O comendor de farinha
Nordestino em São Paulo, pena... Como bem disse o poeta paraibano Jessie Quirino, "O Nordestino em São Paulo carrega os espinhos de todas as esporas." Eu passei dois anos no estado de São Paulo, entre 1982 e 1984. Confesso que não me acostumei com o ritmo, costumes e tradições. Acostumado a comer tripa de porco assada com farofa e batata doce, logo nos primeiros dias, na cidade grande, fui convidado para almoçar na casa de uma família "japonesa", no bairro de Casa Verde. Matuto, entrei na residência todo desconfiado, me escondendo num canto de parede. A família, que não me lembro do sobrenome oriental, me recebeu com muita reverência e hospitalidade. O meu acompanhante, um jovem chamado De Lima, da cidade de Maceió (AL), um conhecido da família, era mais folgado de que colarinho de palhaço. Todo gaiato e eu só na minha... A boca aberta feito um "abestaiado", olhando as belíssimas gravuras orientais, espadas de samurai e algumas esculturas japonesas que a casa exibia. Daqui à pouco chegou o chefe da família. O homem entrou e foi direto até um pequeno altar, fez uma reverência abrindo uma portinhola, pegou um ferrinho e bateu num pequeno sino dentro de uma espécie de casinha de brinquedo. Depois do ritual ele se voltou em minha direção e me cumprimentou com um rouco "oraio"! Bom dia em japonês. Eu só fiz baixar a cabeça sem saber o que dizer. Alguém falou umas palavras em japonês, sobre mim, e ele, com um olhar de curiosidade, emitiu um som rouco e me reverenciou, outra vez, inclinando-se em minha direção. Não demorou e fui convidado à mesa. Jesus! Só tinha plantas em cima da mesa daquela família. Havia um tal de alcachofra, e foi antipatia a primeira vista. De Lima notou meu desconforto e disse para a senhora da casa:
- Irmã, meu amigo acabou de chegar do Nordeste. Ele não sabe comer nada disso.
Visivelmente aflita, por querer agradar, aquela senhora disse que tinha feijão na geladeira e que poderia fritar ovos.
Eu quase gritei:
- Quero!
Chico Potengy 🌵
Texto de 23 de novembro de 2018.