Diálogo-monólogo: Eu x Eu Mesma
-E não adianta se perguntar por que foi se apaixonar por ele, Natália Cristina, não seja hipócrita! Você nunca fez nada para impedir isso. E nem adiantaria tentar.
-Eu sei, eu sei... Mas se eu soubesse que seria assim...
-Você teria feito tudo de novo, meu bem. Igualzinho.
-Talvez não, talvez eu tivesse...
-Já disse para não ser hipócrita!
-Não tô sendo hipócrita, é verdade. E eu tinha plena noção do que poderia acontecer, tá bom?!
-Então, por que não fez nada pra impedir, querida?
-Porque...
-Por quê?...
-Porque eu não tinha a mínima noção do que poderia acontecer...
-Ahá! Eu sabia!
-Sabia o quê?
-Que você estava sendo hipócrita!
-Sabia como? Nem eu sabia!
-Sabia, sim.
-Sabia o quê?
-Você sabia!
-Eu sabia o quê, criatura?
-Você sabia que estava sendo hipócrita.
-E como tu sabia que eu sabia?
-Você está sendo hipócrita de novo, meu bem...
-Não muda de assunto! Como é que tu sabia que eu tava sendo hipócrita se nem eu sabia?
-Porque você sabe que eu te conheço tanto quanto você.
-É mesmo...
-E quem está mudando de assunto aqui é você.
-Sim, eu sei...
-Claro que sabe.
-Mas tu sabe por que, né?
-Claro que eu sei.
-Por isso tava me chamando de hipócrita, né?
-Sim.
-Tá bom, não vou mais ser hipócrita, tá?
-Claro que não.
-Vou admitir que não sabia que aquilo podia dar nisso.
-E vai admitir que não se arrepende de nada.
-E vou admitir que teria feito tudo de novo.
-Vai admitir que teria feito tudo de novo, mesmo que soubesse que aquilo poderia resultar nisso.
-Sim. E vou admitir também que, mesmo que seja assim, isso é a melhor coisa da minha vida.
-E admita que você agradece todos os dias pelo que aconteceu.
-Todas as horas...
-Admita, aqui, que você chora de saudade e mesmo assim agradece.
-Admito.
-Admita que mesmo que ele morasse mais longe ainda você, ainda assim, não desistiria.
-Mas ele já sabe disso...
-Admita!
-Admito.
-Admita que você o ama.
-Com todas as minhas forças.
-Como nunca antes?
-Tu sabe.
-Como nunca antes?
-Mas por que tá me perguntando, se sabe?
-Porque ele não sabe.
-Ele sabe, sim.
-E como você sabe que ele sabe?
-E como tu sabe que ele não sabe?
-É tão difícil assim responder?
-É.
-Por quê?
-Porque não acho as palavras.
-Tente.
-Então, pergunta de novo!
-Como nunca antes?
-Como nunca antes.
-E?...
-Mais do que poderia imaginar.
-E?...
-Mais do que achei que um dia tivesse amado alguém.
-Achou que um dia tivesse amado alguém?
-Tu sabe.
-Mas ele não sabe.
-Sim, ele sabe!
-Achou que um dia tivesse amado alguém?
-Sim, achei.
-E como descobriu que não tinha amado?
-Descobrindo...
-Como descobriu?
-Tu insiste, hein?!
-Nós insistimos, querida!
-Verdade!
-Então?
-Então o quê?
-Como descobriu que não tinha amado ninguém antes?
-Quando descobri que o amava.
-Amava quem?
-Ele.
-Ele quem?
-Tu sabe.
-Mas ele não sabe!
-Ele sabe, sim senhora, e tu sabe muito bem que ele sabe!
-Custa falar quem é?
-O Calil, O CALIL! Satisfeita?
-Mais ou menos...
-Hã?!
-Como descobriu que o amava?
-Lá vem ela...
-Lá vamos nós, darling.
-Tá bom, tá bom!
-Então?
-Tu é chata, hein...
-Somos. Fale, vamos ver se concordo com você.
-Foi quando...
-Quando?...
-Não sei o dia, exatamente.
-Você sabe do que eu estou falando, não seja hipócrita!
-Tá bom, tá bom! Foi quando ele teimou em não sair da minha cabeça.
-Isso.
-E quando ele me dizia coisas que nem eu acreditava...
-Foi, mesmo que você só tenha se dado conta disso mais tarde.
-É, só fui me dar conta mais tarde.
-Mas hoje vê que já o amava muito antes.
-Sim, hoje vejo.
-Mais alguma coisa a dizer?
-Claro que tenho mais a dizer!
-Então, querida, falemos logo. Já estamos nos alongando demais.
-Agora não quer que eu fale?
-Quero, mas falemos logo!
-Descobri que o amava, quando vi que não conseguia não pensar nele.
-Voce já disse isso.
-Não me interrompa!
-Sorry.
-Descobri que não podia mais não falar com ele, que ele me fazia falta, mesmo lá de longe.
-Que ele fazia diferença na sua vida, que ele era especial, muito mais especial do que pensávamos que pudesse ser.
-Sim. Descobri que o amava quando admitia pra mim mesma que ele era muito mais querido do que eu gostaria que ele fosse. Que eu sentia saudade dele, muita, muita.
-Que sentia muita vontade de vê-lo, vê-lo de verdade.
-Muita.
-Que só por amor faria o que fez.
-Só por ele.
-Descobriu que o amava quando o viu chegar na estação de trem.
-E quando sorriu.
-E quando a abraçou.
-E quando pegou na minha mão.
-E quando passou a mão no seu cabelo.
-E quando me olhava.
-E quando a abraçava.
-E me beijava no rosto.
-E quando chorava.
-Quando chorava...
-Descobriu no momento que o viu que ele era a pessoa da sua vida.
-Sempre foi...
-Descobriu que não poderia mais viver sem ele.
-Eu já sabia disso.
-Você não vai precisar viver sem ele, Natália.
-Eu sei. Ele é meu.
-Sim. Ele disse, ele é seu.
-Sim, ele disse.
-E você é dele, admita.
-Nem tento negar.
-Nós seremos felizes...
-Já somos.
-Muito.
-Admite que tu também é caidinha por ele!
-Nem tento negar! Estamos em maus lençóis!
-Estamos fritas!
-Calil, eu amo você!
-Calil, eu te amo, meu querido...