Texto para exposição "O coração, se pudesse pensar, pararia" de Chana de Moura
(3º andar da Casa de Cultura Mário Quintana, Porto Alegre, visitação de 31/07/2014 a 07/09/2014)
Eu sempre pensei que teu trabalho dizia mais de mim do que de ti, mas nunca soube o porquê. Uma saudade que eu não sei explicar, um sonho, uma parte de mim que eu perdi ou que talvez apenas esteja aqui, sabe, esperando que eu tenha coragem de olhar para dentro. E, onde meu coração falha, tu aparece e, com toda tua sensibilidade sutil e poderosa, tu preenche aquelas perguntas que eu não sei fazer. Mas, olha, agora eu sei que teu trabalho tem o cheiro da chuva e das folhagens, a beleza das formigas, das aves e das aranhas, o gosto de café de mãe, do Sol em uma manhã fria, do abraço quente de irmão e a dor de ser feliz com a simplicidade da vida. Nunca foi sobre um mundo onírico, algo distante e mágico, não, teu trabalho é sobre a poesia eterna e imperceptível da vida. Algo tão natural na nossa existência que nunca passou pelos pensamentos. Uma nostalgia bucólica, que sempre me lembra daquela cena no início do Espelho, quando o homem e a mulher caem da cerca de madeira naquela casa no meio do nada, e ele diz algo como:
"Nunca lhe pareceu que as plantas também sentem, pensam e até refletem? (...) Estão calmas, livres da correria, do trabalho e da banalidade, porque isso só nos diz respeito. Isso porque não acreditamos na natureza que está em nós."
É como o girassol e a locomotiva do Ginsberg, entende? Como se, frente ao teu trabalho, eu me perguntasse sempre Poor dead flower? when did you forget you were a flower? when did you look at your skin and decide you were an impotent dirty old locomotive?
Sabe, Chana, para mim ele é sobre isso. Sobre eu. Tu. Sobre todo mundo. Sobre a sensibilidade de ser humano e ser capaz de contemplar, sentir, amar, ver, chorar. É sobre ser e acreditar na natureza que está em nós, ser um girassol e, assim, ser simples e infinito. Transcender a vida para se estar vivo. É olhar para dentro para poder olhar para fora com os verdadeiros olhos, porque só assim se é capaz de ser. Porque o coração nunca foi feito para pensar, mas para sentir.
David Ceccon