O CAIPIRA CALOTEIRO

Quinzinho do Gamelão contando mais um “causo” em uma roda de pinguços:

-Cunhici um sujeito, de apilido Chico Ganzepe, que vivia dano o cano nos otos... Vindia boi roceiro, porco coiúdo, mula froxa... Pidia dinhero imprestado e num pagava, pegava ferramenta e num divurvia...Alugava sítio e num pagava os aluguel...

Bebeu uma dose de pinga, lambeu os beiços e continuou:

-Uma veis, ele tinha alugado um sítio, e pricisano de dinhero, saiu pricurano arguem pra imprestá. Chegô na casa dum agiota que já cunhicia a fama dele e num quis imprestá. O Chico insistiu e o sujeito falô que só imprestava cum dois avalista bão.

-Era muito dinhero que ele quiria e ninguém era bobo de querê avalizá ele...Aí o Chico falô:

-Avalista eu num tenho, mais tenho uma grande roça de mio, quais no ponto de coiê, eu dô a roça cumo garantia. O agiota priguntô:

-Que tamanho é essa roça sua?

-Ah, fica perto de dez alqueres...

O sujeito num aquerditô. E o Chico falô:

-Entra ali no meu carro que eu te mostro a roça, fica só umas duas légua e meia daqui. O Sujeito topou.

-Em pouco prazo chegaro na tal roça. O Chico mostrô o miaral. Paricia uma horta, treis, até quato ispiga em cada pé. O agiota ficô instusiasmado. E falô:

-Te impresto o dinhero, mais cum a garantia da roça de mio, se ocê num pagá na data certa, eu fico com o miaral, e é preto no branco, papel assinado.

-O salafráis do Chico concordô, assinô o papel e pegô os cobre. E o tempo foi passano, passano, e quando chegô o vincimento do contrato, o agiota pricurô o Chico...Cadê o Chico, tinha sumido. O agiota num se preocupô não. Dois dia despois, alugô um caminhão, arrumô um terno de cumpanhero e foi quebrá o mio.

-Tava lá cum a turma quebrano o mio, quando chegô um sujeito brabo Cuma carabina 44 na mão e priguntano o que que tava acunteceno. O agiota ispricô a situação, que tava cobrano uma divida e levano o mio em pagamento.

-O cidadão virô bicho, falano que o miaral era dele, que num divia ninguém...Aí o agiota mostrô o dicumento assinado pelo Chico. O fazendeiro falô que o terreno que o Chico morava era na divisa cum ele, que ele tinha sumido e divia dinhero a ele. E priguntô se o Chico tinha falado que o miaral era dele. O agiota respondeu:

-Falô, me troxe aqui e me mostrô o miaral. Falou que a roça era perto de dez alquere...

Aí o fazendero deu uma risada e falô;

-Falô que o miaral dele era perto de dez alquere?

-Falô!

-Ele falô cum o agiota:

-Intão me acumpanha que eu vô te mostrá roça de mio dele.

Andaro um certo tempo e o fazendero mostrô pra ele, uma piquena roça de mio, cuns pezinho de mio marelo, praqui, pracolá, toda cheia de picão, sapé, carrapicho...

-A rocinha ficava na divisa do miaral do fazendero.

O fazendero rino falô:

-Pode rasgá esse papel, ele não te mintiu não, a roça de mio dele fica mesmo PERTO de dez alqueires...

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HERCULANO VANDERLI DE SOUSA
Enviado por HERCULANO VANDERLI DE SOUSA em 31/01/2018
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