Surf na Ribeira Grande: Clubes (Parte IV)
Clubes (Parte IV)
Clubes? ‘Os treinadores fizeram pressão para que se criasse uma verdadeira associação de clubes.’ É assim que o recorda, quase uma década depois, Luís Silva Melo, Presidente da Comissão Instaladora e o primeiro Presidente da AASB. Porquê? O sucesso (mediático e desportivo) das provas nacionais e internacionais (em Santa Bárbara e no Monte Verde, devido à visão de Rodrigo Herédia) havia atraído (como nunca) novos candidatos ao desporto das ondas (e à sua filosofia de vida), no entanto, desde o fecho da USBA, ficara (quase) tudo (muito) parado (em termos de competições oficiais). O que terá desencadeado o movimento da mudança? Uma conversa (fortuita?) na praia. Segundo essa versão, David Prescott, comentador de provas de nível nacional e internacional, há pouco fixado na ilha, ainda em finais do ano de 2013 ou já em inícios do ano de 2014, chegando-se a um grupo ‘de mães’ (mais propriamente de pais e mães) que (regularmente) acompanhavam os treinos dos filhos (no Pópulo ou nas Milícias), desafiou-os a fazer aquilo que (quanto a ele) urgia fazer. Versão corroborada por Lili Viana (mãe do bodyborder Rodrigo Rijo): ‘O David - com contactos privilegiados com a Federação de Surf -, abordou-nos no sentido de querermos ou não formar uma associação que reunisse as condições para obter apoios da Federação e da Região.’ O desafio pegou (estamos em crer) porque era comum (a pais e a instrutores) este sentimento de abandono. David terá dado voz a um descontentamento. Era preciso fazer na Ilha o que já se fazia com bons resultados no continente português (onde os treinadores tinham recebido a sua formação). O movimento iria refazer a geografia dos clubes dedicados ao surf na Ilha e criar uma associação de clubes.
O que acontecera (então) ao surfing (aqui em São Miguel) entre a Azores Islands Pro – Circuito Mundial de Qualificação da ASP, na praia de Santa Bárbara (Ribeira Grande), última prova co-organizada pela USBA-DAAZ - em Setembro de 2012 -, e os Trials para o SATA Azores Pro, em Setembro de 2014, igualmente em Santa Bárbara (Ribeira Grande)? Para sermos rigorosos, talvez a primeiríssima actividade levada a cabo pela AASB tenha sido em Santa Maria, durante a Maré de Agosto.
A Atlantic Action Sports (fundada a 18 de Abril de 2013), já sem a parceria da defunta USBA, organizou a Azores Islands Pro 2013 – Circuito Mundial de Qualificação da ASP (em Santa Bárbara). Queixando-se de pouco ou nada haver de Bodyboard ‘desde o Mundial da Praia da Vitória [em Novembro de 2011], que fora organizado pela USBA.’ Ricardo Fonseca criou em Outubro de 2013 a ASBA – Associação de Surf e de Bodyboard dos Açores). E promove (com sucesso, diz-me) em Novembro ‘o Campeonato Nacional de Bodyboard no areal de Santa Bárbara.’ Na Ribeira Grande, a nova Câmara (eleita em Outubro de 2013) andava (como se diz) ainda a ‘conhecer os cantos à casa.’ A ASSM (como já se viu) voltara costas à Ribeira Grande (o mais tardar) em 2011. Desde então (primeiro, apoiando a USBA, depois de 2013, já por sua conta) Ricardo Ribeiro Xolim viera (entretanto) preencher (e fora ficando a preencher) o vazio deixado, ao criar (segundo me diz, ainda em 2013) o seu Azores Surf Clube. Centrando-o no areal de Santa Bárbara. Nascera no Algarve em 1979. Aos 10, 12 anos aprendeu a surfar em Vila Real de Santo António, depois ia a Tavira e quando já tinha carro ia a Sagres. Veio em 2003 estudar Relações Públicas para a Universidade dos Açores. Em 2009, em Sines, tirou o Curso de Treinador pela Federação Portuguesa de Surf. Entra logo em Agosto de 2009, como primeiro treinador da secção do Clube Naval de Ponta Delgada. David Costa, que tirara (em 2014) o curso de treinador no Porto, fixa-se (nesse mesmo ano) na Ribeira Grande (onde compra casa e ensina surf).
