Delírios capitalistas: bananas, bolhas e tulipas
Recentemente, lembrei de uma matéria que li há dois anos sobre um coreano, estudante de artes, que comeu uma banana que era parte de uma exposição no museu de arte Leeum, na coreia do Sul. Alegando que estava com fome, Noh Huyn-soo devorou, de uma forma nada bonita de ser ver, uma banana que estava presa a uma parede com uma fita adesiva. O problema é que não era qualquer banana; tratava-se de uma obra de arte de US$120 mil, do artista italiano Maurizio Catellan, conhecido pelo seu estilo artístico provocativo.
Na verdade, não foi algo tão grave assim, pois a famigerada banana precisa, no final das contas, ser trocada de dois em dois dias, mantendo a aparência de fruta fresca. “Mas isso não é frescura, Albertino?” Ah, meu amigo! Não me arrisco a dizer se a tal obra de arte bananesca é frescura ou não, pois trata-se de uma obra de arte conceitual. Nesse tipo de manifestação artística, o objeto utilizado e sua aparência é o que menos importa. Segundo os especialistas, o importante é a ideia subjacente a obra, ou seja, o que o artista estava pensando quando a produziu. A fama do artista também conta na hora de precificar o objeto artístico.
O fato do aluno Sul coreano ter comido a banana não irá afetar em nada o seu preço, pois outra banana poderá ocupar o lugar da primeira e assim sucessivamente. Então, já que estamos falando em arte, vamos viajar à Holanda de Van Gogh, mas dois séculos antes: 1634. Naquela época, uma flor chamada tulipa, vinda do império Otomano, conquistava a admiração de parte da alta classe Holandesa. No início, era apenas um objeto de ornamentação, mas, com o passar do tempo, devido a uma grande procura, as tulipas se transformaram em um objeto de desejo em toda a Holanda. Sendo assim - de acordo com a velha lei econômica da oferta e procura -, o preço da planta começou a disparar a tal ponto, que pessoas estavam dispostas a trocar terrenos, mansões e muito dinheiro por um bulbo das flores com aparência de turbante. Para ter uma ideia, um simples bulbo de tulipas chegou a custar o equivalente a R$200 mil em valores atuais.
A primeira bolha da história
Aquela flor ainda rara para os holandeses e difícil de ser cultivada tornou-se um ativo tão valorizado, que passou a ser negociado na Bolsa de Valores de Amisterdã. Naquela Época, os Países Baixos eram o grande centro financeiro da Europa; as pessoas faziam até contratos futuros, comprando um certificado de tulipas antes mesmo que elas desabrochassem. Aí já viu, né?! Preço nas alturas, muita gente ficando rica. No entanto, ninguém esperava que a ingenuidade de um marinheiro francês acabaria com a festa. As valiosas flores haviam chegado em um navio, juntamente com outras mercadorias, inclusive, cebolas. Pois é, o anônimo marinheiro francês - que também estava com fome -, confundiu um bulbo de tulipas com algumas cebolas e começou a comê-las na frente de muitas pessoas, inclusive, na frente daquelas que esperavam ansiosas pela chegada do ouro pertencente à família das Liláceas.
Bem-vindos ao mundo real
Aquela cena foi tão simbólica e pedagógica, que fez os “tulipomaníacos” caírem em si e levou-os a questionarem-se: “será que realmente aquela planta vale um preço tão grande assim?” Então, a partir daí, aquele ativo negociado na Bolsa de valores perdeu o encanto; negociadores decidiram não mais honrar os contratos, e a bolha estourou no ano de 1637. Como acontece com todas as bolhas, os investidores correram para vender os bulbos e seus contratos derivativos, mas o valor da tulipa caiu muito e nã valia praticamente mais nada.
Diferentemente da banana transformada em obra de arte por Catellan, comer a tulipa foi o fim de um mercado motivado pela subjetividade e pela irracionalidade humana. Ocorre que, a despeito disso, até hoje não aprendemos muita coisa com nossos erros, o que nos leva a crer que não somos tão racionais como afirmamos ser. Outras bolhas surgiram desde então e outras irão surgir e, certamente, muitos investidores perderão fortunas, movidos pela irracionalidade.