A Árvore no Jardim de Prédios

Numa cidade, cheia de carros e pessoas passando de um lado para o outro, havia uma rotatória com uma árvore no centro. E sobrevivia sufocada entre os prédios. Sua resistência era tamanha que fez a própria copa aumentar e alongou seus galhos para captar melhor a luz do Sol.

Dava pra ver, nitidamente, que a árvore sentia e esforçava-se para viver ali. Suas raízes eram grossas como tentáculos de madeira exibidas por cima da grama verde. Se tivesse pés, poderiam dizer que era uma “pesuda”, ou melhor uma “raizuda”. A base e tronco eram largos como uma muralha. Até para subir naquela árvore era difícil. E quem curtia tudo isso eram os pardais, rolinhas e pombos. Ah! Esses sim, faziam da suas copas o melhor dos condomínios! E tinha melhor lugar para fazer um ninho?

Todos os dias o Sol nascia por detrás dos prédios. Seus feixes iluminavam a árvore que esperava ansiosa as nove horas, para finalmente captar a maior quantidade de raios solares. Os pássaros brincavam ali. As formigas e cupins transitavam pela grama. Tinha companhia viva.

Esta árvore solitária tocava uma canção feita com sons de galhos aos ventos, enquanto observava a vida de todos e a correria do dia-a-dia.

Logo veio o pardal, pousou em seu galho e disse:

- Bom dia Árvore-Grande! Ouvi sua música dos galhos com o vento! Parece estar bem feliz hoje, não é?

- Bom dia Pardal. Estou feliz com essa brisa sim! Queria mesmo é que chovesse. Mas a gente redescobre formas de ser feliz até com o soprar do vento, não é mesmo? - sorriu a árvore.

- Verdade, Árvore-Grande. Eu bem sei o quanto esse vento ajuda... Tem hora que estou cansado de bater as asas, daí aproveito o vento e uso meu planar! Economizo energia e fôlego para ficar mais rápido – sorriu o Pardal – Isso ajuda até na hora de capturar umas tanajuras!

- Ah Pardal, bem que você podia trazer notícias de uns grãos que lancei no último vendaval. Você voa tão rápido e passa em tantos lugares, bem que poderia me falar daquelas montanhas por detrás dos prédios... Quando fui plantada, lembro-me daquelas lindas muralhas verdes, onde escondia o Sol-Poente... Que saudade! Agora, com esses prédios grandes, nem dá mais para ver... Lancei minhas sementes ao vendaval e queria saber se elas vão nascer... – Suspirou a árvore melancolicamente.

- Ah sim! Pode deixar Arvore-Grande. Quando eu for á montanha-verde, trarei notícias. Vou indo caçar mais insetos. Até mais! - E voou rumo às montanhas.

- Até. Despediu a Arvore-Grande enquanto o vento balançava seus galhos.

Logo, antes que o barulho dos carros ao meio-dia aumentasse, veio chegando um casal de Pombos. Eles reclamavam da fumaça:

- (Cof. cof. cof) Oi Árvore-Grande? Tudo bem? - Disse o Pombo-Cinza em meio à tosse.

- Olá Pombo-Cinza, tudo bem? Está tossindo muito. Que aconteceu? Indagou a Árvore.

- Acho que são esses carros... Aumentaram muito nos últimos anos (Cof..Cof..Cof! )... Sai tanta fumaça de carro, caminhão e ônibus, que a gente que voa aqui embaixo, sofre com o ar poluído... Meu avô dizia, que era melhor ir para o interior, mas lá nem tem tanta comida... Prefiro a cidade. Tem lixo de pão, bolo, papel de bala e um monte de coisa que o povo da cidade desperdiça... A gente faz a festa com o lixo da cidade, mas sofre com a poluição. Não é mesmo querida?

- É sim! A fumaça atrapalha muito, mas nossos amigos moram aqui... Acho que a gente não adaptaria longe deles... A turma dos Pombos-do-Centro é a melhor opção pra gente... Suspirou a Pomba-Branca.

- (Cof..Cof..Cof) Queria ser forte como você Árvore-Grande. Você nem passa mal nesta rotatória. Como você agüenta essa barulhada de carro e fumaça? Indagou o Pombo-Cinza

- Ah Pombo-Cinza... A gente precisa adaptar-se ás circunstancias... Já tenho muitas responsabilidades aqui. Veja bem: graças a essa rotatória, eu ajudo a melhorar o ambiente dessa cidade cinza e barulhenta. Ao meio-dia, o Sol está forte e dou sombra para formigas, besouros, cupins e minhocas. Além disso, ajudo a refrescar o chão da rotatória e garantir uma melhor umidade no solo para as graminhas e para mim. Quando o Sol está prestes a se pôr, abrigo os pardais e rolinhas em meus galhos. Tem dia que até os humanos param por aqui para descansar... Tudo tem seu lugar. Se eu fosse escolher, com certeza queria umas companheiras iguais a mim plantadas aqui. Uma floresta seria algo maravilhoso para esse lugar, não acha?

- Nossa Árvore-Grande! Eu pensava que você ficava só parada, mas você tem mais trabalho do que a gente, né Pomba-Branca?

- É sim! Arvore-Grande é muito inteligente e útil. Respondeu a pomba agradecida.

A árvore sorria para os pombos. Eles despediram-se:

- Vamos indo Árvore-Grande. Vamos voar para outro local em busca de algo para comer. Até logo!

- Até. Sorriu a árvore gentil.

Os pombos foram embora. Com a buzina dos carros, o trânsito engarrafava e a árvore fitava um homem pedindo dinheiro perto do semáforo. Estava com roupas sujas e uma expressão triste. Parava de carro em carro pedindo algo. Era ignorado por muitos indiferentes à sua petição. O pedinte reclamava e praguejava falando sozinho. Atenta a Árvore-Grande observava-o. No projetar da sombra, e com o Sol do meio-dia o homem veio até a árvore e sentou-se debaixo dela:

- Ainda bem que essa árvore tá aqui. O sol tá rachando... Tá difícil demais! Ninguém quer dar esmola nessa cidade... Acho que vou ter que "meter a fita" mesmo! Falou o homem enquanto tragava um cigarro.

A árvore no silencio fitava seu comportamento. Ela não entendia por que ele não fazia como o pardal e como os pombos e saia para caçar. Também não conseguia entender por que o homem tragava aquela fumaça nociva e tóxica, se o melhor mesmo era curtir a brisa e a sombra.

Dedicado ao escritor Rubem Leite, que é uma árvore de centros urbanos.

Glaussim
Enviado por Glaussim em 31/08/2018
Reeditado em 16/08/2023
Código do texto: T6435575
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