SÃO PAULO, PORQUE TE AMO

Embora seja hoje o dia do teu aniversário, talvez eu devesse me deter na enunciação dos desmandos de que és vítima todo o tempo, desmandos das autoridades, desmandos de boa parte do povo que te habita, povo vítima, por sua vez, da falta de Educação, da falta do sentimento de cidadania, desmandos pelos quais tu, São Paulo, pagas, na tua gente mais pobre, mas também nas tuas gentes das várias classes sociais, pagamentos mais dramáticos ainda do que ao longo do ano nestes tempos de chuvas, quando vem à tona o lixo acumulado no fundo dos teus rios, quando tantos perdem as suas já precaríssimas moradias, quando carros boiam e outros afundam sob o peso das águas (...); como dizia, talvez eu me devesse deter na enunciação desses e de outros tantos horrores que marcam a trajetória das tuas ruas, dos teus dias. Não, eu não quero deter minhas palavras em tais horrores.

Poderia, pelo contrário, deter-me na enunciação do que tens de belo, na amplidão da tua vida cultural, na beleza dos teus parques, na variedade dos teus povos, na procura de caminhos de resgate para teus problemas por muitos dos seres que te habitam (...); no entanto, quero apenas fazer-te uma declaração de amor:

Tu, São Paulo, és como tem sido em mim o amor pelos homens da minha vida, pela poesia, pela música (...): amor difícil, contraditório, miserável e opulento, todo o tempo a oscilar entre o inferno e o céu. Assim, já que partilhas da tônica sempre presente nos meus modos de amar, não me resta outra escolha (até por coerência) senão continuar a amar-te também assim, com a volúpia do meu corpo, com o sentimento do meu coração e da minha alma, exatamente como tenho amado, ao longo da vida, os outros amores todos da minha vida.