Comentário de Filipenses 1.5,6

Por João Calvino

“Flp 1:5 pela vossa cooperação no evangelho, desde o primeiro dia até agora.

Flp 1:6 Estou plenamente certo de que aquele que começou boa obra em vós há de completá-la até ao Dia de Cristo Jesus.

5. “Pela vossa participação”. Agora, passando para outra cláusula, ele declara o fundamento de sua alegria – que eles tinham participação no evangelho, isto é, tinham se tornado participantes do evangelho, que, como é bem conhecido, é realizada por meio da fé; pois o evangelho aparece como nada a nós, com respeito a qualquer fruição dele, até que o recebamos pela fé. Ao mesmo tempo o termo participação pode ser visto como se referindo à sociedade comum dos santos, como se tivesse dito que eles tinham se associado com todos os filhos de Deus na fé do evangelho. Quando diz desde o primeiro dia, ele elogia a prontidão deles em se mostrarem ensináveis imediatamente após a doutrina ser apresentada diante deles. A frase até agora denota a perseverança deles. Hoje sabemos quão rara excelência é seguir a Deus imediatamente após o seu chamado, e também perseverar firmemente até o fim. Pois muito são tardios e negligentes em obedecer, enquanto ainda outros são mais, caindo por causa de instabilidade e inconstância.

6. “Persuadido disso mesmo”. Um fundamento adicional da alegria é fornecido em sua confiança neles para o tempo por vir. Mas alguns dirão, por que deveriam os homens ousarem para se assegurarem para o amanhã no meio de tão grande enfermidade de natureza, tantos impedimentos, asperezas e precipícios? Paulo, certamente, não derivava essa confiança da firmeza ou excelência de homens, mas simplesmente do fato que Deus tinha manifestado seu amor aos filipenses. E indubitavelmente essa é a verdadeira maneira de reconhecer os benefícios de Deus – quando derivamos deles ocasião de aguardar o bem para o futuro. Pois como são sinais de sua bondade, e sua benevolência paternal para conosco, que ingratidão seria derivar disso nenhuma confirmação de esperança e boa coragem! Em adição a isso, Deus não é como os homens, ficando enfadado ou exaurido ao conferir benignidade. Portanto, exercitem-se crentes em constante meditação sobre os favores que Deus confere, para que possam encorajar e confirmar a esperança quanto ao tempo vindouro, e sempre ponderem em sua mente esse silogismo: Deus não abandona a obra que suas próprias mãos começaram, como o profeta testemunha (Salmo 138:8; Isaías 64:8); somos obra de suas mãos; portanto, ele completará o que começou em nós. Quando digo que somos obra de suas mãos, não me refiro à mera criação, mas ao chamado pelo qual fomos adotados no número de seus filhos. Pois é um sinal para nós de nossa eleição, que o Senhor nos chamou eficazmente para si por seu Espírito.

Pergunta-se, contudo, se alguém pode estar certo quanto à salvação de outros, pois Paulo aqui não está falando de si mesmo, mas dos filipenses. Respondo que a segurança que um indivíduo tem com respeito à sua própria salvação, é muito diferente daquela que tem quanto a de outro. Pois o Espírito de Deus é uma testemunha para mim do meu chamado, como o é para cada um dos eleitos. Quanto aos outros, não temos nenhum testemunho, exceto da eficácia visível do Espírito; isto é, na graça de Deus que se mostra neles, de forma que chegamos a conhecer isso. Há, portanto, uma grande diferença, pois a certeza da fé permanece internamente calada, e não se estende aos outros. Mas onde quer que vejamos alguns desses sinais da divina eleição como podem ser percebidos por nós, devemos imediatamente ser incitados a abrigar boa esperança, para que não tenhamos inveja do nosso próximo, nem retiremos dele um julgamento de caridade justo e benévolo; e também, para que possamos ser gratos a Deus. Essa, porém, é uma regra geral quanto a nós mesmos e aos outros – que, desconfiado da nossa força própria, dependamos inteiramente de Deus somente.

“Até ao dia de Jesus Cristo”. A principal coisa, de fato, a ser entendida aqui é – até o término do conflito. Agora o conflito é terminado pela morte. Como, contudo, o Espírito costuma falar dessa maneira em referência à última vinda de Cristo, seria melhor estender o progresso da graça de Deus até a ressurreição da carne. Pois embora aqueles que foram livres do corpo mortal não mais contendam com as cobiças da carne, e estejam, por assim dizer, além do alcance de um simples dardo, ainda assim não haveria nenhum absurdo em falar deles ao mencionar o progresso, visto que ainda não alcançaram o ponto pelo qual aspiram; não desfrutam ainda a felicidade e glória pela qual têm esperado; e por fim, o dia ainda não raiou para mostrar os tesouros que estão ocultos em esperança. E na verdade, quando falamos de esperança, nossos olhos devem ser dirigidos para uma ressurreição bendita, como o grande objeto em vista.

João Calvino
Enviado por Silvio Dutra Alves em 07/09/2014
Código do texto: T4952450
Classificação de conteúdo: seguro