LÍNGUA PORTUGUESA II - 2º ANO 2013

E. E. E. M. “JULÃO BERTOLDO DE CASTRO”

DISCIPLINA: LÍNGUA PORTUGUESA II

PROFESSOR: MOREIRA

2º ANO

ASSUNTOS A SEREM ESTUDADOS NESTE ANO LETIVO DE 2013

I – UNIDADE

DOMÍNIO DISCURSIVO: TEXTUALIDADE

1.1. Noções de texto

1.2. Noções de intertextualidade

1.3. Tipologia textual (inserir conceito de prosa e verso)

1.4. Gêneros discursivos

1.5. Gêneros literários

1.6. Sugestão de leitura: O Pranto de Maria Parda, Gil Vicente

(Monólogo), leitura recomendada pela UFPA e pela UEPA

1.7. Leitura e interpretação de textos

II – UNIDADE

DOMÍNIO DISCURSIVO: DESCRIÇÃO

2.1. Gêneros literários

2.2. Descrição objetiva

2.3. Descrição subjetiva

2.4. Descrição instrucional

2.5. Coerência descritiva

2.6. Sugestão de leitura: Conto Desilusão, do volume Contos Paraenses,

de Marques de Carvalho, leitura recomendada pela UFPA e pela UEPA

2.7. Ficha de leitura: Conto Desilusão, do volume Contos Paraenses,

de Marques de Carvalho, leitura recomendada pela UFPA e pela UEPA

III – UNIDADE

DOMÍNIO DISCURSIVO: NARRAÇÃO

3.1. Elementos estruturais da narrativa

3.2. Tipos de discurso

3.3. Tipos de narrativa

3.4. Coesão e coerência em textos narrativos

3.5. Sugestão de leitura: Conto O Carro dos Milagres,

de Benedicto Monteiro, leitura recomendada pela UFPA e pela UEPA

IV – UNIDADE

DOMÍNIO DISCURSIVO: ARGUMENTAÇÃO

4.1. Noções de textos argumentativos

4.2. Tipos de argumentos

4.3. Coerência argumentativa

4.4. Coesão no texto argumentativo

4.5. Leitura e interpretação

4.6. Produção

4.7. Sugestão de leitura: Crônica Prostituição Infantil,

de Olavo Bilac, leitura recomendada pela UFPA e pela UEPA

UNIDADE I

DOMÍNIO DISCURSIVO: TEXTUALIDADE

GÊNEROS ORAIS ESCRITOS

Monólogo; Textos informativos; Propagandas; Charges; Cartum; Conto maravilhoso; Fábula; Lenda; Narrativa de aventura; Narrativa de ficção científica; Narrativa de enigma; Novela fantástica; Conto parodiado.

COMPETÊNCIAS

Ler, compreender, interpretar e produzir textos em diferentes gêneros do discurso, usando as modalidades: oral e escrita, adequando-os às diferentes exigências do contexto situacional.

HABILIDADES

• Distinguir textos descritivos, narrativos, dissertativos, argumentativos e injuntivos;

• Reconhecer e distinguir os diferentes gêneros literários;

• Produzir diferentes tipos de texto;

• Localizar/reconhecer informações explicitamente dadas no texto;

• Localizar/reconhecer informações no texto, fazendo uso de inferência;

• Reconhecer os sentidos produzidos por aspectos não verbais;

• Distinguir idéias centrais de idéias periféricas;

• Estabelecer conexões entre informações do texto e do contexto.

1.1. NOÇÕES DE TEXTO

A noção de texto é ampla e ainda aberta a uma definição mais precisa. Grosso modo, pode ser entendido como manifestação linguística das ideias de um autor, que serão interpretadas pelo leitor de acordo com seus conhecimentos linguísticos e culturais; são produzidos nas mais diversas linguagens, assim seriam tratados também como textos as produções feitas com as linguagens das artes plásticas, da música, da arquitetura, do cinema, do teatro, entre outras. "Um texto é uma ocorrência linguística, escrita ou falada de qualquer extensão, dotada de unidade sociocomunicativa, semântica e formal. É uma unidade de linguagem em uso."

