Telshine - Parte 3

Antes que pudesse completar sua frase, ele foi interrompido por um imenso estrondo, como se cem canhões tivessem sido disparados ao mesmo tempo, que veio do fundo da caverna. Os dois simplesmente olharam aterrorizados para a suposta origem do som, então olharam-se, sem saber se tinha sido mesmo real, e começaram imediatamente a juntar suas coisas.

–Eu não fico nem mais um segundo nessa coisa – Alex disse, com a voz um pouco perturbada, para o amigo – Se você acha tão importante, pode ficar aqui atrás do seu terço de nota.

–Dane-se essa nota, não sou idiota de ficar aqui por isso.

Os dois saíram correndo sem nem se preocupar em olhar pra trás. Em cerca de dez minutos, os dois chegaram à praia, nessa altura, sem nem conseguir respirar direito, quanto mais falar. Eles largaram as mochilas de lado e se jogaram de costas na areia, tentando recuperar o fôlego. Eles fecharam os olhos e os abriram aos poucos, para se reacostumarem com a luz do sol, que agora erguia-se, imponente e flamejante, acima de suas cabeças.

Os dois ficaram deitados por vários minutos, tentando entender o que aconteceu, sem serem incomodados ou sequer notados pelos turistas, despreocupados da vida, que agora já superavam as três dezenas. Os amigos ficaram observando as gaivotas voarem acima do mar e mergulhar em direção à água em busca de algo que lhes fosse apetitoso. Depois de algum tempo refletindo sobre o ocorrido, Alex soltou um grande suspiro e virou-se para o amigo:

–Que... merda... foi aquela?! – ele perguntou ainda ofegante.

Albert respirou lentamente, sentou-se e olhou para o amigo, sem dizer nada, então, um pouco relutante, ele olhou para a entrada da caverna por alguns instantes, voltou-se para o mar e enfim sua voz foi ouvida:

–Eu não faço a menor idéia do que seja, e agora eu não tenho a menor vontade de voltar lá pra descobrir – ele parou um pouco, respirou profundamente e então olhou muito sério para Alex – Mas sei que nós não devemos dizer uma palavra sequer sobre isso com o professor.

–Mas como assim não dizer nada – Alex resolveu se sentar – nós não podemos simplesmen...

–Podemos sim. Ou você acha que ele vai acreditar? Vai achar que nós ficamos loucos ou que estamos inventando alguma história, e, se você não notou, apesar daquele estrondo ter sido ensurdecedor, parece que ninguém mais ouviu. É só você olhar à volta. Está vendo alguém com cara de assustado ou algum show de fogos de artifício?

Alex fez que ia dizer alguma coisa, mas desistiu. Albert deitou-se novamente na areia e cruzou os braços sob a cabeça, tentando relaxar, mas de repente um pensamento voltou à sua mente.

–Ai que droga!

–O que foi? – perguntou Alex.

–Como é que vamos terminar o trabalho? Faltam menos de duas horas e não chegamos nem na metade do questionário.

–É verdade, mas... já sei. Vamos fazer do meu jeito: copiar e inventar.

–Dessa vez eu tenho que concordar com a tua idéia. Eu trouxe um guia sobre cavernas. Vamos usar ele de base e completar a apostila. Tenho que admitir, você tem seus momentos de genialidade.

–Eu sei, eu sei – Alex disse, todo convencido – Só temos que rezar pro professor não descobrir.

–Ele não vai descobrir.

–Pelo menos, é melhor que entregar o trabalho quase todo em branco.

–Vamos logo então – Albert puxou seu guia de dentro da mochila e começou a folheá-lo.

Ele foi pesquisando no livro e completando a apostila, enquanto Alex copiava as respostas em seu próprio questionário.

O sol estava ligeiramente mais baixo quando os dois finalmente fecharam as apostilas, completas. Eles suspiraram de alívio e rapidamente guardaram as coisas nas mochilas.

–Que horas são? – quis saber Albert.

–São 4:53 – Alex olhou no relógio.

–Tomara que de tempo.

Os dois levantaram, tiraram a areia das roupas e mochilas e saíram correndo.Se eles se atrasassem por um segundo, o professor não aceitaria o trabalho, por isso não se importaram nem um pouco em prestar atenção nos carros que ameaçavam atropelá-los, ou sequer se deram ao trabalho de desviar direito dos pedestres que cruzavam seu caminho.

Eles chegaram na praça cerca de 20 segundos antes das cinco horas e correram na direção da estátua, onde o professor esperava, com os olhos cravados no relógio. Eles apertaram o passo e conseguiram entregar os trabalhos dentro do prazo.

–Muito bem – disse o professor Somerset calmamente e com um leve sorriso no rosto no rosto – Vocês conseguiram.

–Mas é claro professor – retorquiu Alex, querendo parecer confiante – Foi moleza.

–Ah, é mesmo? – o professor perguntou, interessado – Então por qual motivo vocês quase se atrasaram?

Alex ia responder, mas Albert foi mais rápido:

–É que... bem... o questionário era longo e a caverna tinha muitas passagens.

