Comentário de 2 Tessalonicenses 1.11
Por João Calvino
“Por isso também rogamos sempre por vós, para que o nosso Deus vos faça dignos da sua vocação, e cumpra todo o desejo da sua bondade, e a obra da fé com poder;” (2 Tessalonicenses 1.11)
“Por isso também rogamos sempre por vós”. A fim de que saibam que precisam da ajuda contínua de Deus, Paulo declara que ora em seu favor. Quando diz: “por isso”, ele quer dizer: para que alcançassem esse alvo final da sua jornada, como se mostra a partir do contexto imediato: e cumpra todo o desejo da sua boa vontade, etc. Contudo, parece que o que ele mencionou antes era desnecessário, pois Deus já lhes havia feito dignos do seu chamado. Porém, ele fala quanto ao fim ou consumação, a qual depende da perseverança. Pois, como estamos sujeitos a recuar, nosso chamado mais cedo ou mais tarde infalivelmente se mostraria, até onde nos diz respeito, ser vão, se Deus não o confirmasse. Por isso, é dito que ele nos faz dignos, quando nos conduz até o alvo em que miramos.
“E cumpra”. Paulo chega a uma maravilhosa eminência ao exaltar a graça de Deus, pois, não se contentando com o termo beneplácito, afirma que o mesmo flui da sua bondade – a não ser que, talvez, alguém prefira considerar a beneficência como se originando deste beneplácito, o que equivale à mesma coisa. Quando, porém, somos instruídos de que o propósito gracioso de Deus é a causa da nossa salvação, e que isto tem o seu fundamento na bondade do mesmo Deus, não somos piores do que loucos, se nos aventuramos a atribuir alguma coisa, por menor que seja, aos nossos méritos? Pois as palavras são não pouco enfáticas. Ele poderia ter dito em uma só palavra: para que a vossa fé se cumpra, mas designa isto em termos de beneplácito. Além disso, expressa a ideia ainda mais distintamente, dizendo que Deus era movido por nada mais do que a sua própria bondade, pois não encontra nada em nós além de miséria.
Nem Paulo também atribui à graça de Deus apenas o princípio da nossa salvação, mas todos os aspectos dela. Assim, é posta de lado aquela perspicácia dos sofistas, de que somos, na verdade, antecipados pela graça de Deus, e que ela é ajudada por méritos subsequentes. Paulo, por outro lado, reconhece em todo o progresso da nossa salvação nada além da pura graça de Deus. Como, porém, o beneplácito de Deus já foi cumprido nele, referindo o termo, empregado na sequência, ao efeito que se revela em nós, ele explica o seu significado, quando diz: e a obra da fé. E a chama de obra, em referência a Deus, que opera ou produz a fé em nós – como se tivesse dito: “para que ele complete o edifício da fé que começou”.
Também não é sem um bom motivo que diz “com poder”, pois sugere que o aperfeiçoamento da fé é uma coisa árdua, e uma das maiores dificuldades. Isto também sabemos muito bem pela experiência; e a razão, também, não está longe, se considerarmos quão grande é a nossa fraqueza, quão variados são os obstáculos que nos obstruem de todos os lados, e quão violentos são os assaltos de Satanás. Por isso, a menos que o poder de Deus nos propicie ajuda em grau não ordinário, a fé nunca se elevará até a sua plena estatura. Pois levar a fé até a perfeição em um indivíduo não é tarefa mais fácil do que edificar sobre as águas uma torre que possa pela sua firmeza resistir a todas as tempestades e à fúria dos temporais, e elevar-se acima da altura das nuvens; pois não somos menos fluidos do que a água, e é necessário que a estatura da fé alcance o céu.