HOMENAGEM A RAUL MAGALHÃES


A força do vento leva no cortejo as lembranças
tantas
tudo agora é poeira
que aos poucos se perde no infinito...

Mais uma vida que passa
mais um sonho chega ao fim !

Silencioso o cortejo segue os últimos passos
vai pela curta estrada
derramando lembranças
murmúrios tristes
flores ao vento
lamentos
e sonhos selados com preces e lágrimas
num último adeus!!!.

Sorrisos de tristezas escapam entre os lábios
contidos no mesmo ato:
não se sabe se intercede, se chora
ou se invoca as lembranças tantas... tantas!!!
em meio a poeira de saudade que aos pouco se espalha
no espaço infinito...
- Até quando Raul ? até quando ! 

Enquanto isso o cortejo segue
num silêncio fúnebre ... aos olhos atentos de Dona Zuzu
que de algum lugar no infinito o espera sorrindo !

Redimido das culpas o corpo vai
sem mais sofrimentos
sem constrangimentos...
numa plenitude de paz
que ninguém é capaz de entender !
com que semblante sereno do morto vai !

- A alma está livre pra o vôo
e haja infino pra  voar...

- Prá onde  ele vai só a ele importa
se  livre vai das amarras da vida, o corpo fica
enquato a alma vai...
livre do castigo imposto aos mortos que voltam
pobres almas que penam no espaço como poeira cosmica.

Vai Raul por um caminho sem volta
Numa torcida fevorosa capaz de abrir as portas do céu.

O morto é morto!
e segue lúcido sem dar um passo
vai sobre lembranças levado
enquanto a alma repousa distante
como ave num vôo infinito rumo ao pouso eterno!

Vai dormir  Raul no reino eterno da paz
o castigo acabou.
!Vai dormir Rauln  o rei do castigo" "

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Quando a morte leva um amigo, leva também um pedaço de nós, que mergulhamos em lembranças tantas e por vezes sentidas, por não poder estar do seu lado, quando mais ele precisou de uma mão amiga... mas o seu silencio, em encontros casuais dizia estar tudo bem... Quando a aparência nem sempre confirmava o sorriso triste... Nnão se dê por satisfeito em tal situação e indague mais, até que o segredo lhe seja revelado e aí... quem sabe não se alonge mais os dias da vidade um amigo.

Ele nasceu por volta de 1948, na cidade baiana de Correntina e alguns anos depois, na década de 50, nos deparamos meninos, morando na mesma rua, que tinha por referencia dois Raimundo Costa, um era sapateiro e o outro alfaiate, ambos apaixonados por futebol, presidentes de agremiações e aí estava a razão daquele movimento beco,  a que se dera o nome de Travessa Domingos Neves.

Raul Moreira Magalhães era filho de Dona Zuzu, uma dedicadíssima mãe de cinco filhos homens e uma mulher. A família migrou do interior do município para a cidade, com o intuito de educar os filhos. Elias, o mais velho tornou-se cabeleireiro, Carlos comerciante, Nando deixou as raízes ficarem na terra e até hoje não arredou os pés da fazenda, Eva se deu as prendas do lar, casou e ganhou o mundo lá pras bandas de Goiás, sobrou então os velhos e eternos amigos Penpengo, que nun acidente de São João perdera três dos dez dedos das mãos e ficou conhecido até hoje como Penpengo Sete dedos, poucos sabem que se chama, também Raimundo; este sim até hoje é um apaixonado por futebol, mas prazeroso mesmo era vê-lo uniformizado... não tinha terno ou gravata que o fizesse tão elegante, numa aparência tão prazerosa e o ultimo dos filhos de Dona Zuzu era Raul, outro grande amigo.O Pai dessa turma pouco conheci, pois raramente o via na cidade, ficou lá pelas Baraúnas, tocando roça, cuidando do pouco de terra que a família tinha na região.

Como fora bom e saudável ter Raul de Dona Zuzu como um amigo de infância... e depois amigo por toda uma vida, meu cabeleireiro mor, meu parceiro de embates políticos, um nato contador de causos. Lembro-me do excessivo cuidado de Dona Zuzu com os filhos mais novos, Penpengo e Raul, que ao cair da noite ela saía a porta e gritava. – Raul ta na hora de dormir... ou por um ato de desobediência, a ordem se tornava mais áspera e mais definida: Raul, pra casa, você está de castigo... Isso aconteceu com muitos meninos e mães, que vigiavam seus rebentos, cuja obediência era dada toda prova. Mas de tanto vê e ouvir aquele costumeira ordem, onde quer que encontrasse o filhos, a menina passou a adiantar o chamado, assim que via Dona Zuzu aproximar-se: - Vai dormir Raul o rei do castigo!
e o menino Raul virava uma Cebola (a doida   dos palavrões) – Vou dormir com sua irmã, seu filo da puta!  Esse era o menino Raul de Dona Zuzu.

