Máscaras

  Talvez o palco fosse pobre. Tal qual a luz, o cenário e o público. Muito menores do que ela mereceria.
  Em 12 de Dezembro, se o amável leitor me permite, comemoro os anos que vou acumulando. E nesse último, houve dois presentes que não imaginaria receber: o primeiro, foi a descoberta de um ator; o segundo foi o desnudar de certa alma. A mesma que se move, contorce e se remoei em cada um de nós.
  No programa, a sua performance fora chamada de “O Quarto”, uma composição tragicômica em que ela simularia um strip-tease para formar um travesseiro onde descansaria sua cabeça. No palco, uma cadeira e ela. Magra, alta e ruiva. Super vestida de malhas, cachecol, boina, meias e saias. O figurino apropriado ao que se anunciava no programa: um strip-tease teatral. Nada se disse da outra leitura possível do seu trabalho.
  E, então, ela deita-se no chão desnudo. Frio, duro e desconfortável. Levanta-se e senta-se. Entre contorções da face que sugeriam a dor sentida e o grito perturbador, livra-se do cachecol. Mas esse ainda era pouco. Repete-se a mise-en-scène, com a boina, e nada. Não há conforto. Outra vez, com uma, duas, três blusas. E nada do conforto chegar.
  E a cada interjeição, cada sofrida expressão, a platéia ria. Em alguns trechos gargalhava. Sim, estava cumprindo-se a metade da palavra tragicomédia. Era a primeira e rasa leitura a ser feita. A outra metade, talvez fosse poucos os que saborearam. A cada urro, a cada sofrimento, aplaudia-se. E, é provável, que a atenção fosse redobrada para ver até onde iria o prometido strip-tease; afinal ela é alta, magra, ruiva e linda.
  Por fim, tiradas as blusas, o cachecol e a boina, tudo foi ajeitado como um travesseiro e ela pôde descansar. Alguns, com um pouquinho de decepção pelo strip-tease não se consumar, juntaram-se à maioria e o aplauso foi generoso. Sim, seleta platéia, ela os divertiu. Uma certa outra parte não a aplaudiu naquele momento. Ainda saboreava o que ela mostrara e que fica tão escondido. Acabara de mostrar o quanto de sacrifício e de dor a retirada de cada máscara nos acarreta e que, ainda assim, só as retirando é que se encontra a paz de tantos descansos.
Fim do ato e ela se retira. Alguns pensam em aplaudi-la por lhes ter dado aquilo que estava embutido (quase esquecido) em cada qual. Mas, não se conseguiu aplaudir. Achou-se inoportuno homenageá-la após todos os outros já o terem feito. Ao contrário dela, eu ainda tinha muitas máscaras . . .

Esta pequena homenagem, ainda com a máscara que o computador me proporciona, é dirigida à atriz Viviane Palandi.