Um texto é tudo aquilo que comunica algo, seja ele oral, escrito, visual ou musical. Do ponto de vista oral e escrito, o texto se constrói a partir de mecanismos sintáticos e semânticos, os quais são responsáveis pela produção do sentido. De acordo com Chareaudeau (1992), o texto pode ser concebido como “[...] a manifestação material de um ato de comunicação, numa situação dada, para servir de projeto de fala de um dado locutor”

Para Fiorin o texto “é um todo organizado de sentido, implica afirmar que o sentido de uma parte depende do sentido das outras. No caso dos textos verbais, isso significa que ele não é um amontoado de frases, ou seja, nele as frases não estão simplesmente dispostas umas depois das outras, mas mantêm relação entre si. Isso quer dizer o sentido de uma frase depende dos sentidos das demais, o sentido de uma parte do texto depende do sentido das outras.”

Reforçando a afirmação de Fiorin sobre o que é texto, temos o conceito de Koch onde diz: “Um texto não é simplesmente uma seqüência de frases isoladas, mas uma unidade lingüística com propriedades estruturais específicas”.

Podemos ainda ressaltar a conceitualização de Elisa Guimarães (1985) que destaca aspectos mais amplos da intenção textual, que diz:

“Em sentido amplo, a palavra texto designa um enunciado qualquer, oral ou escrito, longo ou breve, antigo ou moderno. Caracteriza-se, pois, numa cadeia sintagmática de extensão muito variável, podendo circunscrever tanto a um enunciado único ou a uma lexia quanto a um segmento de grandes proporções."

1.2. NOÇÕES DE INTERTEXTUALIDADE

Pode-se definir a intertextualidade como sendo a criação de um texto a partir de um outro texto já existente. Dependendo da situação, a intertextualidade tem funções diferentes que dependem muito dos textos/contextos em que ela é inserida.

Evidentemente, o fenômeno da intertextualidade está ligado ao "conhecimento do mundo", que deve ser compartilhado, ou seja, comum ao produtor e ao receptor de textos. O diálogo pode ocorrer em diversas áreas do conhecimento, não se restringindo única e exclusivamente a textos literários.

Na pintura tem-se, por exemplo, o quadro do pintor barroco italiano Caravaggio e a fotografia da americana Cindy Sherman, na qual quem posa é ela mesma. O quadro de Caravaggio foi pintado no final do século XVI, já o trabalho fotográfico de Cindy Sherman foi produzido quase quatrocentos anos mais tarde. Na foto, Sherman cria o mesmo ambiente e a mesma atmosfera sensual da pintura, reunindo um conjunto de elementos: a coroa de flores na cabeça, o contraste entre claro e escuro, a sensualidade do ombro nu etc. A foto de Sherman é uma recriação do quadro de Caravaggio e, portanto, é um tipo de intertextualidade na pintura.

Na publicidade, por exemplo, em um dos anúncios do Bom Bril, o ator se veste e se posiciona como se fosse a Mona Lisa de Leonardo da Vinci e cujo slogan era "Mon Bijou deixa sua roupa uma perfeita obra-prima". Esse enunciado sugere ao leitor que o produto anunciado deixa a roupa bem macia e mais perfumada, ou seja, uma verdadeira obra-prima (se referindo ao quadro de Da Vinci). Nesse caso pode-se dizer que a intertextualidade assume a função de não só persuadir o receptor como também de difundir a cultura, uma vez que se trata de uma relação com a arte (pintura, escultura, literatura etc).

1.2.1. Tipos de intertextualidade

Pode-se destacar sete tipos de intertextualidade:

• Epígrafe - constitui uma escrita introdutória, ou seja, a epígrafe é um pré-texto que serve de bandeira ao texto principal, por resumir de forma exemplar o pensamento do autor.

• Citação - é uma transcrição do texto alheio, marcada por aspas e geralmente com o nome do autor deste.

