No compasso do amor
No compasso do amorSou feliz porque não mais és o sonho;
sim, és a existência parida do sangue como eu.
Não és mais a canção recordada chorada, saudosa.
És a morada onde debruço meus cabelos molhados,
pois ontem outrora meu perfume te era a aurora ausente,
quase inexistente, exceto na imaginação descontente,
hoje sou a rosa murmurante que se despetala em beijos
e se incha de volúpia ao ouvir teu amor sussurrante.
Também em mim fosses o céu e os dons d’aurora,
esvaecidos pela nostalgia do não saber a data da felicidade,
divagava na poesia, invadia o calor de outros beijos ardentes,
d’outros casais de verdade, e os filmes então!
Quantos anseios, quantas, emoções, quanta esperança cansada
em rumos bifurcados em interrogações,
consumia meu pobre coração, que na solitude esperava seu oásis.
Ainda te vejo nas colinas, no dançar do arco-íris,
nas vagas famintas devorando as areias virgens,
sim, sonho ainda, e como! Diferente no entanto, agora!
Enterrei o sonho perturbado de enceguecida visão,
mais intuitiva que possível,
hoje sonho a presença que abrasa, as carnes que tremulam,
a infância que voltou, a fome que não sacia, o querer que perpetua...
O amanhã que já futureceu minhas alegrias, em projetos felizes me embrenhou, até os nossos passos abraçados, sinto que namoriscam...
O arco-íris coloriu meu sonho, as vagas bravias deram os sons,
as mãos alísias ungiram nossos cabelos num laço,
a terra emprestou cheiro ocre selvagem; as cascatas, os arrepios...
Enfim, minhas sementes frutesceram, minha vida é frutescência!
Nem sei mais quem és: se meu dono prometido do acaso,
se procurador deste mundo de Deus, em face das mil caras que assumes, nos vários lugares que passeiam meus olhos.
Sei e como sei, é que amo, e como te amo! Desde as horas que não estás comigo, quando te busco na saudade, no sonho e na espera,
até este divino momento, em que minha face alada ao teu peito nu,
escuta teu respirar no compasso do amor.
Deus meu Deus, como amo este amor que me saiu dum sonho!
Santos-SP-26/03/2006.