A Escola de Surf dos Açores, fundada em 2004, por José Seabra, agora de André Caetano (de alcunha o ‘Padeiro’) que a adquirira em 2007, estava activa: ‘Ensino surf, não formo atletas. Não pertenço a nenhum clube ou associação.’ André não aderiria à AASB. Após 2011, João Brilhante (agora só pelo sul) dedicava-se a ensinar surf a alunos da escola do Castanheiro e não só. Brilhante (após – ao que parece -, alguma hesitação) também não iria aderir à AASB. O Clube Naval de Ponta Delgada, apesar da sua longa ligação não institucional à modalidade, iniciara a sua actividade em Agosto de 2009. Tendo como Director de prova, Ricardo Ribeiro Xolim, o Clube Naval organizou logo em 2010 e (pelo que me dizem) até mesmo 2014 o Circuito Surf e Bodyboard. Chegou a ter o nome de Circuito Regional. Porém, nunca foi de âmbito regional. Nem eram provas oficiais. Consistiam em quatro provas anuais, com eventos repartidos pelo Norte (Santa Bárbara e Monte verde) e Sul (Milícias). Até à saída dos seus dois treinadores, em Maio e Dezembro de 2014, o clube Naval foi (sem contestação) o melhor clube de surf e bodyboard da Ilha de São Miguel. Havendo Sérgio Aparício visto o seu projecto recusado pelo Clube Naval (por alegada incapacidade de financiamento), foi oferecê-lo (por volta de Maio de 2014) à coordenadora da secção de Actividades Desportivas dos Bombeiros de Ponta Delgada. Madalena Duarte, a coordenadora, com uma filha a aprender surf, acolheu o projecto de Aparício. A secção de surf da Associação dos Bombeiros Voluntários de Ponta Delgada, de 2015 a 2016, seria (justamente considerada) o melhor clube da Ilha. Isso, até Aparício ir fundar o seu próprio clube, na Ribeira Grande, onde dava aulas de Educação Física na escola Gaspar Frutuoso. Durante esse curto período, a secção de Surf dos Bombeiros de Ponta Delgada seria (por assim dizer) a Meca (e o epicentro) da modalidade. Os principais actos fundadores da AASB (Estatutos, Regulamento Interno e eleição da primeira Direcção) teriam por palco o ‘anfiteatro’ dos Bombeiros de Ponta Delgada. Oferecia condições que nenhum outro clube (então) oferecia: piscina e ginásio. Dois dos melhores instrutores no activo (Aparas e Triki) estavam lá. Não admira, pois, que tivesse atraído um considerável número de atletas. Que Aparício arrastara do Clube Naval de Ponta Delgada. Ali, sonhava-se, graças a apoios, que nunca chegariam, poder elevar o nível da modalidade (pelo menos) ao nível da do continente. No Clube Naval de Rabo de Peixe pontuava Sérgio Rego ‘Serginho.’ No Clube Náutico da Lagoa andava David Prescott. E Manuel Varão.
