A Tribo dos pajés

Era uma vez uma jovem índia. Ela era linda! Encantava a todos com sua beleza esplendorosa.

Sonhava todos os dias com uma única cena: um índio, igualmente majestoso e belo viria a sua tribo pedir a sua mão a seu pai.

Ela rezava a Tupã que esse dia não demorasse, pois sentia a cada dia que passava que a felicidade a dois era uma urgência em sua vida.

Independente de ser uma índia e viver uma vida simples como tal, os desejos românticos de uma mulher moravam em seu corpo e tatuavam a sua pele deixando claro que sua meninice já tinha dado espaço aos anseios definitivos de uma mulher.

Tinha um grande amigo. Foram criados juntos... Plantavam, comiam frutas, subiam em árvores e nadavam. Ele também era jovem, só que bem franzino. Seus país ainda não estavam seguros quanto a sua posição na tribo, e assim deixavam continuar brincando e vivendo feliz ao lado da jovem indiazinha. Na cabeça dele ela era a índia da sua vida.

Sonhava com a união de suas famílias e um ritual de casamento com tantas flores quanto seus olhos pudessem contar. Talvez seja por esse motivo que ele havia deixado durante anos uma flor por dia na frente da oca de sua amada. Sem se cansar... Chovendo ou fazendo sol... Lá estava uma flor por dia na frente da oca de sua linda índia! No início eram pequenas flores simples e comuns, depois belos arranjos, compostos por folhas e flores raras de outras regiões e de difícil acesso. Ele sempre conseguia uma forma de consegui-las.

Ele não sabia ao certo se ela gostava ou não de seus presentes florais, todos da tribo já sabiam que era ele que realizava tal façanha, inclusive ela, porém, quando estavam juntos, como um casal de amigos índios, esse assunto nunca era tocado.

O pai da Índia era o pajé e curava a todos da tribo. Uma mistura linda de dança, misticismo chás e queima de ervas que ninguém sabia como, mas o fato é que ele sempre conseguia uma forma de encontrar a cura para todos os males. Da carne ou do espírito. Ele sempre conseguia!

O índio já estava ficando um pouco triste e desanimado. Não sabia o que a sua amada fazia com as flores e ramos. Ficaria muito feliz se ela usasse algumas no cabelo, seria o sinal de que ela estava gostando dos presentes, só que ela nunca usou nenhuma delas e isso o deixava muito triste.

Certo dia a índia ficou muito doente. Como ela era muito querida, todos ficaram muito tristes na tribo e o índio, ficou ao seu lado, aos pés de sua cama. No início a mobilização era geral. Todos rezavam, faziam suas preces, mas aos poucos todos foram voltando as suas rotinas. Somente o amigo franzino e tímido permaneceu aos seus pés. As flores que antes iam para a porta da índia, passaram a compor a cabeceira de sua cama simples de palha.

O índio só permitia deixa-la nos instantes necessários para buscar as suas flores raras. Sentia que tinha perdido várias oportunidades de falar de seu amor, mas a timidez o impedia. Queria pedir desculpas pela fraqueza de não ter conseguido matar aquela cobra que estava no caminho dela, como faria qualquer um índio guerreiro, mas porque ele sabia o quanto deveria ser difícil para Tupã criar cobras lindas e coloridas como aquela e que ela não precisa morrer só por ter nascido cobra... Ela não tem culpa! Queria ter a chance de dizer que mesmo nadando nus no rio ele virava os olhos quando ela deixava a mostra mais de que seu belo sorriso. Mas não fazia isso por que não gostava do veria e sim porque respeitava a amizade que existia. Queria dizer sobre as flores... Queria explicar que independente da cor ou do tamanho, sempre via seu rosto em cada uma delas. E por achar que as flores estavam sendo sempre iguais ia cada vez mais longe buscando pequenos ramos aromáticos, folhas interessantes e flores cada vez mais raras, pois rara era a beleza dela. Queria saber porque ela nunca usou nenhuma das flores no cabelo nem no cocar, mas não era o momento de cobranças. Ele só queria que ela melhorasse. Apenas isso.