• Paráfrase - o autor recria, com seus próprios recursos,um texto já existente,"relembrando" a mensagem original ao interlocutor.

• Paródia - é uma forma de apropriação que, em lugar de endossar o modelo retomado, rompe com ele, sutil ou abertamente. Ela muitas vezes perverte o texto anterior, visando a crítica de forma irônica.

• Pastiche - uma junção de vários outros texto, bem parecido com um retalho. De forma fácil, pode-se entender que pastiche é a fusão de um texto 1 com um texto 2, originando um texto 3.

• Tradução - a tradução é a adequação de um texto em outra língua, a língua nativa do país. Por exemplo, um livro em turco é traduzido para o português.

• Referência e alusão - Na alusão, não se aponta diretamente o fato em questão; apenas o sugere através de características secundárias ou metafóricas.

1.2.2. Exemplos de intertextualidade

Às vezes, a superposição de um texto sobre outro pode provocar uma certa atualização ou modernização do primeiro texto. Nota-se isso no livro “Mensagem”, de Fernando Pessoa, que retoma, por exemplo, com seu poema “O Monstrengo” o episódio d’O Gigante Adamastor de “Os Lusíadas” de Camões. Ocorre como que um diálogo entre os dois textos.

A relação intertextual é estabelecida, por exemplo, no texto de Oswald de Andrade, escrito no século XX, “Meus oito anos“, quando este cita o poema , do século XIX, de Casimiro de Abreu, de mesmo nome:

MEUS OITO ANOS

Oh! Que saudade que tenho

Da aurora da minha vida,

Da minha infância querida

Que os anos não trazem mais

Que amor, que sonhos, que flores

Naquelas tardes fagueiras

À sombra das bananeiras

Debaixo dos laranjais!

(Casimiro de Abreu)

"MEUS OITO ANOS"

Oh! Que saudade que tenho

Da aurora da minha vida,

Da minha infância querida

Que os anos não trazem mais

Naquele quintal de terra

Da rua São Antonio

Debaixo das pitoqueiras

Sem nenhum laranjais

(Oswald de Andrade)

e em “Monte Castelo”, de Renato Russo, como veremos nos textos abaixo:

I CORÍNTIOS 13

01 Ainda que eu falasse as línguas dos homens e dos anjos, e não tivesse amor, seria como o metal que soa ou como o sino que tine.

02 E ainda que tivesse o dom de profecia, e conhecesse todos os mistérios e toda a ciência, e ainda que tivesse toda a fé, de maneira tal que transportasse os montes, e não tivesse amor, nada seria.

03 E ainda que distribuísse toda a minha fortuna para sustento dos pobres, e ainda que entregasse o meu corpo para ser queimado, e não tivesse amor, nada disso me aproveitaria.

04 O amor é sofredor, é benigno; o amor não é invejoso; o amor não trata com leviandade, não se ensoberbece.

05 Não se porta com indecência, não busca os seus interesses, não se irrita, não suspeita mal;

06 Não folga com a injustiça, mas folga com a verdade;

07 Tudo sofre, tudo crê, tudo espera, tudo suporta.

08 O amor nunca falha; mas havendo profecias, serão aniquiladas; havendo línguas, cessarão; havendo ciência, desaparecerá;

AMOR É FOGO QUE ARDE SEM SE VER

Amor é fogo que arde sem se ver,

é ferida que dói, e não se sente;

é um contentamento descontente,

é dor que desatina sem doer.

É um não querer mais que bem querer;

é um andar solitário entre a gente;

é nunca contentar-se de contente;

é um cuidar que ganha em se perder.

É querer estar preso por vontade;

é servir a quem vence, o vencedor;

é ter com quem nos mata, lealdade.

Mas como causar pode seu favor

nos corações humanos amizade,

se tão contraditório é em si mesmo o amor.