–Hmmm... Interessante – o professor o fitou – Estou realmente com vontade de ler seus questionários, senhores. Se me dão licença, tenho algumas coisas a resolver.

–Sim, senhor – respondeu Albert – Até mais.

–Até mais – retribuiu o professor e então se afastou, em direção à Universidade.

Os dois acompanharam com o olhar, enquanto o professor ia embora. Esperaram alguns instantes, até os outros alunos deixarem as redondezas e sentaram-se sob um carvalho próximo. Olharam para os lados para ter certeza que não havia ninguém por perto e então desabafaram.

–Ele já descobriu que tem algo de errado – frustrou-se Albert – Viu a cara que ele fez quando eu expliquei o porquê do nosso atraso?

–Vai ver, ele ficou é surpreso por nós conseguirmos resolver tudo a tempo – Alex tentou acalmar o amigo sem conseguir esconder a preocupação.

–Não. Eu conheço bem ele e sei que ele estava quase zoando com a nossa cara.

–A gente recupera essa nota – completou Alex – Quero dizer, se ele descobrir.

–A nota não é importante.

–Não?! – Alex ficou confuso – E o que mais?

–Nós temos que voltar lá.

–Você bateu a cabeça na saída da caverna?

–Estou falando sério!

–Você está é louco. Depois do que aconteceu... aquilo não foi nada normal... quero dizer, quem é que sabe o que foi aquilo! – Alex se agitou ao lembrar-se do estrondo.

–Uma vez meu avô me disse uma coisa: quando você sentir muito medo de algo, é esse o momento de enfrentá-lo.

–Em que disse que eu estou com medo? – o amigo de Albert disfarçou com uma cara cômica – Eu só acho que nós temos que deixar isso pra lá.

–Deixar pra lá? Nós entramos numa caverna que nunca ouvimos falar, mesmo que esteja sob nossos pés, impossível de existir naturalmente, onde ouvimos um estrondo surreal.

Alex o olhou com a cara cômica para o amigo por alguns segundos.

–É, você está certo, não tem como fingir que não aconteceu nada, mas o que você quer que a gente faça?

–Tentar descobrir o que foi aquilo.

–Mas por quê? E como?

–Simples. Não é você que gosta de ter várias histórias pra impressionar as garotas? – Alex concordou com a cabeça – Aí está a chance de você conseguir uma boa história. Vamos nos preparar e voltar lá.

–Você sempre consegue me convencer.

Albert levantou-se tirou algumas folhas que haviam ficado em sua roupa e, junto com Alex, se dirigiu para o campus.

Telshine é uma cidade pequena, cerca de 3 mil habitantes, mas é bem-estruturada e tem uma bela paisagem, delimitada a oeste pelo mar, com a praia à norte e penhascos mais ao sul, e fechada por montanhas pelo resto de seus limites. O campus fica no quadrante nordeste, ao pé da montanha.

–Será que não foi um desabamento? – tentou Alex, depois de uma quadra.

–Não, aquilo foi muito mais alto e foi como um estouro ou uma batida. Além do mais, lembra da outra parte estranha, as paredes de ferro, nenhuma água ou ser vivo – respondeu o amigo.

–É, você está certo.

–E também acho que, se tivesse sido um desabamento, algumas pessoas teriam notado a terra afundar embaixo delas – riu Albert, para amenizar a tensão.

–É, ia ser um susto e tanto – Alex divertiu-se.

Já na metade da terceira quadra, quase em frente a universidade, eles ouviram alguém os chamando da direção oposta. Eles olharam para trás e viram Karina, a melhor amiga deles, correndo em sua direção.

–Karina, por que tanta pressa? – perguntou Albert, curioso, quando ela os alcançou.

–Ainda bem que eu achei vocês. Onde vocês estavam? Não importa – ela tentava se apressar, mas ainda ofegava – Eu preciso urgentemente que vocês vejam uma coisa.

Karina era uma bela moça de longos cabelos loiros e ondulados, olhos verdes e um corpo completamente formado, vestida sempre em roupas leve, muito esperta e gentil, sempre disposta a contagiar os demais com a felicidade que lhe era característica.

–Olá Karina, como vai você? Ah, eu estou bem, obrigado por perguntar – Alex ironizou amigavelmente.

–Ai, desculpa gente, mas é que isso é realmente importante e eu estou há quase uma hora procurando vocês...

–Estou só brincando. O que é tão importante assim?

–Ah, sim. Vocês sabem a Mary, irmã do Paul, da lanchonete?

–Sim, claro – concordou Albert.

–Atrás da casa dela ouve um desmoronamento – Alex virou-se roboticamente e com uma cara de sarcasmo para Albert – ninguém se feriu, nem nada, mas apareceu uma coisa lá.

–O que foi que apareceu? – perguntou Albert realmente interessado.

–É melhor vocês verem.

Felipe Eduardo Marques dos Anjos
Enviado por Felipe Eduardo Marques dos Anjos em 16/11/2012
Código do texto: T3989556
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