Uma dúvida pairava sobre sua cabeça. Até mesmo as flores e ramos que ele colocava na cama de sua amiga não estavam lá no dia seguinte e um dia ele criou coragem e perguntou ao pai dela, o pagé, o que acontecia com seus presentes O pajé, um pouco triste e cansado, sentou-se ao seu lado... Sabe meu filho, vou te mostrar uma coisa. Entraram os dois em uma outra parte da grande oca, um local onde ninguém ia pois ficava fechado por densa parede de palha, e lá ele não pode acreditar no que viu. Centenas, talvez milhares, de vasos de barro, cada qual com uma mistura diferente de folhas e flores. Poções, remédios, vários e vários potes, de muitos formatos e quase todos com pinturas tribais coloridas. O pajé explicou a ele, com lágrimas nos olhos, que ele com sua determinação em trazer sempre novas flores e galhos já tinha salvado, sem saber a tribo de muitas moléstias. Suas flores viravam poções, que com a bênção de Tupã, já tinham tirado da cama, guerreiros, sábios e caciques, inclusive já havia ajudado as tribos vizinhas. Os dois se abraçaram. Ele não sabia o que falar então simplesmente se abraçaram. Sabiam que queriam a mesma coisa. A recuperação da pobre índia acamada. Foi quando eles escutaram uma voz bem baixinha. Quase um sussurro. - Pai!

Os dois foram correndo e depararam com a cena mais linda de suas vidas. A índia, com seus lindos olhos puxados semiabertos e com um sorriso um pouco sem jeito. -Tudo bem pai? - O que aconteceu?

- Quase nada minha filha, apenas quis Tupã que você queimasse em febre durante quarente e cinco luas, mas agora está tudo bem. - Quero que saiba que seu amigo que te traz as flores ficou ao seu lado todas essas noites e dias. - Eu não sei o que faria sem ele por aqui minha filha? Ele pingou gotas de sopa em sua boca limpou seus olhos e em determinado momento ele não deixou que seus lábios ressecassem passando sua própria saliva em sua boca. Cantava canções que, apesar de não entender, você parecia sorrir mesmo desacordada. O índio escutava tudo olhando para baixo fazendo pequenos desenhos com a ponta do dedo no chão de terra batida. A índia sorriu! Olhou para seu pai e perguntou: pai, e dessa vez, sobrou alguma? Filha, por incrível que pareça, dessa vez sobrou uma. Uma única e pequena flor branca! O índio levantou o rosto a ponto de ver o pai arrumando uma pequena flor branca nos cabelos da filha. Explicou ao índio que todos os dias, sem exceção, ela perguntava se tinha sobrado alguma flor, das que você a presenteava para colocar em seus cabelos, mas hoje foi a primeira vez que sobrou uma. O índio se lembrou um pouco envergonhado que aquela pequena flor branca que tinha sobrado nem era tão rara assim. Na verdade, no dia anterior ele estava muito cansado, e reconheceu a beleza de sua amada nas pequenas flores que nasceram espontaneamente perto da entrada de sua oca. O pajé sorriu e disse: - meu filho, das três pequenas flores brancas que trouxera ontem, duas eu usei para fazer um remédio e a terceira eu guardei, pois não tinha reparado a quão linda era essa flor. Foi esse remédio que Tupã me usou para trazer minha filha amada de volta. Foram com essas flores que Tupã sorriu para nós.

A índia.... Que sonhava com um guerreiro de uma tribo distante. Com um caçador experiente e musculoso. Viu muito mais do que isso no índio magro e tímido. Soube reconhecer o verdadeiro guerreiro, não na capacidade de fazer guerra e sim na linda missão de lhe trazer flores. Não a deixou sozinha nem mesmo quando ela não podia saber se tinha alguém ali. Um índio que a fazia rir com suas pequenas brincadeiras. Um guerreiro que amava mais as flores do se a guerra. Ela segurou a flor que prendia os seus cabelos e segurou as duas mãos ele ao mesmo tempo com as quatro mãos segurando apenas uma pequena flor branca. Com a bênção de Tupã. As duas famílias se uniram em um lindo casamento índio. Dizem que ele continua buscando suas folhas e flores raras, mas dessa vez conta com a companhia de toda a tribo que entenderam que é possível ser guerreiros sendo gentis e amáveis.

Naquela região, nenhuma tribo ousou a fazer guerra com aquela que ficou conhecida como a tribo dos pajés, pois elas passaram a distribuir as bênçãos de Tupã para todos que chegassem por lá.

Poeta no Fusca
Enviado por Poeta no Fusca em 08/03/2019
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