(Luis Vaz de Camões)

Agora, lidos os dois textos, o capítulo treze da primeira “Carta do apóstolo Paulo aos Coríntios” e “Amor é fogo que arde sem se ver”, de Luís Vaz de Camões, vejamos como ficou a produção intertextual de Renato Russo:

MONTE CASTELO

Legião Urbana

Composição: Renato Russo

Ainda que eu falasse a língua dos homens.

E falasse a língua dos anjos, sem amor eu nada seria.

É só o amor, é só o amor.

Que conhece o que é verdade.

O amor é bom, não quer o mal.

Não sente inveja ou se envaidece.

O amor é o fogo que arde sem se ver.

É ferida que dói e não se sente.

É um contentamento descontente.

É dor que desatina sem doer.

Ainda que eu falasse a língua dos homens.

E falasse a língua dos anjos, sem amor eu nada seria.

É um não querer mais que bem querer.

É solitário andar por entre a gente.

É um não contentar-se de contente.

É cuidar que se ganha em se perder.

É um estar-se preso por vontade.

É servir a quem vence, o vencedor;

É um ter com quem nos mata a lealdade.

Tão contrário a si é o mesmo amor.

Estou acordado e todos dormem todos dormem todos dormem.

Agora vejo em parte, mas então veremos face a face.

É só o amor, é só o amor.

Que conhece o que é verdade.

1.3. TIPOLOGIA TEXTUAL

(inserir conceito de prosa e verso)

Tudo o que se escreve recebe o nome genérico de redação ou composição textual. Basicamente, existem três tipos de redação: narração (base em fatos), descrição (base em caracterização) e dissertação (base em argumentação).

Cada um desses tipos redacionais mantém suas peculiaridades e características.

Para fazer um breve resumo, pode-se considerar as proposições a seguir:

1.3.1. NARRAÇÃO

Modalidade textual em que se conta um fato, fictício ou não, que ocorreu num determinado tempo e lugar, envolvendo certos personagens. Estamos cercados de narrações desde que nos contam histórias infantis como Chapeuzinho Vermelho ou Bela Adormecida, até as picantes piadas do cotidiano.

Podemos ainda dizer da narração, que ela é um relato organizado de acontecimentos reais ou imaginários. São seus elementos constitutivos: personagens, circunstâncias, ação; o seu núcleo é o incidente, o episódio, e o que a distingue da descrição é a presença de personagens atuantes, que estão quase sempre em conflito.

A Narração envolve:

I. Quem? Personagem; II. Quê? Fatos, enredo; III. Quando? A época em que ocorreram os acontecimentos; IV. Onde? O lugar da ocorrência; V. Como? O modo como se desenvolveram os acontecimentos; VI. Por quê? A causa dos acontecimentos.

Exemplos

Numa tarde de primavera, a moça caminhava a passos largos em direção ao convento. Lá estariam a sua espera o irmão e a tia Dalva, a quem muito estimava. O problema era seu atraso e o medo de não mais ser esperada...

1.3.2. DESCRIÇÃO

Tipo de texto em que se faz um retrato por escrito de um lugar, uma pessoa, um animal ou um objeto. A classe de palavras mais utilizada nessa produção é o adjetivo, por sua função caracterizadora. Numa abordagem mais abstrata, pode-se até descrever sensações ou sentimentos.

Podemos ainda afirmar que descrever é representar verbalmente um objeto, uma pessoal, um lugar, mediante a indicação de aspectos característicos, de pormenores individualizantes. Requer observação cuidadosa, para tornar aquilo que vai ser descrito um modelo inconfundível. Não se trata de enumerar uma série de elementos, mas de captar os traços capazes de transmitir uma impressão autêntica. Descrever é mais que apontar, é muito mais que fotografar. É pintar, é criar. Por isso, impõe-se o uso de palavras específicas, exatas.

Exemplos

Seu rosto era claro e estava iluminado pelos belos olhos azuis e contentes. Aquele sorriso aberto recepcionava com simpatia a qualquer saudação, ainda que as bochechas corassem ao menor elogio. Assim era aquele rostinho de menina-moça da adorável Dorinha.

