Confissão para alguém especial: Um ano
Sabe que dia foi ontem? É, eu sei que só se passaram três horas e que tem muita gente que só computa a passagem do dia depois que dorme, mas ainda assim, foi ontem. Ontem, foi dia 18 de Julho. Você ainda lembra o que aconteceu? Se sim, fico feliz. Se não, não se preocupe, esta data ainda tem um significado, pelo menos para mim.
Pois 18 de Julho foi o dia em que nós nos conhecemos. De forma marota, eu ainda achando-a uma chorona mal preparada pro mundo ou algo que valha. Você, não sei, talvez me achando largado demais. Um ano atrás, começava este capítulo que, hoje em dia, não passa de uma cicatriz reluzente na história da minha vida.
Poxa, um ano. Eu passei o dia pensando nisso e, ainda assim, a ideia me soa estranha. Pois parece que foi ontem que tudo aconteceu. Que a gente se conheceu, que você procurava algo pra se distrair na noite monótona de sábado, em que eu me arrumava, ansioso, pra uma das poucas festas que eu iria por querer. Neste ponto todo mundo imagina que nós nos encontramos na dita festa, certo?
Errado. Nós nos encontramos antes.
Você procurava algo pra fazer, não querendo ir dormir tão cedo e, sabe-se lá o porquê, acabou esbarrando em mim. Nós conversamos, eu dando-lhe metade da minha atenção, enquanto a outra parte mirabolava sobre a festa na qual eu estaria dali um tempo. Eu ainda me lembro do quanto eu te achei carente. "Coitada", pensei, "sofre de saudades do ex-namorado, não quer ficar sozinha, mas também não quer se encostar em qualquer um. Quanta complicação para uma pessoa só." E no fim das contas, aquilo nem significou nada para mim. Mas ou ajudei-a a passar a noite. Aquilo marcou, pelo menos pra você.
Meses depois, numa noite fria de inverno, enquanto eu caminhava lacônico pelas ruas enlameadas da cidade onde estava, pensando em como as coisas estavam solitarias pra mim, quem é que aparece pra me acudir?
Foi tão assombroso, você aparecer daquele jeito. Não por ter sido coincidência ou por parecer coisa de filme, mas pela situação em que eu estava. Eu, àquela época, era alguém que não sentia mais nada. Tempo demais isolado do mundo, sem me importar com ninguém, causa isso nas pessoas. Uma incapacidade de ligar. Forma uma barreira gélida ao redor do coração, uma barreira, teoricamente, intransponível.
E é isso que torna assustadora a sua entrada triunfal no meu coração. Foi de repente, você sequer pediu licença. Num dia você era uma vaga lembrança, no outro, era parte essencial do meu viver. Nós tinhamos tanto em comum. As piadas, o trabalho puxado, as psicoses. Aliás, esta parte é uma que vai martelar na minha mente pelo resto da minha vida: Duvido eu encontrar outra pessoa com as paranóias tão semelhantes as minhas como você. O jeito de sentir ciúme dos detalhes mais irrelevantes, a saudade exacerbada, as loucuras mal planejadas. Você ainda lembra daquela vez em que você estava triste, se sentindo desamparada e, só para fazer um charme, disse que queria se encontrar comigo? Eu estava há uns 200 quilômetros de você, sem mencionar que era tarde, que nós dois tinhamos de trabalhar no outro dia. Mas e aí, você lembra o que eu respondi? "Quando e onde?"
Loucura, não é?
Sabe, eu nunca lhe falei, mas acho que seria engraçado se você soubesse. Naquela vez, a primeira coisa que me passou pela cabeça, antes de o preço da viagem ou o dia de serviço que eu perderia, era a possibilidade de te ver. Ainda me lembro: meu coração acelerado, os dedos trêmulos, a mente voando alto, longe, imaginando te encontrar.
E nós nos encontramos...
O meu primeiro encontro foi com você, sabia? Eu devo ter comentado, mas ainda assim, acho que vale relembrar. Você foi a primeira garota com quem eu sai.
Também lembro daquele dia nos mínimos detalhes: a ansiedade oprimindo o meu peito, enquanto eu via o ônibus chegando a rodoviária. O calafrio que percorreu a minha espinha quando eu te vi lá, parada, com aquele sorriso empaspalhado, sem saber se vinha ou se ficava. Não sei se posso rir de você, já que eu me senti do mesmo jeito. Eu levei um caderno e, na última página, escrevi o seu nome bem grande. E então, passei a usá-lo como uma placa de identifcação, como a gente vê o pessoal fazer nos filmes, quando vão buscar alguém no aeroporto. Você duvidou que eu faria aquilo, não é? Mais uma das loucuras que só nós dois faríamos. Isto sem mencionar a overdose de sorvete ou o passeio pelo camelódromo fechado.
Quantas coisinhas, não é? Quantos detalhes que não me saem da cabeça. E até hoje ainda flutuam no meu sub-consciente, só esperando por um momento de desatenção minha para reaparecerem, trazendo consigo os sentimentos. Ah, os sentimentos... Não consigo me livrar deles, sabia? Você mexeu demais comigo. Eu nunca te disse, mas você era a personficação da mulher que eu consideraria perfeita. Em cada mínimo detalhe. Chego a dizer por aí, às vezes, que foi por você que eu esperei a vida toda.
E é por isso que já não tem mais graça esperar. É por isso que já não tenho motivos pra acreditar em qualquer coisa do gênero. Depois de você, nada mais vai parecer bom o bastante...
Poxa, já faz um ano e, mesmo assim, eu ainda gosto de você. Vai entender, não é?
Eu já não sinto saudades, acho que já me acostumei. A sua ausência, a dor que ela causa, já não me é mais novidade. Ainda dói, em momentos como este de agora, em que eu mexo na ferida. Mas já não sangra. Eu sei que é só uma ferida cicatrizada, uma marca que mudou a minha fisionomia, mas não pode fazer mais do que isso. Acho que é só isso que sobrou na minha vida pra você, Cinderela: ser uma lembrança. Seu sapatinho de cristal, seu sorriso apaixonante ou a sua voz engraçada, já são só páginas batidas do conto de fadas que foi a nossa história, só mais detalhes de uma memória de um tempo bom demais do meu passado.
Já faz um ano...