Capítulo 14 – Lar é onde o seu coração está
Como já tínhamos vivido uma experiência parecida, a primeira semana com Lana foi fácil. Tomávamos café e jantávamos sempre acompanhados do olhar observador de Dinorá. Nunca vi um animalzinho tão contente e feliz em nos ver juntos.
Passei a dormir na sala e Lana ficou com o meu quarto. Bem, tivemos que resolver assim, não teve outra forma. Dado o nosso histórico, seria um erro dormirmos juntos. E com muita luta, me forcei a esquecer o quanto amava a minha companheira de casa que em breve seria a esposa de outro homem.
Num sábado a tarde ficamos em casa comendo pipoca enquanto assistíamos Dinorá brincar com minha caixa de sapato depois de rejeitar todos os brinquedos que comprei. E demorei horas escolhendo.
- Bom, eu te disse que gatos gostam de brinquedos simples. – Murmurou Lana, ajeitando-se no sofá. – Você não me ouve.
- Ela é chata. – Cruzei os braços, birrento.
- Parece com o pai. – Taquei uma almofada nela, brincando. Na hora de revidar, Lana foi impedida pelo toque do celular. Ela olhou a tela, mas não parecia reconhecer o número. – Alô? Ah, oi Vanda. Sim, estou podendo falar.
Observei Lana tomar caminho até meu quarto. Pensei ser algum assunto de trabalho até ouvir a frase “sim, eu consigo fazer a prova do vestido hoje!”.
Depois parei de prestar atenção na conversa. Dinorá largou sua caixa, se aproximou, miou para mim e deitou nas minhas pernas. Acho que gato sente a mudança no clima, só pode. Lana voltou alguns minutos depois, em silêncio.
- Está tudo bem? – Perguntei, solene.
- Sim... Eu vou fazer uma prova de vestido. Esqueci que a mãe do Bruno que cuidava disso para mim. – Respondeu, mas percebi que evitava me olhar.
- Posso ir com você? - Ela me olhou, pasma. – Ah, acho que vai ser legal. – Sua expressão não suavizou. – Lana, se você não quiser, tudo bem!
- Não... Digo, tudo bem você ir.
- Somos amigos, não? – Ela balançou a cabeça, concordando. – Posso até dar opinião!
- Sim.
Mesmo ainda não totalmente confortável com a minha ideia, Lana não falou mais nada sobre o assunto.
Quando chegamos Lana foi recepcionada por uma simpática senhora oriental e sua vendedora. Elas conversaram por algum tempo, mas a funcionária da empresa começou a me olhar demais e minha agora amiga e futura senhora Bruno se irritou e me puxou para a sala onde provaria os vestidos.
- Mas será possível? – Perguntou. – Toda vez é isso!
- Eu não fiz nada... – Dei de ombros, simplesmente.
- Você só é você e isso já basta! – Esbravejou, seguindo para o provador com a ajuda de outra vendedora.
E começou a prova de vestidos. Me sentei na poltrona, observando a sala cheia de tecidos, agulhas, cabides e todas aquelas parafernalhas femininas. Tudo aquilo me trazia lembranças.
- Ander? – Lana chamou. – Eu quero que você seja sincero, ok?
- Estou aqui para isso!
Ela saiu do provador com as bochechas vermelhas. Deu dois passos e me observou, ansiosa.
- Muito bolo de festa. – Respondi, fazendo um não com a cabeça.
- Insuportável. – A vendedora deu uma risadinha. – Quantos vestidos a Vanda separou?
- 3! – Respondeu ela.
- Inferno!
E dei minha opinião em todos os três. Não combinavam com Lana, que por sinal, já estava irritada. Saí da sala e segui para o centro da loja olhando outros vestidos. Eu vou perder a mulher da minha vida e estou escolhendo um vestido para ela casar com outro. Nunca que em todos esses anos imaginei que isso poderia me acontecer.
E então o encontrei. Era o vestido certo para Lana. Parei em frente, admirado com a perfeição do modelo. Tainá, a vendedora que me olhava quando cheguei parou ao meu lado.
- Lindo, né? – Eu apenas assenti.
- Posso levar para ela?
- Pode, claro! – Na hora de tirar do cabide, parou. – Calma aí, você vai ajuda-la a provar?
- Sim, mas fica tranquila, nós somos amigos! – Ela olhou para a chefe que atendia outra cliente no caixa. – Posso?
- Pode! - Ela me entregou o vestido e me acompanhou até a sala. – Fernanda, vem! – Esperei as duas saírem e encostei a porta.
- Lana?
- Eu não devia ter deixado você vir! – Exclamou, saindo de do provador de calcinha e sutiã. – Me esqueci do quanto você é chato e difícil!
Ao ver o que eu segurava, franziu o cenho.
- Encontrei algo! - Segurei sua mão, a guiando até o provador. – Confia em mim?
- Mas...
- Shiu, mulher! Confia em mim. – Ela revirou os olhos, sorrindo.
Saí do provador e fechei a cortina. Ouvi somente os ruídos e sua respiração meio tensa, acredito eu que sentindo-se insegura com o que acontecia ali.
- Ander?
- Oi!
- Eu não consigo abrir a cortina, abre aí.
- O que aconteceu?
- Minhas pernas estão tremendo. – Dei uma risadinha. – É sério.
- Tá bom... – Abri a cortina e Lana estava de frente para mim. Agora eu entendi o motivo dela se sentir incomodada comigo ali. Depois de vê-la com o modelo escolhido por mim, também tive vontade de não estar ali. Tive vontade de me casar com ela, de não permitir que seguisse com aquela loucura.
Entendia alguma coisa de tecidos por causa da minha mãe, uma ótima costureira. O vestido ficou perfeito no corpo de Lana, pois era uma combinação de tule e renda, uma modelagem de princesa, mas trazia certo drama à história. O corte dava um caráter rebelde e com o body de renda, entrelaçavam perfeitamente com as costas nua. As tatuagens davam um ar descolado e as curvas do decote tornavam todo o conjunto delicado, intenso e sensual. Exatamente como Lana Hassenback.
Me aproximei, lentamente e prendi seu cabelo em um coque frouxo.
- O Bruno é um homem de sorte.
Não havia nenhuma piadinha ou gracejo nas minhas palavras. Era uma declaração sincera. Segurei seu rosto, suavemente. Os olhos dela brilhavam, como quem segurava a vontade de chorar. A minha vontade era de amá-la ali mesmo, sem me importar com o local ou as circunstâncias, porém desta vez era diferente. Não deixarei meus sentimentos me impedirem de ser racional. Lana colocou a mão no meu pescoço, ternamente e eu deixei um beijo em sua testa.
- É esse o vestido, Lana. Você está linda.