Mente

Em um grande vale, cercado por montanhas que o deixavam em trevas, estava o Consciente.

Sentado, com os braços envolta dos joelhos, o Consciente estava olhando fixamente para o chão. Seu corpo escuro era apenas uma silhueta, uma sombra.

- Oh, Mundo cruel, por quê me trouxeste aqui? Por quê me concedeu a existência? A Inconsciência é muito mais feliz, pois ela não sente e não se alegra, não chora e não ri. Cá estou eu, lamentando-me e sofrendo neste vale escuro e desconhecido. Sinto dores pelo meu corpo, sinto uma ânsia por algo que não sei o que é.

E o Mundo não respondeu.

Enquanto o Consciente se lamentava de sua incapacidade e fraqueza, uma luz tocou-lhe os pés enegrecidos. O Consciente logo reagiu, afastando-o dali.

- Essa luz solar incomoda minha existência, que é apenas tomada por dores e lamentações. A falta de sentido me consome e me apresenta o vazio.

Em meio a suas lamentações, o Consciente ouviu uma voz suave e confiante que lhe dirigia a palavra.

- Por que te lamentas, nobre amigo? Por que consideras tua vida tão infeliz? Tu existe. Contemplai a tua existência.

Ao ouvir aquela voz retumbante, o Consciente direcionou sua visão para um pico elevado.

- Oh, estás ofuscando minhas lamentações! Não há saída para o meu estado, o Mundo criara-me assim. Quem és tu, criatura iluminada?

O ser de luz o olhou em silêncio, seus olhos brilhantes estudaram aquela criatura moribunda no vale sombrio.

- Eu faço parte de ti, eu sou tu. Sou Consciência.

Sem compreender o que a luz dizia, o Consciente pôs-se a reclamar.

- Como pode ser eu mesmo, sendo tão brilhante como o Sol? Como uma criatura tão bela pode ser eu mesmo, se sou tão moribundo e infeliz? - Em seu coração, o Consciente invejou-a por sua beleza.

- Tu não consegues reconhecer a própria luz, enveredada pelas sombras que cobrem teu corpo e tua mente.

O Consciente sentiu se fechar em si mesmo e um amargor tomou conta de si, como se nada o libertasse de sua aflição. A Ira então surgiu.

- O que queres de mim!? Minha vida é apenas as sombras, tu deves ser apenas criação de minha imaginação enviada pelos sete infernos para atormentar-me a alma. - E uma sombra avermelhada, vinda das trevas do Vale, foi em sua direção e o observou com um sorriso amarelo no rosto. Ela então o estendeu a mão em silêncio.

- A Ira te consumirá e te levará para os infernos, te cegará e se alimentará de suas ruminações até que destruas a ti mesmo. Te tornará inquieto e ansioso, transformando-te em uma besta selvagem - Disse a Consciência.

A Ira, tomada por si mesma, fitou a Consciência e sentiu-se debilitada pela sua luz. O Consciente estendia-lhe a mão quando ela desapareceu.

- Ela era minha única esperança de força e coragem - disse melancólico o Consciente. E uma sombra azulada apareceu vinda do vale, seu corpo recurvado e cabisbaixo estendendo-lhe a mão em silêncio.

- A Depressão é fria e impiedosa, ela se apresenta acalentadora e te fará sentir-se sem valor, desmotivado e odiado - disse-lhe a Consciência.

A sombra azulada da Depressão estendeu-lhe a mão fria e úmida. O Consciente curvou-se em si mesmo quando tocou-lhe a ponta dos dedos e uma forte luz preencheu todo o Vale.

E ele viu flores e árvores ao seu redor e contemplou as belezas do Mundo. E a Depressão se foi.

Assustado diante da revelação, o Consciente se pôs de pé.

- O que eram todas aquelas belezas, cores e formas? - perguntou espantado para Consciência.

- Somos nós. - Disse Consciência, estendendo-lhe as mãos.

As cores e a luz começaram a desvanecer e uma sombra surgiu da escuridão renovada. Trêmula e vacilante, a Ansiedade surgiu. E estendeu-lhe a mão.

- Não tenho certeza se consigo entender, não sou capaz! - disse o Consciente, tomado pela profunda angústia daqueles que não compreendem.

- A Ansiedade te consumirá as energias e te levará ao caminho do medo, ela apresentará a Inquietação e apagará de sua memória a Paz e a Tranquilidade. Se fores com ela, não se lembrará do vale iluminado e de mim, teu mundo será instável e cheio de terrores. - disse-lhe a Consciência.

E ela se aproximava e tocava suas mãos trêmulas no Consciente, e ele viu os terrores desconhecidos do abismo e viu os olhos malignos do Medo sorrindo para si. Ele gritou.

- Ajuda-me! Não quero partir! E reconheceu o desejo pela vida. E uma sensação reconfortante e tranquila tomou conta de si. O Consciente foi puxado e abraçado pela Esperança, que sorria-lhe com ternura. Seus olhos se arregalaram diante daquela presença. E o vale se acendeu de Luz. E o Mundo falou.

- Olhai para a Luz diante de ti, você sou eu e eu sou você. Reconheça tua verdadeira condição.

E a Consciência desceu e tocou-lhe a mente. E tudo ficou claro. E tudo tornou-se Consciência.