Entrevista com Fábio Gesse Dalphorno e Lucas Gesse Dalphorno, cocriadores da Editora Estúdio Armon
1- 2020 foi o ano sabotador de sonhos. Tivemos uma pandemia de COVID-19, uma doença viral e sem tratamento precoce. Um presidente que incentivou automedicação e o desrespeito as medidas de contenção da doença. Um Ministério da Saúde descoordenado, para não dizer o mínimo. E quem mais sofreu com isso foi o setor cultural. O impacto da pandemia para artistas e redes colaborativas de cultura não está no gibi. Qual o real impacto dessa conjuntura no Estúdio Armon?
FG – Primeiramente, obrigado pela oportunidade de mais uma entrevista, é sempre um prazer. Bom, pra falar bem a real, não tivemos um impacto tão grande ao longo do ano de 2020, por piores que as coisas tenham parecido. No ano passado, talvez por conta das pessoas ficarem mais em casa e precisarem distrair a cabeça de tantos problemas que a humanidade passou, a venda de livros e gibis aumentou um pouco no geral. Graças a Deus posso dizer que no Estúdio Armon também seguiu esse rumo. Acredito que 2020 foi o ano que mais vendemos quadrinhos em toda nossa história. Fico feliz em saber que algumas pessoas confiaram em nossas obras para aliviar a dureza dos dias durante a pandemia. Acho que o único impacto foi um auto imposto por nós mesmos no primeiro semestre. Tínhamos um cronograma de lançamentos mais recheado para o ano todo, mas como tinha muita gente passando necessidade e cortando gastos supérfluos de seus orçamentos, decidimos esperar que a situação melhorasse um pouco pra começar a lançar quadrinhos, achamos que seria meio “contra a maré” se começássemos a oferecer produtos para pessoas que talvez quisessem comprar mas não pudessem. Quanto ao lançamento online de quadrinhos também não foi afetado. Aliás, o impacto verdadeiro virá agora em 2021, porque graças à crise, tudo aumentou, inclusive o papel usado para fazer nossos gibis e provavelmente vai dar dor de cabeça manter preços tão convidativos.
LG – Obrigado também pela possibilidade da entrevista, estamos sempre aí! Então, nesse aspecto o Fábio meio que já falou tudo, mas faço questão de destacar o problema do papel que tem subido demais, espero que as coisas se estabilizem logo.
2- Num momento como esse, estratégias contingenciais, se não são necessárias, se fazem urgentes. Quais foram as táticas desenvolvidas pelo Estúdio Armon para contornar as consequências da pandemia?
FG – Como disse na pergunta anterior, vamos entrar nas consequências agora em 2021 com o aumento dos preços de tudo. Ainda estamos pensando em que estratégia tomar para que os preços não subam muito. Ficar sem lançar nada está fora de cogitação, mas talvez adiar alguns títulos ou tentar parceria com as gráficas buscando um preço menor. Ainda estamos estudando.
3- A Editora Estúdio Armon se expandiu para diversas plataformas e mídias ao longo dos anos. Citem quais são e qual a recepção do público?
FG – Na verdade estamos sempre tentando coisas novas, entrando e saindo de plataformas de acordo com o feedback. Dentro de plataformas, atualmente estamos trabalhando com nosso site, que acredito que seja o ponto central pra conhecer tudo que publicamos, Union Mangás, ISSUU, Calaméo, Agakê e Super Comics, ainda com planos de entrar na Fliptru e algumas outras. Quanto a recepção, nosso site recebe muitos acessos e comentários nas obras, é bastante ativo. A Union Mangás, por ser um lugar mais pra scans, a galera não recebe muito bem. Por vezes temos críticas bem naquele estilo infantil, provavelmente de crianças que nem leram pra falar mal, mas continuamos por lá porque a qualidade da plataforma compensa. ISSUU não abre espaço pra feedback e o número de views nem sempre é realista. O Calaméo entramos agora, então não tenho como comentar a respeito. Quanto aos apps para celular, o Agakê está em manutenção há meses, mas lá andava bem parado antes disso também. O Super Comics tem sido nossa boia salva vidas nesse mercado, porque ele abre espaço para editoras publicarem e fornece ganhos pelos downloads das obras. A recepção lá tem sido o suficiente pra conseguirmos pagar alguns trocados aos artistas pelos downloads das obras e ainda manter as contas do estúdio.
