O zero em redação e os jegues do Nordeste.

Quando li que mais de 500 mil estudantes conseguiram a façanha de tirar nota ZERO em redação no último exame do ENEM, a minha primeira reação foi de vergonha. Vergonha, aliás, que deveria ser compartilhada com eles e, com os governantes desse país que vivem propalando que a educação é prioridade.

Depois, passado o primeiro susto, cheguei à conclusão de que: ou eles são muitos alienados, ou a forma como o tema foi apresentado, teve justamente o propósito de ridicularizar não apenas os alunos, mas também, os professores que vivem incomodando o governo com demandas salariais.

Por fim cheguei a uma conclusão nada otimista. Qual será o futuro dessa geração? Professores mal treinados, alunos sem aprendizados. Educação ZERO. E quando se fala em educação ZERO, devemos nos reportar ao povo em geral. Aqueles que jogam lixo nas ruas, que poluem os rios e acabam com os afluentes e tantos outros. Que culpam a natureza pela queda das árvores e pelas catástrofes que vimos diariamente. Com certeza, isso não é culpa da natureza. Bueiro limpo não provoca enchente, rio limpo não provoca doenças, não mata peixes; matas preservadas não secam afluentes, montanhas arborizadas não provocam erosões e, solo cuidado, não provoca o enfraquecimento das raízes, cujas árvores, sucumbem aos milhares com a força dos ventos. Alimentos puros e saudáveis – sem o uso de tantos inseticidas, pesticidas e outros venenos não provocam epidemias; leite “in natura” ou pasteurizado não mata crianças.

Ao me referir a esta notícia, lembrei-me, de uma reportagem “recorrente” sobre os jegues do Nordeste. Estes, após servirem de “bagageiros” durante tanto tempo para o povo nordestino, agora estão sendo substituídos por motos e outros veículos – a exemplo dos cavalos na condução da boiada. São pobres animais que já não são mais úteis para seus donos e, simplesmente, são abandonados na beira da estrada, provocando compaixão dos transeuntes e, às vezes, até acidentes fatais nas rodovias.

Foi ai que eu tracei esse paralelo do “burro de carga” com esses estudantes que tiraram nota ZERO. Quando eles não interessarem mais para ninguém, porque não conseguiram se estabelecer, porque foram alienados pela tecnologia desenfreada que não faz pensar, apenas executar, repetir, copiar e desistir, ai então eles irão ficar deprimidos e recorrer, para o único caminho que nossos jovens têm recorrido nos últimos anos: a droga.

Essa verdade não é uma apologia ao uso desse veneno maldito que mata nossos jovens e dilacera nossas famílias. Essa verdade é uma constatação que está aí. Está ali fora, agora mesmo, enquanto escrevo estas linhas, aumentando descontroladamente a cada segundo, atingindo a todas as camadas sociais e faixas etárias. E é por isso que eu fiz essa associação com os jegues do Nordeste, porque enquanto esses jovens continuarem se alienando com coisas que não são úteis para a sua vida prática, continuarão sendo levados a cabresto, continuarão sendo dizimados pela violência e, assim como os jegues do Nordeste, serão abandonados à própria sorte pelas cidades do Brasil inteiro. Esquecidos, esfarrapados e renegados.

Infelizmente, grande parte de pais e mães de nosso querido Brasil, sofrerão com esta analogia, pois viveram na mesma época - em que eu vivi, dias diferentes, onde nosso maior orgulho era o de ser brasileiro: de fazer parte de um país cheio de esperanças e respeito pelas pessoas e instituições públicas. Aonde vamos chegar?

Cuidado para não atropelar o jegue na estrada, cuidado para ser mais um Zero na vida.