que desprendida do mundo das palavras, náufraga de mim...

E ainda que ausente em tudo aquilo que te faz tu.

Ainda assim faz-se...

vítima desse fortuito momento.