CLOACA DE POMBA
Meus olhos - tão vívidos - enxergam a linda pomba - talvez não tão linda pois já desgastada pela vida urbana - brincando de corda bamba no fio do poste.
Ela gira pelos quatro polos, devagar, no seu tempo, inclina-se para frente e mexe o pescoço, daquele jeito que só pomba sabe fazer, como se analisasse algo, e estanca.
Com três espasmos cloacais espirra aquelas fezes tão características de pomba. Caem como bombas direto no alvo. A roda de amigos em volta da mesa de plástico estupefam-se; em princípio, acham engraçado o repente, mas o asco e os impropérios contra a pomba malcriada não demoram a sobrepujar a graça comum aos jovens.
A pomba gira, dá de ombros e alça voo. Pousa na calçada oposta para contar seu feito aos amigos de rua. Arrulham adoidado.
Um passante, incomodado com o alvoroço pombal, afugenta todas elas. Estanca, observando o voo rasante, e se pergunta: para que servem essas malditas pombas? Aqui nem há tantos insetos para comer nem árvores frutiferas para semear.
Antes o homem tivesse seguido seu rumo. Sentiu no ombro o baque da marca registrada da pomba urbana. Olhou incrédulo o montículo e reconheceu que ainda há arvores frutiferas para semear.
Enquanto aquela primeira pomba observava cúmplice, sobre o capô nojento do carro estacionado, o homem questionador, a pomba manquitoleta semeou no jardim ao largo da calçada o resto das sementes muito bem adubadas.