Observação

Normalmente, narração e descrição mesclam-se nos textos; sendo difícil, muitas vezes, encontrar textos exclusivamente descritivos.

1.3.3. DISSERTAÇÃO

Estilo de texto com posicionamentos pessoais e exposição de idéias. Tem por base a argumentação, apresentada de forma lógica e coerente a fim de defender um ponto de vista. É a modalidade mais exigida nos concursos em geral, por promover uma espécie de “raio-X” do candidato no tocante a suas opiniões. Nesse sentido, exige dos candidatos mais cuidado em relação às colocações, pois também revela um pouco de seu temperamento, numa espécie de psicotécnico.

Podemos ainda dizer que dissertar é apresentar idéias, analisá-las, é estabelecer um ponto de vista baseado em argumentos lógicos; é estabelecer relações de causa e efeito. Aqui não basta expor, narrar ou descrever, é necessário explanar e explicar. O raciocínio é que deve imperar neste tipo de composição, e quanto maior a fundamentação argumentativa, mais brilhante será o desempenho.

Exemplos

Tem havido muitos debates em torno da ineficiência do sistema educacional do Brasil. Ainda não se definiu, entretanto, uma ação nacional de reestrutura do processo educativo, desde a base ao ensino superior.

Fonte: www.algosobre.com.br

1.3.4. PROSA E VERSO

Prosa é a estrutura que toma naturalmente a linguagem para expressar conceitos. Essa forma não obedece às normas da versificação, ao contrário do verso. Por isso, a linguagem prosaica costuma definir-se por oposição ao verso.

A prosa desenvolve-se para a frente, ao passo que o verso obriga a regressar para dar lugar às rimas. Por exemplo: “O agente olhou à sua volta e sentiu uma imensa tristeza” é uma frase que se pode encaixar dentro de uma prosa. “O agente olhou à sua volta / recordou a sua filha morta / e sentiu uma imensa tristeza” é um verso que poderia inserir-se no âmbito de um poema.

Considera-se prosa poética qualquer obra que apresente os mesmos elementos que um poema (orador lírico, atitude lírica, tema e objeto), embora sem os seus elementos formais (rima, métrica).

Este tipo de poema, por conseguinte, é escrito em forma de prosa, mas distingue-se do relato ou do conto pelo fato de não ter a narração dos fatos como fim, já que o objetivo é transmitir sensações.

Os microrrelatos são os exemplos mais habituais de prosa poética, tendo em conta que a intenção estética predomina sobre o desejo de narrar. Antonin Artaud e Julio Cortázar são alguns dos autores que contribuíram para o desenvolvimento da prosa poética.

Na linguagem coloquial, é usada a noção de prosa para fazer referência ao excesso de palavras (palavreado) usadas para dizer coisas de pouco relevo e às pessoas com muita “lábia”, como se diria na gíria: “O Dr. Fausto é um político de prosas acesas, mas de poucas ideias”, “Chega de prosas: por favor, limita-te a dizer os principais pontos do teu projeto”.

1.4. GÊNEROS DISCURSIVOS

Este assunto você pode encontrar no livro didático de língua portuguesa do primeiro ano, entre as páginas 28 e 32.

1.5. GÊNEROS LITERÁRIOS

Este assunto você pode encontrar no livro didático do primeiro ano, entre as páginas 32 e 34.

1.6. Sugestão de leitura: O PRANTO DE MARIA PARDA, Gil Vicente (Monólogo), Leitura recomendada pela UFPA e pela UEPA

Eu só quero prantear

Este mal que a muitos toca;

Que estou já como minhoca

Que puzerão a seccar.

Triste desventurada,

Que tão alta está a canada

Pera mi como as estrellas;

Oh! coitadas das guelas!

Oh! guelas da coitada!

Triste desdentada escura,

Quem me trouxe a taes mazelas!

Oh! gengivas e arnellas,

Deitaebabas de seccura;

Carpi-vos, beiços coitados,

Que já lá vão meus toucados,

E a cinta e a fraldilha;

Hontembebi a mantilha,

Que me custou dous cruzados.

