O salto

De um aviãozinho estilo Indianas Jones, que dá medo só de olhar, saltei recentemente. Vinte mil pés. Seis mil e noventa e seis metros de altitude.

Boituva, estado de Sao Paulo.

Instruída a entrar primeiro e a me sentar atrás do piloto, seria a última a abandonar a aeronave.

Até atravessar as nuvens, sentindo o vento no meu corpo e na minha alma - pois a janela tinha um vão - eu só fazia sorrir. Sorria um sorriso de quem vê um unicórnio ou uma sereia.

Havia chovido. O céu estava muito limpo, de um azul brilhante mesclado ao amarelo alaranjado de um dia perfeito.

A viagem durou uns 20 minutos até que a porta foi aberta manualmente, rasgando minha pele, coração exposto.

Salta a primeira dupla - todos com instrutores - salta a segunda... a terceira... a nona... minha vez.

Calcanhar dentro, pontas dos pés fora, o avião em movimento, que por alguma razão, eu achei que fosse parar pra gente saltar, esperei a voz de comando: "agora!".

Olhando para baixo, nada se via além das nuvens.

Queda livre por um tempo que não sei calcular. Também não saberia dizer quantidade e qualidade dos hormônios despejados na corrente sanguínea, e todas as sensações provenientes deles, o que posso afirmar, sem poesia, é que algo no cérebro acontece. A partir daí tudo é pequeno! O mundo é pequeno, os problemas são pequenos, a gente é pequena, a cidade é pequena, o trânsito, o lixo, as opiniões, os relacionamentos, as habilidades, os conceitos, o certo, o errado, a vida, a morte!

Atravessamos a nuvem. Quem já esteve sob neblina, sabe como é. Daí o planeta apareceu, exuberante, extraordinário, perfeito! A curvatura no horizonte, a forma, a cor, o brilho, o esplendor! Que planeta lindo é o nosso!!!

Bruscamente, pisaram no freio, o paraquedas abriu. Um tranco, e é hora de contemplar a paisagem calmamente. Muitas fazendas, muito verde, estradas, riacho. O paraquedista apontou para uma casinha e disse que era a dele. Gentilmente, deixou-me segurar as 'rédeas' só para que eu sentisse o que era estar no controle. Não senti. Não estava, nunca estive no controle de nada.

Quando, sãos e salvos, aterrizamos no gramado, a última bolacha do pacote, a peixeira do Lampião e o sorriso da Monalisa haviam sumido. Fui curada da megalomania.

Achei que nunca mais quereria repetir a experiência, e isso também mostrou se tratar de um equívoco. Olho para o céu e estremeço de vontade subir às nuvens novamente e, de certa forma, subo. Após esse ato, que chamo 'ato de fé', sinto que nada mais é difícil e complicado, então comecei escrever minha história, que até que é bem interessante, voltei a dançar e voltei a estudar música, que era um sonho abandonado. Canto lírico e flauta transversal. Um pouco de piano e violão eu já conhecia. Voltei a cantar em coro sinfônico e estamos preparando Carmina Burana, de Carl Orff.

Somos pequenos, mas juntos podemos fazer coisas bem bonitas!

Saltemos então!!!

Lorena Lira
Enviado por Lorena Lira em 23/03/2025
Reeditado em 02/04/2025
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