Somente a Lei na arca - 1Re3

Três figuras foram introduzidas na arca construída por Israel durante sua jornada no deserto, e nesta sequência – as duas tábuas da lei, o vaso com o maná e a vara florescida de Arão.

Elas simbolizavam respectivamente – a vontade governamental de Deus (justiça e juízo), a provisão diária (o maná fala muito mais que a comida física, mas a espiritual que vem do céu) e o sacerdócio (ligação entre o pecador e o Santo). Vejamos algumas conexões.

“Já é tempo de operares [tempo de julgamento], ó Senhor, pois eles têm quebrantado a tua lei” (Sl 119.126).

“Nem só de pão viverá o homem, mas de toda a palavra que sai da boca de Deus” (Mt 4.4).

“Também ungirás a Arão e seus filhos, e os santificarás para me administrarem o sacerdócio” (Ex 30.30).

Mas quando a arca foi introduzida no templo recém inaugurado de Salomão, somente as tábuas de pedra restavam. Podemos entender desta maneira.

A lei inflexível de Deus pode até ser rejeitada pelo homem, mas é por ela que conhecemos o caráter santo de Deus e, como contrapeso, nossa distância desta pureza. Paulo acentua de forma clara e inequívoca.

“E o mandamento que era para vida, achei eu que me era para morte. Porque o pecado, tomando ocasião pelo mandamento, me enganou, e por ele me matou. E assim a lei é santa, e o mandamento santo, justo e bom. Logo tornou-se-me o bom em morte? De modo nenhum; mas o pecado, para que se mostrasse pecado, operou em mim a morte pelo bem; a fim de que pelo mandamento o pecado se fizesse excessivamente maligno. Porque bem sabemos que a lei é espiritual; mas eu sou carnal, vendido sob o pecado” (Rm 7.10-14).

Resumindo o pensamento acima – apesar da Lei ser boa em si mesma, acaba gerando a morte, já que o homem em todo tempo e em qualquer situação está sem condições de cumpri-la pela morte da carne pelo pecado. É bom lembrar que Deus não pode mudar seu caráter santo e justo.

Para resolver o impasse, Deus envia seu Filho – o verdadeiro “pão que desce do céu” (Jo 6.50) – como oferta pelos nossos pecados e pagamento aos olhos de Deus em nosso lugar.

Com isto, inaugura-se o sacerdócio de Cristo, abrindo, de forma mediatória, o caminho da terra para o céu, do físico para o espiritual, da morte para a vida, do pecado para a santidade, da inimizade para a comunhão plena.

Podemos falar de outra forma – a lei inflexível de Deus, portanto condenatória por causa do pecado que em nós habita, é cumprida pela oferta do corpo (maná que desce do céu) de Cristo em nosso lugar, abrindo assim a porta do sacerdócio de Cristo nos céus a nosso favor.

No caso de Israel, já que a arca estava sob sua tutela, tanto a oferta (Jesus morto) quanto o sacerdócio (Jesus ressuscitado) foram recusados antes e no momento da visita do seu Messias. O símbolo da oferta de Cristo – maná – foi recusado naquelas palavras odiosas e atrevidas.

“E o povo falou contra Deus e contra Moisés: Por que nos fizestes subir do Egito para que morrêssemos neste deserto? Pois aqui nem pão nem água há; e a nossa alma tem fastio deste pão tão vil” (Nm 21.5).

Quanto ao sacerdócio representado pela vara de Arão, se o leitor e leitora acessaram a terceira nota sobre o primeiro livro de Samuel, quando falamos de Eli e sua casa, não ficariam espantados por não encontrar a vara de Arão dentro da arca do concerto. Desnecessário descrever o desprezo ao sacerdócio de Cristo pelos sacerdotes e escribas do seu tempo.

Infelizmente, devido nossa tendência autossuficiente, arrogante e hipócrita, valorizamos a Lei que não pode salvar e menosprezamos a graça bondosa de Deus em Jesus.

Não repitamos o grave erro de Israel ao falar na sua falta de autoconhecimento antes de receber a lei – “E [Moisés] tomou o livro da aliança e o leu aos ouvidos do povo, e eles disseram: Tudo o que o Senhor tem falado faremos, e obedeceremos” (Ex 24.7).

Lembra aquela exortação cuidadosa de Tiago.

“Eia agora vós, que dizeis: Hoje, ou amanhã, iremos a tal cidade, e lá passaremos um ano, e contrataremos, e ganharemos; digo-vos que não sabeis o que acontecerá amanhã. Porque, que é a vossa vida? É um vapor que aparece por um pouco, e depois se desvanece. Em lugar do que devíeis dizer: Se o Senhor quiser, e se vivermos, faremos isto ou aquilo. Mas agora vos gloriais em vossas presunções; toda a glória tal como esta é maligna” (Tg 4.13-16).

Eles no passado e muitos no presente têm vivido sem liberdade, “porque é mandamento sobre mandamento, mandamento sobre mandamento, regra sobre regra, regra sobre regra, um pouco aqui, um pouco ali” (Is 28.10).

É mais que certo que se pudéssemos abrir as ‘arcas’ de nossas igrejas, só encontrássemos duas tábuas repletas de lei.

Confesso que não era desta forma que queria terminar esta nota; minha intenção era falar da recusa do maná escondido e do sacerdócio perfeito de Cristo nesta era descompromissada, ou antes compromissada consigo mesmo, de Laodicéia, “para quem já são chegados os fins dos séculos” (1 Co 10.11).

A seguir lançaremos uma breve vista sobre a ruptura de Israel em dois grupos rivais.