Vivendo um dia de cada vez



Acompanhei a vida de Leonardo à distância. Soube através de ligações com Jorge toda a sua trajetória como pai. Todas as vezes em que fraquejou, que não acreditou em sua própria capacidade, que chorou e chamou por Karen. Algumas vezes fui até a porta do prédio dele, me perguntando se devia ou não entrar e ajudá-lo. E eu nunca entrava. E ele nunca soube de nada disso.


Meses depois, quando as coisas passaram a melhorar entre ele e sua filha optei por voltar a Curitiba. Chorei por 2 horas seguidas antes de entrar no avião.

Era uma dor que nunca cessaria.

(...)

Alguns meses depois...

- Que coisa abençoada, Leo. Eu não canso de olhar para ela.

- Eu percebi, mãe. São 8 horas da manhã e você já está aqui.

Como resposta, recebi um olhar nada amigável da senhora Jardim. Era mais uma noite daquelas em que Bárbara, com seus 5 meses me dava um baile de cansaço.

- Você não dormiu nada não é, garoto?

- Não. Ela dormiu fora do horário, acordou as 2 horas da manhã conversando e querendo brincar. Está tentando me chamar de pai, mas ela se enrola e sai só o “pá”

- Que amor!

- Bebês não cansam, não é?

- Você fazia a mesma coisa comigo e com seu pai.

- Ah, mãe!

- E também com suas irmãs. - Revirei os olhos. - Você está se saindo muito bem.

- Eu acho que sim... – Me sentei no sofá, exausto. Minha mãe seguiu até a cozinha e voltou alguns minutos depois com uma xícara de café. – No futuro ela vai querer entender porque a mãe não está com ela.

“Dia das mães, dia das crianças, no aniversário, natal, ano-novo...” – Pensei, sem aguentar a amargura que essas datas me traziam.

- Ela vai ter muito orgulho de você, filho. Vai saber que o pai fez o que pode para tornar a vida dela melhor.

- E se eu não souber substituir a Karen, mãe?

- Você não vai falhar, Leonardo. Você já cuida dela sozinho há 5 meses. Mal deixa eu passar um dia com minha neta. Sério! Aproveitando que você está cansado, vai lá deitar e eu cuido dela.

- Certeza? Se ela der trabalho, me avisa.

- Leonardo! Eu cuidei de você e das suas irmãs, me respeite!

- Ok, dona Jardim!!

- Deixa tudo por minha conta.

Deitar na cama me trouxe uma inicial sensação de paz, mas logo tornou uma agonia imensurável. Tentando dormir, pensei em Karen, depois em Isabela e no futuro. Foi inevitável a falta de ar que fez meu peito doer como se eu tivesse levado um soco.

O futuro me assustava, o medo de não ser suficientemente bom para a minha filha me fazia mal. Não ter Karen ao meu lado para me ajudar, mesmo após 5 meses, me trazia angustia.

“Eu não posso falhar. Eu não vou falhar... E se eu falhar?”

 

Tamiris Vitória
Enviado por Tamiris Vitória em 08/08/2017
Reeditado em 18/06/2022
Código do texto: T6077726
Classificação de conteúdo: seguro
Copyright © 2017. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.