A grande pergunta
Todos os dias lá estava ele, sentado à beira do rio. Água gelada, óculos escuros para proteger os olhos, e uma vara de pesca. Uma não, duas. Não queria correr o risco de, no meio da tarde, ficar desprevenido.
Um dia por volta do meio dia, ouviu uma voz. Procurou, procurou, mas, nada encontrou. Nenhuma alma viva a metros de distância. Mas, a voz insistia em falar-lhe:
- Ei!!! Ei!!! Você quer ficar rico?
Teve medo. Pensamentos estranhos passavam pela sua cabeça. Afinal, estava a sós. Não havia viv’alma próxima ao local em que estava.
Quem poderia estar lhe fazendo? Deveria ele responder? Responder a quem? Por quê?
Perguntas. Perguntas. E mais perguntas.
“Será que estava ficando louco?” “Será que o sol...?
Desistiu de pescar e foi embora. Em casa, aquela situação vivida não saia da sua cabeça. Tudo era tão improvável. Irreal. Ele tinha certeza de que não havia ninguém ali. Tinha certeza. Mas, se ele estava sozinho. Quem lhe fizera tal pergunta?
Passou a noite toda em claro. No entanto, na manhã seguinte lá estava ele novamente, com suas varas e com seu kit de sobrevivência na beirada do rio fazendo o que mais gostava na sua vida, ou seja, pescar.
Por volta do meio dia, a voz:
- Ei!!! Ei você!!! Você não quer ficar rico?
Um gelo subiu pela sua espinha. Seu corpo começou a tremer sem parar. Seu coração parecia querer sair pela boca. Novamente olhou à sua volta, e, nada. Ninguém. Nenhuma pessoa.
- Você quer ou não, ficar rico? – disse, mais uma vez a voz.
Mais uma vez, desistiu de pescar. Desistiu de fazer aquilo que mais gostava na vida. Neste dia, chegou em casa triste, deprimido. Sem nada a dizer, trancou-se no quarto. Passou a noite toda pensando. Não dormiu um minuto sequer. Só pensou. Pensou. Pensou.
Na manhã seguinte, retornou à barranca do rio. Estava todo feliz. Decidido. Afinal, chegara a uma conclusão, e, responderia a pergunta, para quem quer que fosse. Tinha que definir a situação que estava vivendo. Não agüentava mais sair correndo dali com medo. Inseguro. Estava decidido a pagar o que fosse, a quem fosse, mas queria paz. Paz para poder fazer aquilo que mais amava. Queria ser feliz.
Rapidamente pôs-se a pescar. Vez ou outra olhava no relógio, não queria ser pego de surpreso. Então ao meio dia:
- Então, você se decidiu – disse a voz. Você quer ou não ser rico?
Com firmeza ele respondeu:
- Eu quero... Eu quero ser rico...
A voz, então riu, e lhe disse:
- Então, meu amigo, vá trabalhar!
Ele ficou triste, decepcionado, esperava algo irreal. Espera algo de outro mundo.
“Quem seria aquele que lhe fizera tal brincadeira de mau gosto?” “Seria a sua própria consciência?” “Seria seu intimo, sua razão fazendo-lhe alguma brincadeira?”
Largou a pescaria e retornou para a sua casa. Mas, não estava triste. Não estava decepcionado. Na verdade, sentia-se aliviado.
No outro dia, levantou-se de madrugada e saiu.
Por volta do meio dia a voz:
- Ué, você não disse que queria ficar rico?
- Disse, mas, na verdade, de coração, quero não... Quero não... – respondeu ele ao jogar a isca dentro rio.
Marc Souz (escritor)