FISIOTERAPIA OCUPACIONAL DE AUTO IMPACTO

Quase sempre que chegava na chácara, rara era vez que seu Valdemar não estava capinando.

Ele sempre me dizia:

- Bom mesmo é quando a lua está cheia, que eu vou quase as oito da noite.

O convite nunca faltava;

- Vamos meu filho fazer um eito ali.

Eito que ele se referia, era uma pequena área, que deveríamos capinar e limpar deixando no ponto de receber a muda, seja ela uma planta, ou um filho como se diz para muda de bananeira, ou seja a semente ou mesmo pedaços de caule ou maniva, quando se tratava do plantio de macaxeira ou mandioca.

Eu particularmente apesar de já ter trabalhado de servente de pedreiro na minha adolescência, nunca tive muita afinidade com a enxada, sempre que podia procurava outro serviço para se esquivar de trabalhar com essa ferramenta. Mas nada se compara com meu irmão, que quando meu pai lhe chamava para capinar ele dizia:

- Pai o senhor tá ficando louco! Depois que um amigo meu morreu todo enxado, eu não pego mas nessa tal de enxada de jeito nenhum.

Outra vez cheguei na chácara e encontrei uma rede armada, me deitei e fiquei esperando o pai voltar da roça. Quando chegou colocou a enxada no tronco da jaqueira, sentou-se em um tamborete, colocou na xicara aquela dose generosa de café e na sequencia como força do habito acendeu um cigarro e entre uma tragada e outra me falou:

- Rapaz eu não sei o que é isso, mas meu braço tá doendo aqui nessa região do pulso, e estou notando que está meio enxado.

Eu lhe disse que poderia ser reumatismo, e ele massageando o braço me disse:

- Não, não é reumatismo, eu sei o que é isso.

E já foi identificando não só o agente causador como também o método para a cura;

- Isso é essa enxadinha que eu tô capinando com ela, isso só machuca a gente e o serviço não rende.

Em seguida se levantou, e pegou uma outra enxada que estava dependurada no pé de jaca, a lamina tinha o comprimento de quase dois palmos uma chave e três dedos, e tocou pra roça como ele sempre dizia.

Fiquei ali até quase o anoitecer, e quando ele se aproximou com aquele passo lento, a enxada no ombro, ao chegar foi logo me dizendo:

- Eu não lhe falei meu filho, que era o diacho daquela enxadinha, não tô sentindo um pingo de dor e terminei o serviço, e veja bem que até o braço desinchou.

E soltou num folego o verso que ele sempre falava quando terminava ou conseguia executar algum serviço bruto.

- “Eu sou Valdemar Portela Pinto

Bicho da masca pesada

Silencio da meia noite

Trovão da madrugada."

Elton Portela
Enviado por Elton Portela em 28/03/2021
Reeditado em 16/07/2023
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