Oh! Rua de San Gião,

Assi 'stás da sorte mesma

Como altares de quaresma

E as malvas no verão.

Quem levou teus trinta ramos

E o meu mana bebamos,

Isto a cada bocadinho?

Ó vinho mano, meu vinho,

Que ma ora te gastamos.

Ó travessa zanguizarra

De Mata-porcos escura,

Como estás de ma ventura,

Sem ramos de barra a barra.

Porque tens ha tantos dias

As tuas pipas vazias,

Os toneis postos em pé?

Ou te tornaste Guiné

Ou o barco das enguias.

Triste quem não cega em ver

Nas carnicerias velhas

Muitas sardinhas nas grelhas;

Mas o demo ha de beber.

E agora que estão erguidas

As coitadas doloridas

Das pipas limpas da borra,

Achegou-lhe a paz com porra

De crecerem as medidas.

Ó Rua da Ferraria,

Onde as portas erãomayas,

Como estás cheia de guaias,

Com tanta louça vazia!

Ja m'a mim aconteceo

Na manhan que Deosnaceo,

Á hora do nacimento,

Beber allihum de cento,

Que nunca mais pareceo.

Rua de Cata-que-farás,

Que farei e que farás!

Quando vos vi taes, chorei,

E tornei-me por detras.

Que foi do vosso bom vinho,

E tanto ramo de pinho,

Laranja, papel e cana,

Onde bebemos Joanna

E eu cento e humcinquinho.

Ó tavernas da Ribeira,

Não vos verá a vós ninguém

Mosquitos, o verão que vem,

Porque sereisareeira.

Triste, que será de mi!

Que ma ora vos eu vi!

Que ma ora me vós vistes!

Que ma ora me paristes,

Mãe da filha do ruim!

Quem vio nunca toda Alfama

Com quatro ramos cagados,

Os tornos todos quebrados!

Ó bicos da minha mama!

Bem alli ó Sancto Espírito

Ia eu sempre dar no fito

N'hum vinho claro rosete.

Oh! meu bem doce palhete,

Quem pudera dar hum grito!

Ó triste Rua dos Fornos,

Que foi da vossa verdura!

Agora rua d'amargura

Vos fez a paixão dos tornos.

Quando eu, rua, per vós vou,

Todolos traques que dou

São suspiros de saudade;

Pera vós ventosidade

Naci toda como estou.

Fui-me ó Poço do chão,

Fui-me á praça dos canos;

Carpi-vos, manas e manos,

Que a dezaseis o dão.

Ó velhas amarguradas,

Que antre três sete canadas

Sohiamos de beber,

Agora, tristes! remoer

Sete raivas apertadas.

Ó rua da Mouraria,

Quem vos fez matar a sêde

Pela lei de Mafamede

Com a triste d'agua fria?

Ó bebedores irmãos,

Que nos presta ser christãos,

Pois nos Deos tirou o vinho?

Ó anno triste cainho,

Porque nos fazes pagãos?

Os braços trago cansados

De carpir estas queixadas,

As orelhas engelhadas

De me ouvir tantos brados.

Quero-m'ir ás taverneiras,

Taverneiros, medideiras,

Que me demhua canada,

Sôbre meu rosto fiada,

A pagar lapolas eiras.

(Pede fiado á Biscaïnha.)

Ó Senhora Biscaïnha,

Fiae-me canada e meia,

Ou me daehua candeia,

Que se vai esta alma minha.

Acudi-me dolorida,

Que trago a madre cahida,

E çarra-se-me o gorgomilo:

Enquanto posso engoli-lo,

Soccorei-me minha vida.

Biscainha

Não dou eu vinho fiado,

Ide vós embora, amiga.

Quereis ora que vos diga?

Não tendes isso aviado.

Dizem lá que não he tempo

De pousar o cu ao vento.

Sangrade-vos, Maria Parda;

Agora tem vez a Guarda

E a raia no avento.