4- O Estúdio Armon acabou se tornando a representação nacional de como o mercado editorial deveria funcionar. Sabemos que avanços precisam ser feitos, e que esse esforço é coletivo, e não individualizante. Qual a percepção de vocês em relação a esse aspecto? Consideram positivo serem elencados ao espaço do modelo?
FG – Não é questão de considerar positivo ou não, mas sendo bastante sincero, eu não vejo dessa forma (risos). Não vejo o mercado vendo no Estúdio Armon uma representação de como o mercado editorial deveria funcionar. Ainda somos muito pequenos e, de longe, não temos a visibilidade suficiente pra poder chegar a pensar que talvez um dia possamos ser modelo pra algo. Temos muitos problemas, muitas falhas e muito a melhorar ainda. Constantemente me deparo com coisas que preciso melhorar mas ainda não tenho capacidade ou tempo o suficiente e isso me frustra um pouco. Mas essa estrutura que sigo, sendo modelo pra alguém ou não, é uma que acho que pode dar cada vez mais certo, conforme formos crescendo.
5- Mesmo para um grupo que realiza trabalhos autorais, a Editora Estúdio Armon já galgou alguns espaços. Qual o balanço de conquistas até aqui?
FG – Tenho orgulho de dizer que ao longo dessa jornada, conquistamos algumas coisas que nem sequer sonhei que poderia quando abri o estúdio. Tipo, para algumas pessoas, essas conquistas podem não ser tão expressivas, mas são coisas que eu nem consigo acreditar às vezes. Como por exemplo, manter uma revista mensal por mais de 5 anos sem falhas (mesmo aos trancos e barrancos e com muitos defeitos pra serem corrigidos) e ainda ter uma dessas 64 edições (até o momento), indicada ao Troféu HQ Mix na categoria Publicação Mix. Outra conquista dentro do HQ Mix foi a coletânea HarmoniHQ também sendo indicada na categoria Publicação Independente de Grupo. Não ganhamos os prêmios, mas fomos indicados a nível nacional. Aparecemos dentre outros tantos que admiramos e isso já não tem preço. Outras conquistas são financiar obras com sucesso no Catarse, ter o trabalho reconhecido por alguns canais de mídia, ver que tantas pessoas jovens e aspirantes a quadrinistas sonham em publicar conosco... Algumas conquistas particulares, como quando encontro algum quadrinista ou editor que admiro em algum evento, comento sobre o estúdio e me respondem “ah, conheço o trabalho, é bem maneiro”... É bobo? É, mas pra mim é muito prazeroso e conto como conquista. Enfim... Já fui muito além do que eu esperava no mercado de quadrinhos quando eu abri o Estúdio Armon em 2012... Tudo que vier a partir daí é lucro.
6- Apesar de todo o vento contra, o mercado da cultura pop japonesa está a todo vapor no Brasil. De todas as editoras de quadrinhos brasileiras, ou das editoras que publicam livros de ficção especulativa, ao menos a maioria delas já publicou ao menos um mangá. O Loading parece ter se firmado como um canal de TV, atraindo um público otaku e órfão da TV brasileira. O Anistage, plataforma de streaming de animação nacional, aposta em animes. Como vocês percebem essas novidades?
FG – É muito legal ver essas iniciativas surgindo no mercado! Acho que são muito bem-vindas e faltam pessoas pra arriscar em diversas áreas com um bom planejamento. Estou de olho em tudo que anda surgindo porque me divirto sabendo das novidades que podem beneficiar esse mercado dentro do país.
LG – A possibilidade de expansão das mídias que envolvem quadrinhos é algo incrível de se pensar, sigo na torcida de que todas essas iniciativas possam ter um grande sucesso para que surjam ainda mais novidades que surpreendam tanto na área dos mangás quanto das obras nacionais!
7- A Editora Estúdio Armon fez diversas parcerias em 2020. Comentem sobre elas e quais as futuras parcerias?