Necessidade reconhecida, o desafio lançado por David foi (prontamente) aceite. Marcou-se uma reunião aberta a escolas, atletas, treinadores e pais. A primeiríssima, teve lugar numa sala da Escola do Castanheiro. De tudo se falou naquela e nas seguintes reuniões. Houve (mesmo) quem sugerisse a reabertura da USBA. Daria menos trabalho do que criar ‘do zero’ uma nova associação. Porém, com receio de (possíveis) dívidas ocultas, a ideia foi (de pronto) posta de parte. E a ASBA (de Ricardo Fonseca)? Fundada há pouco. A legislação era clara a esse respeito: era um clube. Aliás, tal como o fora (afinal) a USBA. Ou a própria ASSM. Posição que causou (bastante) celeuma. Porém, ao cabo de várias reuniões, umas mais restritas do que outras, como foi a havida no Restaurante O Brilhante, decidiu-se ‘criar de raiz uma associação, algo que não havia, argumentaram uns. Uma associação de clubes que agregasse clubes das Ilhas. Que promovesse provas.’ Luís Miguel Silva Melo, ‘pai de dois surfistas amadores, que aprenderam com o João Brilhante,’ de então a Fevereiro de 2015, revelar-se-ia uma das peças fundamentais no processo de ‘instalação’ da nova associação. Tinha experiência associativa. Economista de formação, dirigente e atleta de Karaté. Era muito ‘certinho,’ calmo, seguro, bom a trabalhar em equipa. Bom comunicador. Quem é Luís Silva Melo? Nascera em Coimbra. Filho de um jurista, natural de Rabo de Peixe, velho democrata e opositor ao Regime do Estado Novo. Luís veio com a família ainda com poucos meses de vida para a Ilha.
Em finais de Abril, ficara assente a criação da AASB. Data (também) fundamental, pois é então que Aparício e Xolim optam (como vimos) por seguir um caminho diferente do do Clube Naval (de PDL). E Triki, que de lá já saíra em 2010, se junta a Aparício na (recém-criada) secção de surf dos Bombeiros. É nomeada uma comissão instaladora da nova associação. São eleitas duas senhoras (o que não era novidade, já que a ASSM tinha tido uma senhora na sua Direcção): Lili Viana e Madalena Duarte. Um surfista, João Alves ‘Triki.’ E dois pais: Luís Miguel da Silva Melo e Alberto Mota Borges. Alberto Mota Borges, igualmente à altura, porém, segundo confessou, mas bastante ocupado. Maria Leonila (Lili) Viana - com um filho bodyborder, era ‘uma mulher desenrascada.’ Era (além do mais) uma excelente operacional. Madalena Duarte, outra que tal, e João Alves ‘Triki’ – surfista (auto-didacta, aos 12 de idade, aprendera a surfar nas ondas de Santa Bárbara).
A Comissão Instaladora, em apenas quatro meses, montou a nova associação. O primeiro passo dado (como exigia a lei que regula as associações) foi o de elaborar e fazer aprovar os estatutos. Como já o fizera a USBA, pretendendo abranger os Açores, convidaram os clubes da Região dedicados à modalidade. André Avelar (da Associação de Surf da Terceira), que fizera parte (já no período final) da USBA, confirma-o: ‘Fui convidado para a AASB pelo Francisco Cabral de Melo. Para ter representatividade além de S. Miguel.’ João Batista, do Clube Naval de Vila do Porto, diz outro tanto: ‘Fui abordado pelo Carlos Guilherme Igreja, aluno do David Prescott, para se criar uma secção de Surf. E assim foi. Houve aqui duas provas de Surf e de Bodyboard. Perguntaram-me se queria fazer parte da Direcção da AABS e eu disse que sim.’ Que clubes aderiram (inicialmente) à AASB? Em 2014 e 2015, eram sete clubes e uma escola. Repartiam-se por três ilhas (Santa Maria, São Miguel e Terceira). Em São Miguel, convém repeti-lo, nem André Caetano nem João Brilhante aderiram.
