Vinco (A flauta doce)
Não vejo a hora não vejo o dia
De arrasar com esta vida tão vazia
Que me deforma que me vicia
Que me desfia e recompõe qual não devia
E no entanto me custa tanto
Estou dobrado estou vincado é já quebranto
E do meu canto só me levanto
Pra copiar o que me rói e agasta tanto
E parece a dor de ter o sal em carne viva
Que o sol ardente não perdoa reativa
Eu não poder levar a nau por onde quero
Pra meu desgoverno me tornei judeu errante
Que não consegue sair de onde estava antes
Eu esperneio eu sapateio eu desespero
E em cada esquina gente imagina
Que há de topar com o sol do forte o veio a mina
A tal mulher a joia a rima
A flauta doce com que a gente se afina
Não vejo a hora não vejo o dia
Que há de romper essa manhã essa anistia
Mudar de pele mudar de via
Viver no avesso outro começo é o que eu queria
E parece a dor de ter o sal em carne viva ...
(Pitangui, MG, 1970)