O PALHAÇO
A Patrícia tinha 2 aninhos, mas era já muito refilona.
Fora com a avó a casa de uma amiga desta, a Guilhermina, lá para os lados do Campo Pequeno.
Ambas gostavam de trapos e enquanto o cosiam e remendavam iam pondo a conversa em dia.
E a menina, enfastiada, por não ter com quem brincar ia-se perdendo nos restos de farrapos velhos que ia encontrando pelas esquinas da sala de costura.
A um canto encontrou um palhaço de panos desbotados, descabelado, meio roto, meio triste, de cara voltada.
Num palhaço aquilo não era normal; ele parecia não gostar de crianças e brincadeira: não brincaram, fazendo cara feia um ao outro.
Na hora do lanche a Guilhermina foi fazer o chá, de cidreira, para acalmar as azias da idade, que afectavam tudo e todos naquela casa, até o palhaço, pelos vistos.
Mais animada lá se chegou a Patrícia à mesinha improvisada já posta com toalha feita de restos de vestidos floridos e fruitados.
A pequenota, enfim, adivinhava o paladar dos biscoitos que lhe acenavam do canto do armário da cozinha.
As chávenas mal lavadas pela cegueira, lá se foram chegando, depois de passadas levemente por água.
Primeiro os mais velhos a servir-se, a avó aconchegou a chávena quente nas mãos frias.
Mas por azar, chegada a vez da Patrícia, pegar nos biscoitos, que chá não o quis, cai o palhaço ao chão da cadeira onde o refastelaram e junto com ele os biscoitos se derramam pelo chão empoeirado do algodão das roupas velhas.
Tudo corria mal à pequena Patrícia. Culpou o palhaço. Este só podia ter feito de propósito.
Numa voz irada gritou à Guilhermina:
Ah, vou fajê xi-xi no teu palaço e vou deitá-lo fola…
Nisto, o palhacito triste, abre os olhos quase chorosos, quase indignados, e sussura:
Patricia, atira-te também para o chão, diz que me amas e dá-me bolachas que tenho fome!
A Patricia sorriu, sorriu, sorriu...e embrulhou-se no Palhaço de felicidade...