A cebola
A CEBOLA
A cebola é um caso do profundo desentendimento do ser vegetal com o ser humano.
Como alimento de segunda categoria só se prestava para os hebreus prisioneiros dos egípcios, segundo a história bíblica. Por não ser boa, cebola serviu para chorar. Daí os lamentos às margens do Nilo...
Seu aspecto e corte de camadas superpostas são revoltantes, um dos fiascos da Criação. O sentimento de revolta é transformado em umidade dos olhos de quem a manuseia.
Sua presença às refeições é um acinte ao bom-gosto e prevarica as melhores comidas com suas formas concêntricas e esbranquiçadas.
Ferem o olfato e a estética das mais saudáveis saladas.
Seus ciclos de cascas transparentes, com a ilusão e a aparência de papel de seda, ofendem pelo olhar e, se comidas, pelo bafo.
Apelativas quando cruas, verminais e mortas se cozidas, merecem o esquecimento da humanidade.
O beijo pós-cebola crua traduz um desentendimento fatal, separações cruéis. Não há tentativa de reconciliação entre quem gosta e quem não gosta! Portanto, nunca beije alguém que participou de um churrasco paranaense: lá eles usam cebola crua como complemento.
Os alemães a usam como pequenas bolas transparentes flutuando em vinagre como pequenos e satânicos olhos. Comê-las, só num festival de bruxas e gnomos e, como eles não existem, não há como comê-las.
Quando estão cozinhando, as mexicanas cortam uma metade e a colocam sobre a cabeça, porque assim, dizem, não choram quando cortam as outras cebolas. Imagine-se como ficam os cabelos...
Os árabes... bem é um caso à parte. Quando Alá formou o mundo, deixou que eles nomeassem a cebola de cebola. Assim, é exclusivamente deles, um produto distinto e que deve permanecer bem longe do ocidente. Acho que Marco Pólo não se deu ao trabalho de trazer tamanho bulbo membranoso como condimento. Tinha outras opções.
Esqueçam-se desse maldito tubérculo que cheira a sovaco vencido...
E sejamos todos felizes.