Os loucos e o tempo

“O longânimo é grande em entendimento, mas o que é de espírito impaciente mostra a sua loucura.” Prov 14; 29

Normalmente consideramos louco um que faz ou diz coisas sem nexo, privadas de coerência com a realidade. De um assim dizemos: está “fora da casinha”. No provérbio acima temos longanimidade associada a entendimento e loucura à precipitação, impaciência. Tal louco lida mal com o tempo invés das circunstâncias.

Quantos milhões são gastos em cosméticos, cirurgias e demais arranjos para disfarçar as marcas dos anos! Se há uma coisa que assombra ao ser humano, essa, é a consequência do tempo. A fonte da eterna juventude é uma das nossas utopias.

Contudo, ninguém deseja o tempo por ele mesmo, antes, para, no favor dele, ( que sozinho seria monótono ) desfrutar dos prazeres da vida.

Se alguém buscou situar coisas no tempo, esse foi Salomão, autor da sentença supra. “Tudo tem o seu tempo determinado, e há tempo para todo o propósito debaixo do céu. Há tempo de nascer, e tempo de morrer; tempo de plantar, e tempo de arrancar o que se plantou; tempo de matar, e tempo de curar; tempo de derrubar, e tempo de edificar; tempo de chorar, e tempo de rir; tempo de prantear, e tempo de dançar; tempo de espalhar pedras, e tempo de ajuntar pedras; tempo de abraçar, e tempo de afastar-se de abraçar; tempo de buscar, e tempo de perder; tempo de guardar, e tempo de lançar fora; tempo de rasgar, e tempo de coser; tempo de estar calado, e tempo de falar; tempo de amar, e tempo de odiar; tempo de guerra, e tempo de paz.” Ecl 3; 1 a 8

Depois de situar tantas ações antitéticas na redoma do tempo apresenta o Criador acima deste, razão pela qual O devemos temer. “Eu sei que tudo quanto Deus faz durará eternamente; nada se lhe deve acrescentar, e nada se lhe deve tirar; e isto faz Deus para que haja temor diante dele.” V 14

Ciente das limitações nas quais nos confinou Deus preparou antídotos ao tempo, para que, de alguma forma lidemos com o passado e o futuro. Àquele propicia arrependimento e perdão para que tratemos suas mazelas; a esse, fé e esperança possibilitando que toquemos ainda que sutilmente seus domínios.

Tiago usou uma alegoria bem didática sobre isso. “…Eis que o lavrador espera o precioso fruto da terra, aguardando-o com paciência, até que receba a chuva temporã e serôdia.” Tg 5; 7 O simples lançar da semente à terra permite que, de certa forma toque no futuro; a colheita vindoura demanda uma ação presente.

Todavia, mesmo fé e esperança podem ser contagiadas pela loucura. Há milhares de religiões na Terra ensinando fé em alguma coisa; mas, a fé sadia tem objetos bem definidos: “…credes em Deus, crede também em mim.” Jo 14; 1 A esperança também não deve projetar-se sobre um vácuo, ou, esperar algo segundo idiossincrasias enfermas, antes, deve ser segundo a Palavra de Deus. “Para que por duas coisas imutáveis, nas quais é impossível que Deus minta, tenhamos a firme consolação, nós, os que pomos o nosso refúgio em reter a esperança proposta;” Hb 6; 18

Precisamente porque não sofre ação do Tempo, o Eterno pode prometer e cumprir o que quiser sem mudança ou variação. A Bíblia O apresenta como sendo capaz de projetar o futuro contra o passado na criação de tipos e anti-tipos proféticos. “Porque tendo a lei a sombra dos bens futuros, e não a imagem exata das coisas, nunca, pelos mesmos sacrifícios que continuamente se oferecem cada ano, pode aperfeiçoar os que a eles se chegam.” Heb 10; 1

Para os judeus que se gloriavam na Lei de Moisés, o autor apresenta como mera sombra do futuro; sua purificação imperfeita como tipo da perfeita que viria. Deus não faz rascunhos por Sua causa, mas, em atenção às nossas limitações. Temos passado só na lembrança, e futuro na possibilidade; na real, tudo o que temos é o presente. Por isso a Palavra insta para que sejamos sábios nele; “Enquanto se diz: Hoje, se ouvirdes a sua voz, Não endureçais os vossos corações,…” Heb 3; 15

Um louco em face ao tempo, pois, tanto pode ser um precipitado que anseia as coisas antes da hora, quanto outro que deixa evadir-se a ocasião de tomar decisões de reflexo eterno, como, abraçar a salvação quando ela o busca. Para as coisas por vir, longanimidade, entendimento; para as demandas presentes, diligência, desprendimento.

Essa loucura que deixa o fugaz pelo eterno triunfa ao tempo e acerta o Caminho. “…o imundo não passará por ele, mas será para aqueles; os caminhantes, até mesmo os loucos, não errarão.” Is 35; 8