FG – Dentre as parcerias de 2020, firmamos com a Kanikoss Moda Nerd, para finalmente criar algumas camisetas com estampas nossas. A Kaktus Entretenimento, que é uma empresa que acaba de surgir, visando atingir o mercado de brinquedos, esculturas e jogos. A parceria com a Super Comics se solidificou mais ainda em 2020 também. Agora para 2021 queremos solidificar ainda mais com a Kanikoss e a Kaktus. A Kanikoss pretende começar a vender quadrinhos também e provavelmente mandaremos os nossos para a loja física deles no Rio de Janeiro. A Kaktus tem projetos ambiciosos de fazer uma linha de action figures nossas, que se iniciou no Catarse de Utopian Vol. 1, além também de projetos pra jogos de tabuleiro e card games... Mas claro, tudo isso vai depender se o público vai receber bem e apoiar esses projetos. Também queremos entrar em mais plataformas e a próxima delas é a Fliptru. Enfim, tem algumas outras parcerias que estão sendo conversadas, mas ainda não posso comentar a respeito.
LG – Em primeiro lugar, gostaria de agradecer demais a Kanikoss, a Kaktus Entretenimento e ao Super Comics por possibilitarem que essas parcerias se tornem realidade, sendo bem sincero, acho que todo desenhista sonha em ver suas obras e personagens em camisetas, action figures e em multiplataformas de leitura online! Sou super fã do trabalho deles e é recompensador saber que temos parcerias tão legais nessa caminhada para todos crescerem juntos, muito obrigado!
8- Citem quais títulos já publicaram e quais títulos estão trabalhando ultimamente?
FG – Eu acho que se eu responder todos os títulos que já publicamos de forma independente, essa resposta passaria de 100 linhas fácil (risos). Vou me limitar a sugerir que visitem o nosso site para ver tudo que já publicamos digitalmente e acessar nossa loja para ver tudo que ainda temos disponível de forma física. Quanto aos títulos que estamos trabalhando atualmente, digitalmente são dezenas dentro da Action Hiken. Fisicamente, estamos com Utopian Vol. 1 rodando na gráfica neste momento. Outros que estão sendo trabalhados pro lançamento físico são Oxente Vol. 2, que deve ser o próximo, também Sideral Vol. 1, O Som da Coragem Vol. 2 (e a reimpressão do Vol. 1) e uma coletânea de one-shots do artista Paulo Alberto, que será chamada Histórias Daquele Cara Estranho. Tem mais alguns pro segundo semestre que ainda não posso falar... Tudo depende se conseguiremos lançar todos esses no primeiro semestre mesmo com os aumentos abusivos do preço do papel.
LG – Bom, meu irmão já pontuou mais ou menos a prévia dos próximos lançamentos, então vou focar nos títulos que eu pessoalmente estou trabalhando. Atualmente tenho em andamento o De Repente, Shoujo!! Que, por enquanto, pela quantidade de capítulos, ainda não encaixaria num volume impresso, e existe também uma coletânea de one-shots minha com o Fábio que está em planejamento, talvez logo-logo eu consiga passar mais notícias sobre isso (hahahaha).
9- Qual o cronograma de lançamentos da Editora Estúdio Armon no ano de 2021?
FG – Eita, já disse tudo na pergunta anterior (risos). Mas vamos lá, nesta ordem e com previsão de mês (que podem ser alteradas ainda):
Março: Catarse de Oxente Vol. 2 com lançamento previsto para Junho
Abril: Pré-venda de Histórias Daquele Cara Estranho na loja, com previsão de lançamento para Maio.
Maio: Pré-venda de O Som da Coragem Vols. 01 e 02 com lançamento previsto para Julho.
Junho: Catarse de Sideral Vol. 1 com lançamento previsto para Setembro.
Agosto: Catarse de Fada Mortífera Formatinhos 4, 5 e 6 com lançamento previsto para Novembro.
Se vamos conseguir cumprir esse cronograma, só Deus sabe. Algumas coisas podem sofrer alteração de data, de acordo com o andamento do ano e os imprevistos. E podem surgir coisas diferentes na segunda metade do ano, mas por enquanto o planejamento é esse aí.
10- Deixem alguma mensagem para os nossos leitores e leitoras.
FG – Às vezes é difícil quantificar o crescimento do trabalho que realizamos, pra mim ainda fazemos quadrinhos amadores pra nós mesmos, mas quando vejo comentários, vídeos a respeito, entrevistas como essa e a galera pedindo mais ou recomendando nosso trabalho por aí, fico realmente satisfeito de todo o esforço realizado. Obrigado por tudo e pelos feedbacks que nos tem dado!
LG – Muito obrigado por acompanharem nosso trabalho e o trabalho do nosso digníssimo entrevistador, contamos com a força e o apoio de vocês!
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