Como foi bom ser menino naquele tempo de tanta inocência; como foi bom ter Raul como amigo de traquinagens, caçadas com estilingue, pois pra jogar bola Raul era pior que o nego Pele, que de tanto desengonçado para correr atrás da redonda, acabou se numa figura de linguagem...

Raul, como todo cabeleireiro, conversava pelos cotovelos e política era seu predileto tema. Casou-se com Minervina, filha de João Branco, aquele zelador do sítio do padre que vivia colocando cachorro rajado no encalse da menina que roubava manga, mas se adentrasse o mangeiral acompnhado do genro Raul, não tinha ameaça de cachorro, pois Raul tinha vez e voz com o sogrão. Caou muito novo e teve uma meia dúzia de filhos macho, macho como o próprio Raul. O menino se fez homem e se revelou um super paizão, protetor e defensor dos interesses dos seus flhos.  Andou de um lado pra o outro, entre Brasília, Entorno e Correntina, até se firmar na Cidade Ocidental, onde todos os filhos exercem a honra profissão do Pai. Raul não gostava muito de ser chamado de "cabeleireiro" dizia que isso era coisa de viado, podiam chama-lo mesmo de "barbeiro", pois barberagem ele nunca fazia com um tesoura na mão, mas sabia dirigir com prodência, não importava se os outros faziam de Brasília a Correntina 5 horas de viagem, pois 7 a 7 e meia, para ele era uma boa medida, chegava de qualquer jeito. 

Fincou sua marca por onde passou, mesmo quando se fez teimoso como um torrão, na defesa de suas preferências políticas; ele não negava a raça "magalhaes" e se orgulhava dela.  Na Cidade Ocidental, na rua principal, você vai vê o Salão 6 irmãos e por certo ao olha-lo, vai com certeza vê o semblante deste homem guerreiro, integro e trabalhador.  Todos os filhos passaram pela arte de cortar cabelo, alguns se firmaram na profissão, outros seguiram outros caminhos e Raul não se cansava de gabar com orgulho, do caminho trilhado pelo filho a quem deu seu próprio nome. Raulzinho foi parar no estrangeiro, o menino voo pra longe, andou pela Europa, mas ficou residência na Inglaterra e o mais velho,  Washigton por certo assumirá a responsabilidade de manter a união, patente da familia. Fui cliente de todos eles, com a mordomia de depois de cortar o cabelo, entrar para cozinha de Malvina e tomar um café fresquinho com beijo! Por algumas vezes conseguir tirar Raul de seu estado de aposentadoria pra ele mesmo cortar meu cabelo, enchendo meu saco a me chamar de Feli Tobó e perguntar se eu já tinha tomado a benção do Tio Guerrinha,  um dos seus desafetos políticos.  Raul apesar de não ter si dado a escola, nos últimos anos se dedicou a fundar uma pequena biblioteca publica na Cidade Ocidental e vivia pedindo doação a clientela, que prontamente atendia seus pedidos por doação de livros, para alimentar a sede de seus usuários estudantes.  Raul resolvera partir precosemente, aos 62 ou 63 anos de idade, partiu, depois de um longo sofrimento, vivido no silêncio de um preconceito de não se dar aos exames de prevenção, a tempo de curar.  Disseram-me os amigos de lá, que Raul estava com cancer na próstata e apesar de toda descontração e piadas do gênero, eles se fez sua própria vítima. Escondera sua enfermidade até o ultimo instante e certamente não permitira a companheira, fiel na alegria e no sofrimento, compartilhar seu segredo. Quando quiseram cuidar dele foi tarde... Ele partiu  cansado do sofrimento imposto por essa enfermidade que vitima tantos homens... Agora entendo sua fisionomia cansada, sofrida... O leão que era, estava enfraquecido, sem querer compartilhar o sua dor !

Hoje, 19 de setembro de 2010  fazem sete dias que o meu amigo de infancia, meu parceiro de embates politicos e religiosos, morreu...  Quando a morte leva um amigo, leva também um pedaço de nós. Adeus Raul,  vai dormir tranquilo, no reino dos céus, companheiro fiel. Adeus!