(A João Cavalleiro, Castelhano).

Devoto João Cavalleiro,

Que pareceis Isaïas,

Dae-me de beber tres dias,

E far-vos-hei meu herdeiro.

Não tenho filhas nem filhos,

Senão canadas e quartilhos;

Tenho enxoval de guarda,

Se herdardes Maria Parda,

Sereisfóra d'empecilhos.

João Cavalleiro

Amiga, dicen por villa

Unejemplo de Pelayo,

Que una cosa piensaelbayo

Y otraquienloensilla.

Pagad, si quereis beber;

Porque debeis de saber

Que quiensuyegua mal pea,

Aunque nunca maslavea,

Èl se laquiso perder,

(Vai-se a Branca Leda).

Branca mana, que fazedes?

Meu amor, Deos vos ajude;

Que estou no ataude,

Se me vós não accorredes.

Fiade-me ora tres meias,

Que ando por casas alheias

Com esta sêde tão viva,

Que ja não acho cativa

Gota de sangue nas veias.

Branca Leda

Olhade, mulher de bem,

Dizem qu'em tempo de figos

Não ha hi nenhuns amigos,

Nem os busque então ninguem.

E diz o exemplo dioso,

Que bem passa de guloso

O que come o que não tem.

Muita agua ha em Boratem

E no poço do tinhoso.

(Vai-se a João do Lumiar)

Senhor João do Lumiar,

Lume da minha cegueira,

Esta era a verde pereira

Em que vos eu via estar.

Fiae-me um gentar de vinho,

E pagar-vos-hei em linho,

Que ja minha lã não presta:

Tenho mandada hua besta

Por elle a antre Douro e Minho.

João do Lumiar

Exemplo de mulher honrada,

Que nos ninhos d'ora a humanno

Não ha passarosoganno.

I-vos, que sois aviada.

Emquanto isto assi dura,

Matae com agua a seccura,

Ou ide a outrem enganar,

Que eu não m'hei de fiar

De mula com matadura.

(Vai à casa de Martin Alho, dizendo):

Amara aqui hei d'estalar

Nesta manta emburilhada:

Oh! Maria Parda coitada,

Que não tens já que mijar!

Eu não sei que mal foi este,

Peor cem vezes que a peste,

Que quando era o trão e o tramo,

Andava eu de ramo em ramo

Não quero deste, mas deste.

(Diz a Martim Alho):

Martim Alho, amigo meu

Martim Alho meu amigo,

Tão seccotrago o embigo

Como nariz de Judeu.

De sêde não sei que faça:

Ou fiado ou de graça,

Mano, soccorrede-me ora,

Que trago ja os olhos fóra

Como rala da negaça.

Martim Alho

Diz hum verso acostumado:

Quem quer fogo busque a lenha;

E mais seu dono d'acenha

Appella de dar fiado.

Vós quereis, dona, folgar,

E mandais-me a mim fiar?

Pois diz outro exemplo antigo,

Quem quizer comer comigo

Traga em que se assentar.

(Vai-se á Falula).

Amor meu, mana Falula,

Minha gloria e meu deleite,

Emprestae-me do azeite,

Que se me sécca a matula.

Até que haja dinheiro,

Fiae, que pouco requeiro,

Duas canadas bem puras,

Por não ficar ás escuras,

Que se m'arde o candieiro.

Falula

Diz Nabucodonosor

No sideraque e miseraque,

Aquelle que dá gran traque

Atravesse-o no salvanor.

E diz mais, quem muito pede,

Mana minha, muito fede.

Sete mil custou a pipa;

Se quereis fartar a tripa,

Pagae, que a vinte se mede.

Maria Parda

Raivou tanto sideraque

E tanta zarzagania,

Vou-me a morrer de sequia

Em cima d'hum almadraque.

E ante de meu finamento,

Ordeno meu testamento

Desta maneira seguinte,

Na triste era de vinte

E dous desde o nacimento.