No dia 6 de Junho de 2014, dois meses (se tanto) após tomar posse, em Assembleia-Geral, no ‘anfiteatro’ dos Bombeiros de Ponta Delgada, a Comissão Instaladora apresenta e vê serem aprovados os estatutos da AASB. O que se pretendia? ‘A função da AASB, tal como qualquer outra Associação que represente os Clubes da Região, é a de organizar e representar a modalidade em todas as suas vertentes (formação de atletas, instrutores e juízes; competição), bem como ser o interlocutor nos Açores com a Federação e entidades oficiais/privadas. Tudo sempre articulado com todos os Clubes associados, pois o interesse último é servir os propósitos da modalidade nos Açores. Por outras palavras, apesar de os Clubes terem a sua dinâmica própria onde a Associação não intervém, a Associação tem de conjugar os diversos interesses por forma a promover e desenvolver a modalidade. Foi com este propósito que se fundou AASB.’ Catorze dias após a aprovação dos Estatutos, ainda em Junho, naquele mesmo espaço da Associação de Bombeiros Voluntários de Ponta Delgada, é eleita a primeira Direcção da AASB. Pretendendo-se dar continuidade ao trabalho iniciado pela Comissão Instaladora, a espinha dorsal da Direcção ficou constituída pelos cinco elementos que haviam pertencido à comissão. Nele se incluem (igualmente) responsáveis de todos os clubes aderentes espalhados por várias ilhas e Concelhos. Apesar de o Concelho da Ribeira Grande estar representado pelo Clube Naval da Vila de Rabo de Peixe, a Cidade da Ribeira Grande (onde se situam os areais, principais palcos do surfing da Ilha, verdadeiros estádios do Maracaná da modalidade) e apesar de Ricardo Xolim estar sediado em Santa Bárbara), ficou de fora. Porquê? Fora já assim no tempo da USBA, mas não no tempo da ASSM. Teria feito diferença ter alguém (atleta/responsável) da Cidade a integrar a AASB? Quem quer da cidade que aí estivesse, por certo, enriqueceria a visão da AASB com uma visão de dentro (e não oficial). De quem foi a culpa? Da própria cidade da Ribeira Grande. E (claro) da nova associação. O objectivo (seguinte) prioritário, foi o de provar às entidades oficiais (Governo Regional e Câmaras) que apoiavam o surf e o bodyboard nos Açores que era uma associação credível e capaz. Nesse sentido, planearam-se as actividades de 2015. Defendendo os interesses dos clubes, era de imediato necessário assegurar um dos locais privilegiados para os treinos da modalidade. Assim, solicita-se ao Capitão do porto de Ponta Delgada, ‘uma zona temporária para a prática destes desportos de ondas, naquela praia ‘(…) ainda durante a presente época balnear.’ De que praia se tratava? Da de Santa Bárbara. Nessa, competiam por um espaço, banhistas e surfistas. A do Monte Verde bastava lá ir. Talvez ainda em Julho ou já nos primeiros dias de Agosto, o recém-eleito Presidente da AASB (Luís Silva Melo) contactara telefonicamente Filipe Jorge, Vereador da Câmara da Ribeira Grande. À nova vereação, referira o ‘grande retorno económico para o tecido empresarial dos Açores, e por conseguinte para o próprio Município.’ E (de seguida) pedira o ‘patrocínio’ para duas actividades. Uma, a 1 de Setembro, ‘na véspera do SATA Azores Pro. Serão realizados os Trials que mais não são que uma pré-qualificação para o evento prime que a SATA está a patrocinar.’ Outra, ‘a 9 e 10 de Setembro: a 1.ª Taça AASB.’ Com a AASB (juridicamente) montada e (reconhecidamente) apta a começar as competições (por razões do foro pessoal, como me confidenciou) em Fevereiro de 2015, o Presidente cedia o lugar a Francisco Cabral de Melo, seu vice-Presidente. Xico, um velho e experiente surfista, bom conhecedor dos areais da Ribeira Grande, cujos pais tinham casa de veraneio na praia dos Moinhos, iria conduzir a Associação até 2018. Um período em que as low-cost fariam dos clubes (também) empresas. E agora?
Nana Bar, Cidade da Ribeira Grande