UMA MARRETADA DE OUTRO MUNDO
UMA MARRETADA DE OUTRO MUNDO
Todo aposentado, ou melhor, todo homem quando chega à terceira idade, precisa de distração e/ou ocupação nos momentos de folga (sexo já não representa nada). Para suprir esta distração quase sempre, os consertos domésticos caem bem. E para tal nada melhor do que uma caixa de ferramentas composta de: alicates (simples e de pressão), martelos, marretas, serrote, segueta, chaves de fenda de várias bitolas e tamanhos; e lógico, não pode faltar os pregos e parafusos, porcas, arruelas, emendas para mangueiras, buchas de reparação de vazamentos em registros e torneiras; e uma infinidade de outros objetos.
Eu não fujo a regra, nem sou uma exceção. Tenho tudo isto e muito mais. Inclusive alguns apetrechos bem inusitados; quase tudo achados nas ruas e guardados para uma necessidade. Na verdade não tenho uma, mas três caixas. Uma para as ferramentas, uma para os metais e outra para peças de plástico e de borracha; sem contar uns poucos pedaços de madeira. Vai que um dia serão úteis!
De alguns anos para cá a prefeitura de Goiânia instituiu a coleta seletiva do lixo; e para tal instruiu a população para a separação: lixo orgânico do reciclável.
Recentemente estava eu sozinho em casa. A família havia saído nos seus costumeiros bate-pernas. Para ocupar a mente ociosa (mente desocupada é oficina do diabo) resolvi fazer uma limpeza nas minhas caixas de bugigangas. As peças enferrujadas e/ou estragadas colocaria no lixo reciclável. Peguei as três caixas; coloquei-as no piso da área de serviço; sentei num toco de madeira apropriado para estes momentos. Coloquei á minha frente uma chapa de aço/ferro, que tenho especificamente para desentortar pregos, parafusos e outros que tais.
Retirei um prego torto e enferrujado de dentro da caixa específica, coloquei-o sobre a chapa, dei uma martelada, não muito forte, só para tirar a ferrugem; o prego se quebrou em dois; joguei os pedaços no lixo reciclável. Retirei um... Caramba! O quê era aquilo? Não identifiquei como prego. Talvez aparência e tamanho, mas mais grosso, sem cabeça e sem ponta, rombudo. Não era parafuso, pois não tinha cabeça sextavada e nem fenda, também não tinha rosca. De que era feito, não sei. Se de metal, plástico, borracha, madeira, papelão ou outro material. Fiquei por um longo tempo rodando aquele objeto na mão esquerda, enquanto na direita segurava o martelo.
Ainda que tivesse todo tempo do mundo, não iria gastar o meu só na observação daquele... “prefuso”, mistura de prego com parafuso. Tomei a decisão de dar-lhe uma martelada bem violenta e depois jogá-lo nos recicláveis. Como queria espatifar aquela aberração, troquei o martelo por uma marreta, com no mínimo três vezes o peso deste.
Foi uma marretada do outro mundo. Literalmente!
No que a face da marreta tocou o “prefuso” escureceu tudo. Pensei que houvesse ficado cego, por causa de estilhaços nos olhos, mas estes pareciam intactos e sem dor. Mas ainda assim esfreguei-os com os dedos, sem que clareasse nada. Era uma escuridão total, sem uma nesguinha de luz. E como veio se foi. De repetente a claridade voltou. Porém brumosa, embaçada, fria e eu diria até que pesada.
Olhei á minha volta e notei várias diferenças. Ausência de sons. Literalmente silêncio total e absoluto. Antes da marretada havia vida à minha frente, no quintal, o vento balançava as folhas do coqueiro (plantado bem próximo da área de serviço), algazarra de pássaros; e ao longe, gritos de crianças, conversas de vizinhos e ruídos do tráfego na rua. Agora nada.
Não sou de assustar por coisa á toa, mas... vi algo brilhoso se movendo numa folha do coqueiro. Assustado ou não com os acontecimentos tinha que fazer algo. Fui checar in loco. Ah! Um casulo! Típico daqueles que depois da metamorfose as lagartas se transformam em borboletas. Espera aí! O movimento era ritmado, para frente, para trás. Quase tive um troço. Ao aproximar e observar melhor, vi dentro do casulo um casal de humanos em cópula, a mulher de frente para mim. Adivinhe quem era? A Dilva. Se a presidenta ou não, não sei. Tomei uma atitude de inveja. Dobrei o dedo médio “maior de todos ou pai de todos”, como preferirem; e dei um papuretada nas nádegas do sujeito que estava de costa para mim. No que o dedo tocou no alvéolo senti uma dor horrível na minha bunda. Também pudera, o cara dentro era eu, em miniatura, num universo e dimensão paralelos.
Saquei tudo! O “prefuso” era um dispositivo tipo portal de entrada para outro universo e/ou dimensão análogos a 02/11/2014, Goiânia, Goiás, Brasil, Terra, Via láctea... e quando dei a marretada abriu-se o portal e eu vim junto.
Via-se que eu dentro do casulo estava puto comigo de fora, por ter interrompido minha foda. Parecia que a Dilva também não estava satisfeita com nenhum de nós dois. Comigo, dentro do casulo por desempenho fraco e comigo de fora por desmanchar prazeres.
O “prefuso” como chave do portal não existia mais. Havia sido destruído na marretada. E agora como voltar?
Eu, dentro do casulo que me perdoe, eu do lado de fora; assim como quem votou nela, me perdoe também, mas no rumo de casa todo santo ajuda e tudo vale. Peguei o casulo, comigo e a Dilva dentro, pus em cima da chapa de aço. Quando ergui a marreta, foi aquele chororô. A Dilva e eu dentro começamos a gritar. Não pensei duas vezes, dei uma senhora marretada naquilo.
E aqui estou eu...