TESTAMENTO

A minha alma encommendo

A Noé e a outrem não,

E meu corpo enterrarão

Onde estão sempre bebendo.

Leixo por minha herdeira

E tambem testamenteira,

Lianor Mendes d'Arruda,

Que vendeo como sesuda,

Por beber, at'á peneira.

Item mais mando levar

Por tochas cepas de vinha,

E hua borracha minha

Com que me hajão d'encensar,

Porque teve malvasia.

Encensem-meassi vazia,

Pois tambem eu assi vou;

E a sêde que me matou,

Venha polacleresia.

Levar-me-hão em hum andor

De dia, ás horas certas

Que estão as portas abertas

Das tavernas per hu for.

E irei, pois mais não pude,

N'hum quarto por ataude,

Que não tivesse agua pé:

O sovenite a Noé

Cantem sempre a meude.

Diante irão mui sem pejo

Trinta e seis odres vazios,

Que despejei nestes frios,

Sem nunca matar desejo.

Não digão missas rezadas,

Todas sejão bem cantadas

Em Framengo e Allemão,

Porque estes me levarão

Ás vinhas mais carregadas.

Item dirão per dó meu

Quatro ou cinco ou dez trintairos,

Cantados per taesvigairos,

Que não bebão menos qu'eu.

Sejão destes tres d'Almada,

E cinco daqui da Sé,

Que são filhos de Noé,

A que som encommendada.

Venha todo o sacerdote

A este meu enterramento,

Que tiver tão bom alento

Como eu tive ca de cote.

Os de Abrantes e Punhete,

D'Arruda e d'Alcouchete,

D'Alhos-Vedros e Barreiro,

Me venhãoca sem dinheiro

Até cento e vinte e sete.

Item mando vestir logo

O frade allemão vermelho

Daquelle meu manto velho

Que tem buracos de fogo.

Item mais, mais mando dar

A quem se bem embebedar

No dia em que eu morrer,

Quanto movelhi houver

E quanta raiz se achar.

Item mando agasalhar

Das orphansestas nó mais

As que por beber dos paes

Ficãoproves por casar.

Ás quaes darão por maridos

Barqueiros bem recozidos

Em vinhos de mui bôs cheiros;

Ou busquem taes escudeiros,

Que bebão coma perdidos.

Item mais me cumprirão

As seguintes romarias,

Com muitas ave-marias.

E não curem de Monção.

Vão por mim á Sancta Orada

D'Atouguia e d'Abrigada,

E a Curageirasancta,

Que me derão na garganta

Saude a peste passada

Item mais me prometti

Nua á pedra da estrema,

Quando eu tive a postema

No beiço de baixo aqui.

E porque gran gloria senta,

Lancem-me muita agua benta

Nas vinhas de Caparica,

Onde meu desejo fica

E se vai a ferramenta.

Item me levarão mais

Humgrancirio pascoal

Ao glorioso Seixal

Senhor dos outros Seixaes;

Sete missas me dirão

E os caliz encherão,

Não me digão missa sêcca;

Porque a dor da enchaqueca

Me fez esta devação.

Item mais mando fazer

Hum espaçoso esprital,

Que quem vier de Madrigal

Tenha onde se acolher.

E do termo d'Alcobaça

Quem vier dem-lhe em que jaça:

E dos termos de Leirea

Dem-lhe pão, vinho e candea,

E cama, tudo de graça.

Os d'Obidos e Santarém,

Se aqui pedirem pousada,

Dem-lhes de tanta pancada

Como de maosvinhos tem.

Homem d'Entre Douro e Minho

Não lhe darão pão nem vinho;

E quem de riba d'Avia for

Fazê-lhe por meu amor

Como se fosse vizinho.

Assi que por me salvar

Fiz este meu testamento,

Com mais siso e entendimento

Que nunca me sei estar.

Choraetodos meu perigo,

Não levo o vinho que digo,

Qu'eu chamava das estrellas,

Agora m'irei par'ellas

Com grande sêde comigo.

Bom estudo!

Prof. Moreira