Capítulo 36 – Réu confesso

 
Lana terminava um bolo na cozinha quando ouviu a porta de seu apartamento sendo aberta. Em seguida, um furioso Ander entrou na cozinha. Fazia alguns dias que não o via e tinha se obrigado a acostumar com aquela ausência. Começou a cozinhar todo o tipo de coisa, fez Yoga, leu livros, assistiu séries, mas nada preenchia a saudade que sentia dele.

- AQUELA VACA ARMOU PARA MIM! – Ela passou as mãos no avental azul de passarinhos, presente de Alexia e olhou para sua irritada e inesperada visita. – DISSE PARA O NOSSO CHEFE QUE DESVIEI DINHEIRO DA EMPRESA! EU QUASE FUI PRESO, VOCÊ ACREDITA? – Na hora que ia responder, Ander continuou, num tom de voz zangado. – É claro que você acredita, não é? Você sempre soube que ela não prestava.

Ele sentou à mesa, trêmulo de tanta raiva e escondeu as mãos no rosto. Lana encostou na pia, sem saber a ação certa a tomar. Por fim, se aproximou e tocou as costas dele. As mãos foram subindo lentamente, até o cabelo macio. Ela sabia que em algum momento Gabriela o passaria para trás, mas também acreditava que era certo os dois ficarem juntos. Desde que Ander perdeu a memória Lana se obrigou a acreditar em coisas que normalmente jamais aceitaria. Era uma forma de suportar a dor.

- Eu sinto muito. – Disse, suavemente. – Sei como esse emprego era importante para você. Foi o seu primeiro. - Ander limpou a primeira lágrima que caiu por sua bochecha e olhou para Lana. – Mas você é um ótimo profissional, Ander. Vai encontrar um lugar ainda melhor para trabalhar. – E ele abraçou a cintura de Lana. No fim, um sempre voltava para o outro. Nem a falta de memória fora capaz de afastá-los. Não tinha jeito. Lembrou das palavras de Bruno “Não dá para esquecer você.” Talvez ele estivesse certo. – Ei, deixa isso pra lá.

- Eu trabalho desde muito novo, Lana. Estudei pra caralho e nunca fiz nada fora da lei. Nada! Nunca roubei uma bala, para nessa etapa da minha vida que nem memória tenho, ser acusado de roubar dinheiro. E tudo isso por causa da dor de cotovelo da Gabriela.

Lana sentou-se na cadeira ao lado.

- Já pensou se você roubou e esqueceu?

- Engraçadinha. – Murmurou, com um meio sorriso. - Já me esqueci de muita coisa importante. – Ela suspirou alto ao entender o significado das palavras dele. – Ao menos vou receber meus direitos. – Ander entrelaçou as mãos dos dois. – Obrigado.

- Pelo o que?

- Por me ouvir. A primeira pessoa que pensei quando tudo aquilo aconteceu foi em você.

- Não precisa agradecer. Sabe que estou aqui para tudo.

- Tudo, é? – Ela revirou os olhos. – Ah, não custa tentar.

- Não vou transar com você, Ander.

- Eu nem pensei nisso, sua maliciosa! – E fez uma expressão de falsa indignação. – Pensei que a podiamos ficar juntinhos vendo filme e comendo esse bolo aí que você fez.

- É, acho que dessa vez aprendi como se faz.

- Você não sabe fazer bolo? Sério? - Lana respondeu um não com a cabeça, tentando evitar as lembranças da época que moraram juntos e ele debochava de sua falta de dom para a arte da cozinha. - Eu quero comer o bolo e ver filme.

Sabia exatamente como esse momento aparentemente inocente acabaria, por isso, tentou mudar de assunto.

- E a Dinorá?

- Está bem, Lana. Te espero na sala!

Antes que ela pudesse impedir, Ander levantou e seguiu rumo ao sofá. Lana soltou o ar que prendia, mas resolveu, a contragosto, não ir contra o inevitável.
 
A primeira hora do filme fora realmente tranquila, o que a surpreendeu. Os dois comeram bolo, conversaram e prestaram atenção na história do filme que passava na televisão de Lana. Ander se pegou observando-a de soslaio, encantado.

- Ei... Sujou aqui. – Ela avisou, o acordando de seus pensamentos. Passou o polegar pelo canto dos lábios deles, que mordeu seu dedo de leve. As bochechas de Lana coraram na mesma hora. – Eu te falei que... – Ele a silenciou com um beijo. – Ander... – Disse, entre os lábios dele, mas Ander a puxou para seus braços. – Você é impossível!
 
Lana não teve mais forças ou argumentos para fugir da paixão que Ander emanava enquanto transavam no sofá. Não queria mais fugir. Os dois foram exatamente os mesmos de sempre. Era como se o momento fosse a extensão daquela noite no Rio de Janeiro, só que ainda melhor.

Pela madrugada, Lana abriu os olhos, lentamente e Ander a apertou em seus braços. Ela sorriu e tocou seu rosto, apaixonada. Deixou um beijo na ponta do nariz dele, que sorriu também.

- Não vai fugir do seu próprio apartamento, não é? – Ele perguntou, com um leve sarcasmo que tentava esconder uma real preocupação.

- Não, não vou. – E abriu os olhos, encarando as íris verdes que emanavam uma tranquilidade. – O que faço contigo, hein?

- Meu plano inicial seria casamento e 2 filhos, mas como estou sem memória, aceito inicialmente que pare de fugir de mim. – E recebeu um beijo na bochecha. – E não estou te pedindo muito. – O silêncio dela chamou sua atenção. – Ou estou?

- Não está. – Lana levantou, seguiu até seu quarto, tirou o lençol branco da cama e voltou para o sofá, com Ander. – Não vou mais fugir de você ou de nós.

- Promete?

- Prometo.

Ele a abraçou como uma criança que acabara de receber o melhor presente de natal de sua vida. Lana correspondeu ao abraço e pensou, com um meio sorriso no rosto em como o amor não mentia e nem omitia.

Os dois então começaram a namorar naquele mesmo dia. Não tinham mais tempo a perder.

Tamiris Vitória
Enviado por Tamiris Vitória em 23/02/2021
Reeditado em 20/01/2024
Código do texto: T7191577
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